Dirigido por Manoel de Oliveira, O Estanho Caso de Angélica impacta o espectador como um pequeno conto fantástico, onde o enredo simples convida à busca por um significado.
O filme permite várias interpretações, pois sua história se abre para isso.
Isaac acode a um pedido urgente de seus serviços como fotógrafo. Uma jovem de nome Angélica morreu de repente e sua mãe deseja um retrato dela, mesmo falecida, como recordação. Quando a bela mulher, que nem parece morta, é vista pelas lentes da máquina fotográfica de Isaac, ela olha para o rapaz e sorri, para seu espanto. Após a revelação das fotos, o fenômeno se repete nessas imagens, e Isaac se torna um homem atormentado, principalmente depois que ela aparece em seu quarto e os dois passeiam flutuando pela cidade.
Interpretações
Para muitos, O Estanho Caso de Angélica revela uma esquisita paixão platônica. Preferimos, no entanto, interpretar o filme como se Isaac visse a morte em Angélica. Por isso, na manhã seguinte ao velório, ele está desesperado por fotografar o trabalho manual dos homens na plantação em frente da pensão onde mora. Ele mesmo afirma à sua senhoria que precisa correr porque ele quer registrar os trabalhadores enquanto eles ainda estão lá. Em breve, eles serão substituídos por máquinas. A morte do trabalho braçal está próxima, assim como a do próprio Isaac.
Outro elemento em cena indica a morte como elemento principal de O Estanho Caso de Angélica. Na sala de jantar da pensão, alguns personagens conversam, e no canto da tela, vemos um gato olhando para o pássaro, que se encontra em uma posição inalcançável para ele, dentro de uma gaiola pendurada no alto. Parece que o animal aparece na cena aleatoriamente, mas a câmera se mantém nele por alguns segundos depois que os personagens saem. Se foi por acaso, o diretor Manoel de Oliveira resolveu, de improviso, mantê-lo na cena.
Esse pássaro que o gato cobiça representa peça chave no filme. Ao aparecer morto na gaiola, Isaac mostra uma inesperada comoção que o conduz ao destino fatalmente prenunciado pela aparição de Angélica. No final da estória, ele aceita o chamado da morte.
Os planos longos com câmera estática e a trilha sonora conduzida no piano marcam o ritmo lento de O Estanho Caso de Angélica. É um contraponto ao desespero de seu protagonista em alcançar o seu objetivo, seja ele o objeto de sua paixão, ou o chamado da morte. Mas a lentidão favorece o processo de reflexão do espectador. Afinal, ausente o esforço de busca do sentido desse conto, inútil é assisti-lo.
Ficha técnica:
O Estanho Caso de Angélica (O Estranho Caso de Angélica, 2010)
Portugal/Espanha/França/Brasil. 97 min. Dir/Rot: Manoel de Oliveira. Elenco: Ricardo Trêpa, Adelaide Teixeira, Ana Maria Magalhães, Pilar López de Ayala, Isabel Ruth, Sara Carinhas, Carmen Santos, Paulo Matos, Susana Sá, Ricardo Aibéo.
