Havia uma forte expectativa de que Hellraiser (2022) resgatasse a reputação da obra literária de Clive Barker e de Hellraiser: Renascido do Inferno (1987), o filme original que Barker mesmo dirigiu. Afinal, com exceção de Hellraiser II (1988), todas as oito sequências são desastrosas. Esse novo filme tinha uma proposta diferente. Ao invés de ser uma sequência, é uma nova adaptação do livro. E, para assegurar um bom resultado, chamaram para o filme o diretor David Brucker e os roteiristas Ben Collins e Luke Piotrowski, o time responsável pelo ótimo A Casa Sombria (The Night House, 2020).
Mas, Hellraiser (2022) decepciona. Para começar, a história é outra, portanto, não espere uma refilmagem do primeiro filme. O que permanece é o conceito central. Nessa nova abordagem, o filme transfere a trama concentrada em uma casa e leva o terror para espaços abertos, pelo menos na parte inicial, quando o primeiro cenobita surge num parque. É lá que a protagonista Riley (Odessa A’zion) destrava o famoso quebra-cabeças do cubo, condenando, sem querer, o seu irmão para o mundo das trevas. Assim, trazê-lo de volta se torna a missão que a levará para a mansão onde morou um milionário colecionador de objetos de ocultismo (o que lembra o médico de Hellraiser II). Junto com ela, estão seu namorado Trevor (Drew Starkey); o namorado do irmão, Colin (Adam Faison); e a colega de quarto Nora (Aoife Hinds). Na mansão, essa turma enfrenta a Priest (Jamie Clayton), que é o Pinhead agora em versão feminina, e os demais cenobitas.
Mais ação, menos clima
Lamentavelmente, o filme troca o terror proveniente do tom sinistro do primeiro pela ação. Agora, os protagonistas estão sempre em movimento dentro da mansão, num jogo de gato e rato no qual tentam se salvar das aparições sobrenaturais. A fotografia, clara demais para o gênero, reforça essa equivocada abordagem. O enredo tende também a seguir a sucessão de vítimas dos slashers, e por isso traz personagens dispensáveis como a colega de quarto Nora. E isso impede que nos aproximemos da protagonista, como acontecia com a Kirsty do filme original. Ainda em relação à personagem Riley, essa nova produção subestima a importância de ter uma atriz de porte para o papel – talvez pensando que poderiam repetir a sorte que os produtores do primeiro filme tiveram com a estreante Ashley Laurence. Aliás, nessa nova versão, o elenco é um ponto comprometedor.
Por outro lado, Hellraiser (2022) cumpre a evolução esperada nos efeitos especiais e visuais. Nesse ponto, a apoteótica conclusão consegue traduzir nas telas o que Hellraiser 2 buscou sem sucesso. Vemos nessa cena uma convincente aparição gigante de uma das configurações do cubo, aspecto aqui devidamente trabalhado. O filme revela, com interessantes transformações do quebra-cabeça as seis configurações que são: Lament (“vida”), Lore (“conhecimento”), Lauderant (“amor”), Liminal (“sensação”), Lazarus (“ressurreição”) e Leviathan (“poder”). Pena que a famosa frase “What is your pleasure?” apareça no filme apenas como uma referência, numa fala aleatória do namorado de Riley.
Cenobitas pomposos
Quanto aos cenobitas, eles estão mais detalhados, em composições com maior capacidade de movimentação. Porém, parecem menos assustadores. Primeiro, por causa da fotografia clara, em algumas de suas aparições, mas também porque o visual dos seres do além estão belos demais. Pode soar contraditório, mas o aprimoramento dos detalhes desses monstros resulta em composições pomposas demais, como se já preparadas para o mercado de fantasias para cosplayers. Pelo menos, o filme consegue explorar alguns (mas poucos) detalhes horripilantes. Por exemplo, quando mostra a agulha da Pinhead atravessando a garganta de Riley por dentro do corpo dela. Já os anzóis que puxam a pele das vítimas pareciam bem mais dolorosos nos filmes antigos, que exploravam melhor os planos detalhes.
Embora Clive Barker seja um dos produtores, e esse filme esteja degraus acima das péssimas sequências da franquia, Hellraiser (2022) definitivamente não é o que os fãs tanto esperavam.
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Ficha técnica:
Hellraiser | 2022 | 121 min | EUA, Sérvia | Direção: David Bruckner | Roteiro: Ben Collins, Luke Piotrowski | Elenco: Odessa A’zion, Jamie Clayton, Adam Faison, Drew Starkey, Brandon Flynn, Aoife Hinds, Jason Liles, Yinka Olorunnife, Selina Lo, Goran Visnjic.
