Mais Que Amigos (Bros) não é uma comédia romântica tradicional. Embora desfile todos os elementos de uma rom com, nunca esconde a sua intenção de levantar a bandeira LGBTQ+. E esconder não faz parte da índole do protagonista Bobby (Billy Eichner), um ativista famoso por causa de seu podcast. Além disso, ele também participa do comitê do primeiro museu LGBTQ+ a ser inaugurado nos EUA, o que garante a linha narrativa secundária que movimenta a trama.
O filme investe na construção de um personagem principal sólido. Por isso, passa praticamente todos seus primeiros 25 minutos nessa tarefa. Assim, mesmo após conhecer o seu par romântico – Aaron (Luke Macfarlane), um gay mais jovem e saradão, o oposto de Bobby – é este último que sempre permanece sob os holofotes. Dessa forma, fica a impressão de que a produção é um veículo para o ator Billy Eichner, que não dirige o filme mas é coautor do roteiro. Contudo, essa concentração acaba cansando. Aliás, alguns truques humorísticos começam até a se repetir (por exemplo, quando o personagem afirma que nunca fará uma determinada coisa e a cena seguinte mostra ele fazendo exatamente isso, uma piada típica de sitcom).
Abrindo espaço
O roteiro volta a engrenar quando passa a dar espaço para Aaron. E isso se inicia na bela cena de epifania na qual ele se vê no reflexo de um vidro no salão de pessoas LGBTQ+ importantes do museu. Nesse ponto, ele percebe que sua vida é vazia. E, indiretamente, o espectador saca que a vivacidade de Bobby é o elemento que falta em sua existência. Então, quando se atinge o mínimo de equilíbrio de protagonismo entre o par romântico, surge a oportunidade para Bobby colocar para fora, como porta voz da comunidade, todos os enormes obstáculos que teve que enfrentar para chegar ao status que tem hoje, como modelo de pessoa autoconfiante, algo que Aaron e vários outros membros desse grupo heterogêneo ainda não conseguiram ser.
Mais Que Amigos evita o sermão e a lamúria. Banca o protesto contra o preconceito através da comédia. Mas, nesse quesito, falha. Poucas piadas conseguem fazer rir. Uma exceção é a primeira transa entre Bobby e Aaron que, fugindo do clichê e da ousadia barata, mostra os dois mais interessados em brincar de brigar do que em fazer sexo. Porém, no geral, hesita entre o humor escrachado (como na sequência da visita da família de Aaron), e as alfinetadas nos conservadores que fingem estar livres de preconceitos – por exemplo, ao criticar disfarçadamente O Segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005) e as produções para TV da Hallmark. Isso tudo, na verdade, vale mais pelo clamor pela autenticidade do que pelo seu potencial cômico.
Quebrando convenções
A direção de Nicholas Stoller é competente na maior parte do filme. Mas falha perto do final, quando o protagonista que está no palco supostamente vê o seu amado na plateia. É o que a óbvia narrativa quer contar, mas, sem destacar devidamente este último, só descobrimos o que ele viu se voltarmos o filme e prestarmos muita atenção. Embora seja uma cena básica, vários diretores em produções atuais não estão conseguindo filmar.
Enfim, acima de tudo, Mais Que Amigos consegue cumprir sua intenção principal. Ou seja, quebra convenções para quem ainda insiste em mantê-las. E abre portas para maior participação da comunidade LGBTQ+ em filmes de gênero (comédia, romance, ação, terror etc.). Billy Eichner usa o filme como protesto, mas essa mudança também pode vir organicamente, como na deliciosa comédia romântica brasileira 45 Dias Sem Você (2019), de Rafael Gomes.
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Ficha técnica:
Mais Que Amigos | Bros | 2022 | 116 min | EUA | Direção: Nicholas Stoller | Roteiro: Billy Eichner, Nicholas Stoller | Elenco: Billy Eichner, Luke Macfarlane, Guy Branum, Miss Lawrence, TS Madison, Dot-Marie Jones, Jim Rash, Eve Lindley, Monica Raymund.
Distribuição: Universal.