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Poster do filme "O Dia Que Te Conheci"
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O Dia Que Te Conheci

Avaliação:
9/10

9/10

Crítica | Ficha técnica

A simplicidade da trama de O Dia Que Te Conheci talvez afaste o público que escolhe filmes com base na estória. O enredo acompanha um dia na vida de Zeca (Renato Novaes). Sua rotina se parece com a de milhões de brasileiros, que se esforçam para levantar cedo todos os dias para ir ao trabalho que fica longe de onde moram. A conversa inicial parece uma banalidade, com um toque de comédia: Zeca pede com insistência para que o amigo com quem divide a casa o acorde às seis e meia. Como Zeca sabe que tem problemas para acordar cedo, sugere até jogar água nele. O amigo não faz isso, e o protagonista chega novamente atrasado, com direito a ônibus quebrado, à escola onde trabalha na biblioteca.

Tudo parece corriqueiro nessa narrativa – e, de fato, essa deve ter sido a intenção para atingir o naturalismo tão valorizado no cinema brasileiro contemporâneo. Nesse quesito, O Dia Que Te Conheci é tão eficiente quanto Temporada (2018), longa anterior do diretor André Novais Oliveira. Um traço presente em seu cinema desde seu curta de estreia, Fantasmas (2010), principalmente nos diálogos sempre autênticos. Contudo, embora essa característica seja valiosa para mostrar uma realidade que a parte minoritária e privilegiada da população brasileira não conhece, a qualidade maior da obra de Novais está na sua maneira de filmar.

O cinema de André Novais

Resistente à moda do cinema independente mundial de registrar tudo com a câmera na mão para buscar o naturalismo, André Novais Oliveira prefere a câmera fixa no tripé. Neste seu novo filme, recorre aos planos longos, com alguns poucos cortes com pequenos planos-detalhes de objetos ou de pessoas, seja para dar um alívio nos extensos diálogos, seja para apresentar alguns personagens aleatórios (como os extras que fazem os passageiros do ônibus que quebra), que servem para acrescentar mais autenticidade ainda ao filme (eles ilustram as pessoas que vemos nas ruas). Além disso, quebra a estática da câmera fixa com o uso do zoom que velozmente se aproxima do personagem que se move pelas ruas.

Dessa forma, Novais comunica e não comunica visualmente, de acordo com o que quer transmitir. Dentro do não comunica, provoca o espectador ávido por descobrir quem é a tal pessoa que Zeca conhece nesse dia (como instiga o título). Será o homem que, do nada (o público estrangeiro pode achar isso falso, mas é uma situação comum por aqui), o convida para comer um pastel enquanto o próximo ônibus não chega? Ou a mãe da aluna na escola que puxa papo com ele (numa cena que exemplifica o uso da câmera fixa e plano longo do diretor)? Mas, também pode ser Luísa (Grace Passô), colega de trabalho a quem ele conhece apenas superficialmente.

A arte de comunicar visualmente

Já sobre a arte de comunicar, Novais utiliza enquadramentos previamente planejados. Aquela conversa com a mãe da aluna, por exemplo, acontece com os dois à frente de um grande muro, Zeca no centro do quadro, ela no canto esquerdo. Eles mantêm uma certa distância um do outro, e permanecem estáticos, o que comunica visualmente que não avançarão para um relacionamento. Outro momento marcante em relação ao uso do enquadramento é a cena na sala na casa de Zeca. A porta do quarto dele está aberta, à direita na tela, e Luisa se convida para ir até lá. O espectador pode ver o que ele não vê, ou seja, ela se preparando para recebê-lo já deitada na cama. Como se fosse uma tela dividida em dois, Zeca permanece hesitante no sofá da sala.

A escola da trilha música para as cenas em que o protagonista se move pelas ruas soa inusitada. Há um contraste entre os temas eruditos orquestrados e esse cotidiano simples dos subúrbios brasileiros. Porém, a escolha faz sentido quando pensamos na universalidade da história que o filme conta. Afinal, não é um dia qualquer para Zeca. Como mostra o último plano, esse é o dia que mudou a sua vida. Sua rotina muda com a paixão que surge. Na manhã seguinte, ele acorda cedo (algo que era um problema para ele), e pede na padaria uma compra diferente do que costuma fazer todos os dias. E, sendo André Novais Oliveira um cineasta que preza pela forma, a tela muda de formato, ficando mais retangular, para enfatizar que, dali para frente, tudo ficará diferente para o personagem.

Acima de tudo, essa narrativa simples, mas bela e universal, de O Dia Que Te Conheci, serve de matéria-prima para um cineasta que aprecia esculpir a forma de sua obra.

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Ficha técnica:

O Dia Que Te Conheci | 2023 | 71 min. | Brasil | Direção: André Novais Oliveira | Roteiro: André Novais Oliveira | Elenco: Grace Passô, Renato Novaes, Kelly Crifer, Fabrício Fbc.

Distribuição: Malute.

Trailer:

Onde assistir:
Cena do filme "O Dia Que Te Conheci"
Cena do filme "O Dia Que Te Conheci"
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