O filme France: Sob os Holofotes (France) apresenta escolhas singulares no filmar do diretor Bruno Dumont. Sem dúvida, foge do lugar comum, o que é louvável. Porém, junto com a audácia, surgem os riscos, e no filme desta crítica ela compromete a narrativa.
Na primeira sequência, que serve para nos apresentar a protagonista France de Meurs (Léa Seydoux), a direção provoca estranheza. A fim de salientar que essa famosa jornalista atingiu um nível de celebridade que a deixa imune ao que se passa ao redor, vemos France trocando caretas e risadinhas infantis com sua assistente, enquanto o presidente da França responde a uma pergunta capiciosa que ela levanta na coletiva de imprensa. Esses gestos inusitados, evidentemente, soam artificiais para o espectador que assiste ao filme. Afinal, não teria como ela passar desapercebida pelo próprio chefe de Estado e pelos demais presentes.
Esse leve ingrediente surrealista serve para enfatizar o poder de France, protegida em sua redoma, tão segura de si a ponto de debochar do homem que ocupa o cargo mais importante do país. Da mesma forma, ela troca olhares e frases com o seu marido Fred (Benjamin Biolay) como se os demais convidados à mesa de jantar não pudessem vê-los.
A quebra da redoma
Porém, essa redoma erguida pela fama é frágil, e se rompe diante de um acidente de trânsito banal. Assim, France passa do estado de inatingível para hipersensível, descambando até na depressão. Então, a mão pesada do diretor Bruno Dumont novamente entra em ação. Closes fixos na protagonista, por um tempo tão longo que incomodam, e até o olhar para a câmera, revelam o desequilíbrio da personagem, que encerra muitas dessas cenas com lágrimas. Embora seja um recurso em prol da narrativa, resulta novamente em artificialismo. E, digo mais, se não fosse pelo talento da atriz Léa Seydoux, essas cenas seriam desastrosas.
Aliás, como são desastrosos alguns trechos. Por exemplo, a sequência que acompanha durante um longo tempo o trajeto de carro pela estrada que culmina em uma tragédia, que ainda apresenta exagero quase cômico (capotamento, choque com um caminhão, queda no desfiladeiro e incêndio) para confirmar que as vítimas morreram. Para, além disso, a cena seguinte ainda mostrar a lápide com os nomes dos falecidos. A trilha musical, horrível, que parece tema gratuito disponibilizado pelo Youtube, ainda torna tudo mais insuportável. Definitivamente, a objetividade passou longe das intenções de Bruno Dumont.
Por fim, mesmo com toda essa erupção criativa, France: Sob os Holofotes não atinge o essencial, que é construir uma personagem sólida. Complexa France é, mas esses recursos artificiais impedem que ela seja de carne e osso.
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Ficha técnica:
France: Sob os Holofotes | France | 2021 | 133 min | França, Alemanha, Itália, Bélgica | Direção e roteiro: Bruno Dumont | Elenco: Léa Seydoux, Blanche Gardin, Benjamin Biolay, Emanuele Arioli, Juliane Köhler, Gaëtan Amiel, Jawad Zemmar, Marc Bettinelli.
