Pelos olhos do protagonista de O Garoto Toshio, testemunhamos um revoltante esquema fraudulento. A vítima: um menino de dez anos.
Toshio vive como um nômade com o pai Takeo, a madrasta Takeko e o irmão de uns quatro anos. Para ganhar dinheiro, eles sucessivamente repetem o golpe em que a mulher finge que é atropelada. Como as leis de trânsito são muito rigorosas no Japão, eles sempre conseguem fazer um acordo financeiro com o motorista, que quer evitar o registro policial. Logo, também Toshio passa a participar do esquema como a pessoa supostamente atropelada.
A princípio, a esposa e o menino parecem concordar com esse plano. Afinal, Takeo alega que é um veterano de guerra inválido e não pode trabalhar. Então, ele participa da farsa apenas na discussão com os motoristas. Porém, com o tempo, a madrasta Takeko se revolta, principalmente porque o marido sempre fica em hotéis melhores que o dela, quando precisam viajar em separado. Por isso, ela e Toshio começam a praticar o golpe por conta, sem a participação de Takeo.
Tanto Toshio quanto a sua madrasta estão com suas morais deturpadas, diante dessa prática que se estende por muito tempo. No entanto, a consciência do menino desperta quando ele testemunha uma garota morrer durante um golpe frustrado. Então, como o pai o obriga a continuar no esquema, ele tem pensamentos destrutivos. Para ele, está claro que seus pais não o amam. Esse sentimento só é superado quando o irmãozinho, espontaneamente, vai atrás dele mostrar o quanto precisa de sua companhia.
Direção de Nagisa Oshima
Este é o segundo longa em sequência que o diretor Nagisa Oshima retrata o mundo do crime. Antes, esse recorte apareceu em Diário de um Ladrão de Shinjuku (1969). Além disso, esses filmes se alinham com os temas polêmicos que marcaram a sua obra, e que culminariam em O Império dos Sentidos (1976).
Visualmente, ao contrário das cores fortes que refletem o calor do desejo sexual daquele clássico da arte pornô, em O Garoto Toshio Oshima retrata a tristeza do menino através de tons esmaecidos. Por isso, na parte final, as ruas cobertas de neve funcionam como solução natural da ausência de cores. Mas, o artificialismo não é impedimento para o diretor, que até assume o preto e branco em algumas cenas.
Por outro lado, a trilha sonora com notas desarmônicas evidencia o desconforto dessa situação reprovável que Takeo impõe à sua família. Com isso, Oshima quer deixar claro que condena essa exploração.
Sem cenas melodramática, O Garoto Toshio revela a tristeza do menino. Toshio tenta fugir, retornar para a casa da avó, mas não consegue. Assim, em alguns momentos, ele fala sozinho, pois ele não confia em mais ninguém. Por isso, chora de desespero.
Mais triste ainda é saber que o filme se baseia em acontecimentos reais.
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Ficha técnica:
O Garoto Toshio (Shonen) 1969. Japão. 105 min. Direção: Nagisa Oshima. Roteiro: Tsutomu Tamura. Elenco: Fumio Watanabe, Akiko Koyama, Toshi Amatsu, Toshi Amatsu, Tsuyoshi Kinoshita.