Fritz Lang retoma o arquivilão de seu “Dr. Mabuse, o Jogador” (1922) na intrincada história de “O Testamento do Dr. Mabuse”, onze anos depois, com o mesmo ator, Rudolf Klein-Rogge.
O Dr. Mabuse está moribundo, preso em um manicômio. Mesmo assim, ele ainda consegue colocar em marcha seu derradeiro plano de roubos e caos. E faz isso ao controlar a mente do respeitado médico Dr. Baum, que comanda um grupo de malfeitores anonimamente. Ele grava as ordens e as reproduz como se estivesse presente no quartel general dos criminosos. Então, cabe ao Inspetor Lohmann desvendar quem é o responsável pelos atos criminosos que assolam a cidade de Berlim.
Influência subversiva
O tom sério do filme exala uma ameaça que assusta porque aborda crimes que podem de fato acontecer. Por isso, o governo nazista proibiu sua exibição na Alemanha, preocupado com a influência subversiva que a obra poderia causar em uma época de ditadura. O fato de Fritz Lang já ser um cineasta respeitado – ele já realizara “Metrópolis” (1927) e “M, O Vampiro de Dusseldorf” (1931) – não impediu a censura. E, como, posteriormente, Lang não aceitou o convite de trabalhar no Instituto de Cinema nazista, fugiu para a França e depois para os Estados Unidos em 1934. “O Testamento do Dr. Mabuse” foi, portanto, o seu último filme alemão antes do exílio. Mas, em 1960, ele voltaria a filmar o icônico vilão em “Os Mil Olhos do Dr. Mabuse”, rodado na Alemanha.
A peça central para a resolução da trama é o jovem Thomas Kent, um dos bandidos do Dr. Baum, que se arrepende e busca se redimir diante do amor incondicional mostrado por sua namorada Lilli. Porém, os traidores da gangue são friamente executados e esse poderá ser o destino de Kent e Lilli, quando são trancados em um quarto vazio com uma bomba escondida. Em um filme repleto de cenas filmadas com maestria por Fritz Lang, essa sequência provavelmente supera todas.
A bomba prestes a explodir
Lang compartilha a regra de Hitchcock para se criar um clima de suspense. Os espectadores sabem que existe uma bomba prestes a explodir e, então, os personagens precisam descobrir rapidamente como fugir daquele local. Aumenta o mistério o fato de descobrirem que o chefe da quadrilha, na verdade, não estava ali, pois era apenas sua voz gravada que estava ali escondida atrás da cortina dando ordens. O casal passa, então, a arrancar as madeiras do teto, cavar buracos no piso, desesperadamente, para descobrir uma saída ou a própria bomba para tentar desativá-la. Até que (atenção: spoiler), Kent vê um cano de água e inunda o local para abafar a explosão iminente.
Essa cena de “O Testamento do Dr Mabuse” é tão moderna que parece uma variação de “Jogos Mortais” (Jigsaw, 2004), o aterrorizante filme que virou sucesso mundial e gerou várias sequências. Na franquia, há um vilão anônimo que transmite as instruções às suas vítimas através de um aparelho sonoro, e elas terão que desvendar um quebra-cabeças para conseguirem encontrar a saída da armadilha em que estão. Ou seja, uma ideia semelhante ao que Fritz Lang criou para esse seu clássico de 1933. Vejam aí o pioneirismo deste cineasta soberbo.
Ficha técnica:
O Testamento do Dr Mabuse (Das Testament des Dr. Mabuse, 1933) Alemanha, 122 min. Dir: Fritz Lang. Rot: Fritz Lang, Norbert Jacques, Thea von Harbou. Elenco: Rudolf Klein-Rogge, Gustav Diessl, Wera Liessem, Rudolf Schündler, Oskar Höcker, Theo Lingen, Camilla Spira, Paul Henckels, Otto Wernicke, Theodor Loos, Oscar Beregi Sr.
“O Testamento do Dr Mabuse” foi lançado em dvd pela Obras-Primas do Cinema