O Otimista (The Optimists of Nine Elms/The Optimists) é o terceiro longa do diretor Anthony Simmons, autor também do livro que serviu de base para o seu roteiro. Pessoalmente, está na minha lista dos filmes que produziram em mim uma memória afetiva permanente. Provavelmente porque o vi quando ainda era criança (ou no máximo pré-adolescente) em uma exibição no fim da noite na TV Bandeirantes. E, se minha memória não falha, foi exibido com o título “Os Otimistas”.
Ao rever o filme hoje, ficam evidentes os motivos para essa impressão tão duradoura. É uma história universal, que consegue tocar a sensibilidade do espectador. Dois dos protagonistas são crianças, a mais velha, Liz, tinha a mesma idade que eu, e seu irmão, Mark, seis anos. A família mora no bairro Nine Elms. É onde fica a estação de energia Battersea, eternizada pelo Pink Floyd na capa do LP “Animals” (1977) e que pode ser vista no filme.
Hoje a região se modernizou, mas na época era repleta de indústrias e lá moravam os seus operários. Aliás, como os pais de Liz e Mark, que trabalham muito e ganham pouco. A mãe ainda tem que cuidar do filho mais novo, um bebê. Enquanto isso, o pai sempre faz hora-extra, para viabilizar o sonho de se mudarem para um dos novos prédios do outro lado do Rio Thames. Por isso, sobra pouco tempo para os pais se dedicarem a Liz e Mark, que ficam perambulando pelo bairro durante o dia.
Sam, Liz e Mark
Numa dessas andanças, eles fazem amizade com o velho Sam, um ex-artista desempregado que mora à beira do rio ao lado de uma fábrica desativada. Apesar das circunstâncias, ele sempre parece animado. Afinal, é isso que ele tem a oferecer nas ruas com suas músicas e os truques de sua cachorra Bella em troca de algumas moedas.
Um dos charmes da parte inicial do filme é a convergência do talento artístico do experiente Sam com a capacidade natural das duas crianças em responderem à altura com suas línguas afiadas. Esse encontro mágico extrapola as páginas do roteiro e resulta da química entre o veterano Peter Sellers com a espontaneidade dos atores não profissionais Donna Mullane (Liz) e John Chaffey (Mark). Testemunhamos aqui um fenômeno afortunado que o cinema atinge raras vezes e, nesse caso, definitivamente único pois as duas crianças nunca mais atuaram.
A direção de Anthony Simmons também contribui para o naturalismo do filme. Além de privilegiar as filmagens em locações, Simmons capta as reações das pessoas nas ruas (sejam transeuntes que até olham para trás para descobrir o que a câmera está filmando ou policiais observando se tudo está em ordem). Além disso, a câmera se movimenta muito, em travellings que acompanham (e por vezem perdem) os personagens. E também em zooms que se aproximam e se afastam velozmente da pessoa em foco.
Quase inesquecível
Voltando à trama, notamos uma diferença marcante entre a percepção do mundo por parte de Liz e de Mark. O mais novo ainda não perdeu a inocência, e não tem filtros para suas esperanças para um futuro melhor. Já a mais velha possui um olhar mais crítico, e não se abre tão facilmente para as fantasias otimistas de Sam. Aliás, o enredo não é um conto de fadas, e procura mostrar o lado bom e o lado ruim da vida. Por exemplo, a ótima notícia da aprovação da compra do apartamento logo se contrapõe à decepção porque Liz e Mark não podem levar o recém-adotado cachorro para lá.
Assim, se fôssemos apontar uma transformação nos personagens, não seria em Liz, mas no menino que perceberia que a vida é mais dura do que ele pensava. Na verdade, quem passa mesmo por uma mudança é o pai deles, que aprende a dar mais atenção aos filhos. Essa conclusão, para sermos sinceros, não e tão emocionante quanto outros momentos do filme, e ainda chega a incluir um inusitado humor pastelão que não se encaixa bem com o restante da história. Se O Otimista contasse com um final mais impactante, esse seria um filme verdadeiramente inesquecível. E não apenas uma forte memória afetiva.
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Ficha técnica:
O Otimista | The Optimists of Nine Elms | 1973 | 110 min | Reino Unido | Direção: Anthony Simmons | Roteiro: Tudor Gates | Elenco: Peter Sellers, Donna Mullane, John Chaffey, David Daker, Marjorie Yates, Katyana Kass, Patricia Brake.
Obs: o filme também é conhecido como “Os Otimistas” (The Optimists).