O romance lésbico em Fale com as Abelhas se perde na indefinição do seu tom.
Baseado no livro de Fiona Shaw, Fale com as Abelhas retrata o romance entre duas mulheres na pequena cidade escocesa de Dunloth, em 1952, segundo as lembranças do filho de uma delas. No início, a voz adulta de Charlie introduz a estória que ele passa a contar.
A história
Desde que veio de Manchester, sua mãe Lydia (Holliday Grainger) não foi bem aceita pela comunidade local. Essencialmente, era julgada por ser forasteira, por gostar de dançar nos bares e por ter engravidado de Robert (Emun Elliott), com quem teve que se casar. Agora, esse seu marido está saindo de casa para viver com outra mulher, e Lydia não tem condições de pagar o aluguel da casa sozinha e cuidar do filho de dez anos. Para piorar, perde o emprego.
Em paralelo, retorna à cidade a jovem médica Jean Markham (Anna Paquin), que havia deixado a cidade porque ganhou fama de “sapatão”. Então, ela tenta reativar a clínica de seu falecido pai tendo que superar o preconceito por ser uma médica mulher e, ainda por cima, de má fama.
Através de Charlie, que se torna um dos primeiros pacientes da Drª Markham e, ao mesmo tempo, se encanta com a sua criação de abelhas dela, os destinos de Jean e Lydia se cruzam. Logo, a médica contrata a mãe de Charlie como governanta de sua casa, resolvendo assim os seus problemas de falta de dinheiro e de moradia. Porém, a paixão que surge entre elas provoca repúdio na comunidade e ainda coloca em risco a guarda de Charlie.
Análise do filme
A diretora Annabel Jankel ostenta em seu currículo alguns videoclipes de artistas famosos. Por exemplo, Rush, Elvis Costello e Talking Heads. Mas dirigiu apenas dois longas para o cinema até agora: o interessante Morto ao Chegar (1988) e o chatíssimo Super Mario Bros. (1993). E a direção é justamente o ponto fraco deste Fale com as Abelhas. De fato, fica evidente o erro fatal da indefinição do tom do filme.
A princípio, a premissa é diferenciada: a relação lésbica de uma mulher sob a perspectiva de Charlie, seu filho de dez anos. De fato, os melhores momentos do filme são aqueles em que ele expressa seus pensamentos sobre o que está testemunhando. E sua ingenuidade sobre o sexo em geral dá um toque de ternura e graça à sua descoberta. Para deixar isso mais lúdico, o vemos contando isso secretamente para as abelhas da Drª Markham.
Qual o tom?
Porém, essa ternura dá lugar a uma cena de sexo apimentada, fora do olhar de Charlie. Na verdade, há muitos beijos e um pouco de nudez, numa cena bem morna se comparada com a equivalente no filme Carol (2015), de Todd Haynes. Mesmo assim, destoa do tom nostálgico da infância.
Além disso, o filme assume um tom violento que se afasta ainda mais dessa visão infantil. Primeiro, quando a adolescente Annie, prima de Charie, sofre um aborto forçado contratado pela sua mãe megera. E, logo depois, na cena em que Robert tenta estuprar Lydia, alternando com a cena em que Jean insere um instrumento cirúrgico na vagina de Annie para socorrê-la. Se por um lado, esses eventos já estavam na obra original, por outro, a direção não precisava filmá-los com tanto sangue e brutalidade.
Para piorar, logo depois entra um momento de fantasia, quando Charlie consegue se comunicar com as abelhas e estas salvam sua mãe. Na verdade, uma cena que dificilmente consegue conquistar o espectador, já que surge logo após cenas de duro realismo.
Como resultado, não sabemos que tipo de filme estamos assistindo. Então, apesar da bela fotografia, das locações autênticas e do tema relevante do preconceito, Fale com as Abelhas decepciona na sua parte final.
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Ficha técnica:
Fale com as Abelhas (Tell it to the Bees) 2018. Reino Unido/Suécia. 108 min. Direção: Annabel Jankel. Roteiro: Henrietta Ashworth, Jessica Ashworth. Produção: Daisy Allsop, Nick Hill, Annabel Jankel, Nik Bower e Laure Vaysse. Direção de fotografia: Bartosz Nalazek. Edição: Jon Harris e Maya Maffioli. Música: Claire M Singer. Elenco: Anna Paquin, Euan Mason, Holliday Grainger, Lauren Lyle, Kate Dickie, Billy Boyd, Gregor Selkirk, Joanne Gallagher.
Distribuição: Arteplex Filmes.
Trailer:
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