Bud Boetticher se identifica com o melhor do filme B dentro do gênero faroeste e O Resgate do Bandoleiro se destaca como paradigma de sua cinematografia.
Contando com Randolph Scott, protagonista em sete de seus filmes, Boetticher constrói um herói que foge do estereótipo “o mais rápido gatilho do oeste”. No papel de Pat Brennan, Scott é um pacato fazendeiro que se desloca até o rancho de seu ex-patrão para comprar dele um touro. Porém, os dois fazem uma aposta e Pat perde seu cavalo, tendo que voltar para casa caminhando. No trajeto, consegue uma carona na carruagem de um amigo, que leva um casal em lua de mel. Para desgraça de todos, eles encontram três bandidos. O cocheiro é morto, e esse seria o mesmo destino dos passageiros e só não é porque o marido recém-casado oferece sua mulher como refém para pedir um resgate ao pai dela, cuja fortuna motivou seu casamento.
O perigo que os três reféns correm está evidente porque eles mataram o viúvo e seu filho que moravam na estação onde eles abordaram a carruagem em que estava Pat, chocado porque os dois eram seus amigos. E matam sem piedade o cocheiro. O casal é poupado porque podem render um bom dinheiro de resgate, já no caso de Pat, só descobriremos mais tarde.
Não é um faroeste clássico
Desde o início, notamos diferenças em relação ao faroeste clássico. Na abertura, Randolph Scott caminha em direção à tela, em movimento vertical, e não horizontal, contrariando uma das principais características do gênero. Quando Pat encontra seu amigo e seu filho, no caminho para a fazenda do ex-patrão, parece que estamos diante da cena similar de Os Brutos Também Amam (Shane, 1953) – o menino, inclusive, tem a mesma idade e a mesma voz. Porém, ao contrário de Shane, Pat não é, e nunca foi, um pistoleiro. Quando Pat está partindo, o menino grita para que ele retorne. E seu pedido não é algo digno de um grande herói: o garoto quer que Pat compre um punhado de doces no armazém. Fica evidente, então, quem é o protagonista, apenas um homem comum.
Diante da situação de perigo que se encontra, aprisionado pelos três bandidos, Pat usa o melhor recurso que possui, sua astúcia. Através da conversação, insinua subliminarmente que o líder dos criminosos, Frank Usher (Richard Boone), não confie nos seus subalternos, e parta sozinho para coletar o dinheiro do resgate. Após a saída de Frank, com artifício semelhante, Pat consegue derrotar os dois bandidos que ficaram. Note a violência da cena em que o bandido Billy Jack é morto, incomum para a época.
Pat consegue também transformar Doretta (Maureen O’Sullivan), uma mulher solteirona, enrustida e submissa, porque sempre foi desprezada pelo pai, que queria um filho homem. Ela se resigna a se casar com o interesseiro Willard (John Hubbard), só para não permanecer solteira. Depois de ser traída pelo marido que a oferece como refém aos bandidos, ela se sente totalmente desprezada. Em conversa íntima, Pat a desperta de sua apatia.
Admiração não explicada
O que não fica explicitado, mas é o tema mais importante do filme, é o motivo da admiração do vilão Frank Usher por Pat Brennan. Frank diz a Pat que não o matou porque gosta dele mas não sabe o motivo. O espectador atento, porém, conhece a resposta. O nosso herói não possui nenhum talento especial, não é o grande pistoleiro do oeste, mas é íntegro. Sua ética não permite nem que ele use os cavalos dos bandidos no final do filme, preferindo ir embora caminhando. Antes, quando perdeu a aposta, simplesmente pagou sua parte e, também, partiu a pé. Frank deseja ser um homem com essa honra, mas não conhece os caminhos da correção. Por condenar a atitude do marido interesseiro de Doretta, ele manda mata-lo. Para Pat, o uso da arma só é válido em legítima defesa.
Tudo parece dar certo nessa produção. Até no caso de Maureen O’Sullivan. A Jane dos tempos de Johnny Weismuller como Tarzan, parece bem envelhecida para a idade que tinha (46) e visivelmente incomodada ao montar a cavalo – há uma cena em que o cavalo de Randolph Scott quase a derruba do cavalo dela. Mas tudo isso ajuda a caracterizar a personagem, que sofria de falta de amor próprio e não tinha saído da cidade.
Martin Scorsese, em seu livro “Uma Viagem Pessoal pelo Cinema Americano” conclui o seguinte sobre os filmes de Budd Boetticher, que se aplica perfeitamente a O Resgate do Bandoleiro: “No jogo de poder, o herói e o vilão eram figuras complementares: compartilhavam a mesma solidão, os mesmos sonhos e até o mesmo código ético. De algum modo o cavalheiro e o facínora eram fascinados um pelo outro.”
Ficha técnica:
O Resgate do Bandoleiro (The Tall T, 1957) EUA. 78 min. Dir: Bud Boetticher. Rot: Burt Kennedy. Elenco: Randolph Scott, Richard Boone, Maureen O’Sullivan, Arthur Hunnicutt, Skip Homeier, Henry Silva, John Hubbard, Robert Burton.
Assista: documentário sobre Budd Boetticher
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