O Segredo de Davi apresenta uma trama de suspense e mistério com pegada sobrenatural, sem entrar num clima extremamente sombrio. Algumas cenas parecem caminhar para este lado mais obscuro, mas o filme sempre volta para um tom mais ameno.
Davi é um estudante perturbado, recluso e com o estranho hábito de filmar as pessoas em todo o lugar. Com uma pequena câmera de mão, filma pela janela uma vizinha idosa que vive sozinha como ele, e também Jônatas, um rapaz de quem ele acaba gostando.
Jônatas sacrifica uma pomba que estava com a asa quebrada e isso desperta em Davi, inconscientemente, uma necessidade análoga, que o conduz até o apartamento da vizinha e a sacrifica. Além de matar, ele ainda filma esse ato criminoso para postar num site de filmes snuff (com cenas reais de morte). Mas, a vizinha aparece para Davi na manhã seguinte como uma pessoa que fez parte da infância dele, e ela lhe avisa que ele precisa trazer outras pessoas de volta. Dessa forma, Davi parte atrás de outras vítimas, transformando-se em um serial killer.
O Segredo de Davi constrói Davi como um personagem esquisito, abalado por um trauma de infância. Esse segredo do protagonista, presente no título, vai sendo revelado ao espectador aos poucos, criando um clima de mistério instigante. Breves flashes do passado vão estimulando a curiosidade do público de descobrir qual foi a tragédia que aconteceu na infância dele.
Suspense que evita o terror
Porém, infelizmente o filme prefere não assumir completamente o gênero terror. De fato, as aparições resgatadas do passado, ao invés de assustadoras, representam espíritos de bem com a vida (ou com a morte?), quando poderiam criar um clima de medo no espectador. A cena do assassinato do motorista de taxi beira o limite do gore, mas as demais mortes são mais asseadas. Então, O Segredo de Davi flerta com o terror, mas permanece apenas no suspense sobrenatural.
O filme possui a lacuna de não explicar a ausência da mãe entre os que retornam do passado de Davi. Supostamente, porque ela se suicidou e talvez isso impeça essa redenção, mas isso não está no roteiro. Em outro ponto, a história assume o que não é apresentado, que é quando perguntam a Davi o motivo de ele querer ser cineasta, sendo que ele nunca afirma essa intenção. Além disso, sua mania de voyeur está longe de caracterizar o hábito de um futuro diretor de cinema. Isso talvez seja reflexo da buscar por construir um personagem rico, mas há características demais em Davi. Além de estudante, cineasta em potencial, ele ainda é hacker, e isso deveria explicar sua motivação incoerente de subir os vídeos de seus assassinatos para a rede, que não é relevante para o enredo.
Conclusão amena
E a intenção de não fazer de O Segredo de Davi um filme de terror deve ter motivado o roteirista e diretor Diego Freitas a criar uma conclusão bem amena. Por isso, a tragédia que alimentou a expectativa do espectador durante todo o filme é revelada com uma preocupação exagerada em apresentar uma solução factível. Desde a primeira cena, quando o filme mostra o menino aprendendo a usar um revólver com o pai, fica a ideia do perigo em facilitar o acesso às armas. Isso, aliado a uma compreensão imatura que esse menino tem ao flagrar mãe e o pai fazendo sexo, permitindo ainda uma leve inserção de teoria freudiana, compõe essa necessidade de uma justificativa racional para o trauma de infância de Davi.
Enfim, O Segredo de Davi é bem dirigido, porém sem alcançar um clima assustador. E, poderia ter se transformado em um filme verdadeiramente horripilante, como apresentou o também brasileiro Mal Nosso (2019).
Ficha técnica:
O Segredo de Davi | 2018 | Brasil | 102 min | Direção e roteiro: Diego Freitas | Elenco: Nicolas Prattes, André Hendges, Neusa Maria Faro, Eucir de Souza, Cris Vianna, Bianca Muller, Giselle Prattes, João Côrtes, Giulia Ouro.