O esquema de contratar um astro veterano para viabilizar a produção de um filme pequeno continua em vigor. É bom para o ator, que faz seu ganha-pão, e para os realizadores, que assim conseguem vender seus títulos. Para os distribuidores, talvez nem tanto, mas como muitos desses produtos vão direto ao streaming, servem para popular o catálogo. Bruce Willis embarcou nesse jogo antes mesmo de ser diagnosticado com afasia em 2022, ano em que foram lançados onze filmes com sua atuação. Um deles é No Lugar Errado (Wrong Place), dirigido por Mike Burns, que já trabalhara com Willis em Fuga da Morte (Out of Death, 2021).
A fraqueza de Mike Burns aparece logo na primeira cena. Num consultório, Chloe (Ashley Greene) recebe a triste notícia de que está com câncer. Bastava filmar dois planos básicos, um com a câmera filmando a médica, e a outra apontada para Chloe sentada ao lado da mãe. Seria suficiente para explicar a situação. Mas, Burns usa o mesmo ângulo para filmar os closes da filha e da mãe, que assim parecem a mesma pessoa. Para o expectador, que está conhecendo esses personagens agora, a mise-en-scène é confusa. Parece que só Chloe estava sentada à frente da doutora, e a mãe de Chloe surge do nada e dá um abraço de conforto na filha. Se o diretor faz trapalhada com uma cena dessas, imagine o que vem pela frente.
Má direção
E No Lugar Errado traz muitos exemplos dessa má direção. A impressão que dá é que o montador usou tomadas que não funcionavam, só porque tinha o material filmado. A solução primária (repetir os gestos cotidianos e mostrar o dia da semana numa cartela) para mostrar a passagem do tempo tira a paciência de qualquer espectador. Além de erros de posicionamento de câmera, há também o uso inadequado de câmera trêmula e edição confusa. Para agravar, várias cenas desnecessariamente longas sobre detalhes insignificantes para a trama deixam o ritmo lento. Por exemplo, gasta-se um tempão nos diálogos entre Chloe e sua namorada a respeito do receio de como o pai reagirá por ela trazer essa companhia. Fato que não tem nenhuma importância na história.
Aliás, o roteiro, do novato Bill Lawrence (o mesmo de Fuga da Morte), complica ainda mais o trabalho do diretor. E olha que começa bem, com um pé no melodrama. Afinal, Frank (Bruce Willis) recebe a dura notícia do câncer da filha e, depois, sofre um acidente automobilístico no qual sua esposa morre. Por estar dirigindo embriagado, ele perde o emprego de capitão da polícia. Desgraça suficiente para criar um forte background para o estado mental dos protagonistas quando a história começa de fato, um ano depois da tragédia. Mas, o roteiro desperdiça essa oportunidade.
Obstáculos para a narrativa
Logo, o filme investe na ação, e esta não consegue fluir. Há ruídos demais que atrapalham o andamento da narrativa. Feridos que ora impedem que o personagem se movimente, ora não. Tiros que certamente matariam mas que não matam. Rivais que hesitam em acabar com seus oponentes. Tem até o xerife que substituiu Frank, com falas engraçadinhas nos momentos de tensão, e ainda um monólogo dramático que é demais para a capacidade do ator que o interpreta.
Com isso, a trama, que é simples, se torna obscura. No fundo, se trata de um caso de silenciar uma testemunha. Frank vê um traficante matar um homem e o segura até a polícia chegar. Um ano depois, o bandido irá a julgamento e só permanecerá na prisão caso Frank testemunhe. Então, cabe ao filho do criminoso impedir que o ex-capitão dê o seu depoimento em juízo. Nisso, ele encontra a filha de Frank e a usa como isca.
No Lugar Errado, enfim, é mais uma prova de que, nesse jogo de ganha-ganha da indústria de Hollywood, quem certamente sai perdendo é o espectador.
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Ficha técnica:
No Lugar Errado | Wrong Place | 2022 | 96 min | EUA | Direção: Mike Burns | Roteiro: Bill Lawrence | Elenco: Ashley Greene, Bruce Willis, Michael Sirow, Texas Battle, Stacey Danger, Massi Furlan, Lauren McCord.
Assista ao trailer aqui.
