O drama iraquiano O Apartamento constrói situações tensas para revelar o verdadeiro caráter das pessoas.
A trama parte do rompimento do cotidiano e segue com a busca da retomada do equilíbrio de antes. Próximo à estreia da peça “A Morte do Caixeiro Viajante”, de Arthur Miller, os atores Emad e Rana, casados fora do palco, precisam sair com urgência do apartamento deles porque o imóvel corre o risco de desabar. Essa primeira cena é extraordinária, filmada em plano sequência com vários personagens e muita ação. Além de revelar o desespero dessa situação, mostra como Emad é uma pessoa solidária, pois ele ajuda um rapaz com deficiência.
Um amigo da trupe teatral lhes oferece um apartamento, e logo eles se mudam para lá. Porém, um dos clientes da antiga inquilina, que era uma prostituta, entra no apartamento quando Rana está sozinha no banho. Os vizinhos a encontram ferida e a levam para o hospital. Então, o marido Emad parte para uma investigação por conta para encontrar e punir o invasor.
Trechos dos ensaios e da encenação da peça intercalam o enredo principal. Dessa forma, é possível relacionar o protagonista de Arthur Miller com o homem que entrou no apartamento de Emad e Rana. Ambos traem suas esposas e terminam a história mortos. Esse detalhe enriquece o filme, porém, o essencial é revelar a reação de Emad diante do incidente com sua esposa. Esta toma uma atitude consideravelmente serena, mesmo sendo a vítima da situação. Já Emad, pelo contrário, fica transtornado, e age obsessivamente para se vingar. Uma parte desse desespero vem à tona quando os dois estão no carro e descobrem que o furgão do suspeito desapareceu.
Desequilíbrio
Contudo, é no final que a atitude desmedida se torna evidente. Emad recorre ao uso do cárcere privado e do abuso moral para retaliar o culpado, um homem de idade que traía sua esposa. Quando Rana presencia esse ato, ela age como contrapeso para equilibrar o comportamento de seu marido. Porém, Emad parte para a agressão física, e esta o filme não perdoa, e pune-o com uma consequência trágica, que o perseguirá pelo resto de sua vida. Inclusive, Rana parte sozinha, indicando a separação do casal. Eles ainda se encaram enquanto são maquiados para a peça, mas nem se falam. Rana não quer mais esse homem como marido.
Essa transformação de Emad se relaciona com o conto “A Vaca”, de Gholem-Hossein Saedi, que ele lê para seus alunos em classe. A história fala sobre um homem que enlouquece depois que sua vaca morre, e passa a agir como ela. Da mesma forma, Emad perde o controle por causa do homem que invadiu seu apartamento e, aparentemente, tentou violentar sua mulher.
Tenso do primeiro ao último minuto, O Apartamento alerta para atitudes desmedidas que podemos assumir irracionalmente. Nesse sentido, o filme retrata uma situação limite, sempre dentro do factível, mas que caberiam situações cotidianas em casa, no trabalho, na rua.
Por fim, O Apartamento ganhou vários prêmios internacionais. Entre eles, os de melhor ator (Shahab Hosseini) e roteiro (do próprio Asghar Farhadi). E, também, o Oscar de melhor filme em língua estrangeira, repetindo o feito de A Separação, filme de Farhadi de 2012.
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Ficha técnica:
O Apartamento | Forushande | 2016 | Irã, França | 124 min | Direção e roteiro: Asghar Farhadi | Elenco: Shahab Hosseini, Taraneh Alidoosti, Mina Sadati, Babak Karimi, Maral Bani Adam, Farid Sajjadi Hosseini, Mehdi Koushki.