Um rápido relance em Observadores (The Voyeurs) basta para desconfiarmos que o filme se inspira em Janela Indiscreta (Rear Window, 1954), talvez o melhor filme do mestre Alfred Hitchcock. E, de fato, logo após os namorados Pippa (Sydney Sweeney) e Thomas (Justice Smith) entrarem no primeiro apartamento deles em Montreal (por isso algumas pessoas falam em francês), notam que conseguem ver um casal do apartamento do outro lado da rua fazendo sexo. Em seguida, surge uma montagem com outras janelas do mesmo prédio, igualmente visíveis para Pippa e Thomas, tal como é para James Stewart no filme de Hitchcock. Na verdade, como a cena da transa é picante, acabamos por nos lembrar também de Dublê de Corpo (Body Double, 1984), de Brian De Palma.
O diretor e roteirista Michael Mohan, que fizera dois longas dentro do gênero comédia antes desse filme, não afirma que se inspirou nessas obras. Porém, é como se as tivesse visto e pensado em incluir mais reviravoltas na trama. Como De Palma, Mohan também faz do voyeurismo uma obsessão perigosa que coloca seus praticantes à mercê de pessoas mal-intencionadas.
Obsessão
É nesse espiral que cai Pippa, cada vez mais envolvida com a vida pessoal do casal da frente, formada pelo famoso fotógrafo Seb (Ben Hardy) e sua mulher Julia (Natasha Liu Bordizzo), uma ex-modelo. Ao descobrir que o marido é infiel, Pippa se sente compelida a avisar a esposa traída, apesar de Thomas ser contra essa ideia. A cena na qual Pippa prefere comprar o binóculos e não o acordeão que Thomas deseja demonstra o que ela prioriza. Mas, ao mexer nesse vespeiro, ela descobre que não é só o sexo que é picante.
O suspense funciona muito bem enquanto Pippa e Thomas (diga-se de passagem, um nome óbvio para o “peeping tom” da vez) espionam o apartamento da frente. O que fazem, sem dúvida, é moralmente errado, e o sempre presente risco de serem pegos é suficiente para manter a tensão no ar. A trama ainda coloca os dois mais perto desse perigo, ao entrarem nesse apartamento numa festa à fantasia, e ao instalar um equipamento que permitirá a eles escutarem as conversas do casal. Além disso, Pippa chega até a conhecer Julia pessoalmente.
Contudo, depois de o enredo frustrar com algumas decisões erradas da protagonista, acaba fugindo do suspense e caindo num drama trágico. Leva a uma situação que espelha a relação do casal em frente no próprio relacionamento de Pippa e Thomas. Uma suposta conclusão se mostra extremamente desapontador. Pelo menos, é um falso final, e novas viradas conseguem melhorar o enredo em sua reta final. Inclusive o desfecho sádico.
Cortes
Se a trama tem seus altos e baixos, a direção estilosa de Michael Mohan sustenta uma apreciação formal pelo filme. Além de enquadrar apropriadamente, optar pela duração certa dos planos, Mohan se destaca nas justaposições quase maneiristas que ligam o último ponto do plano anterior com o primeiro do seguinte. Por exemplo, o corte de uma cirurgia oftalmológica (o emblemático trabalho de Pippa) é seguido por um ovo cozido sendo partido ao meio (o almoço da mesma personagem). Esse recurso, em outras variações, se repete ao longo do filme, ajudando a manter o interesse do espectador, apesar do enredo irregular.
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Ficha técnica:
Observadores | The Voyeurs | 2021 | 116 min | EUA | Direção e roteiro: Michael Mohan | Elenco: Sydney Sweeney, Justice Smith, Ben Hardy, Natasha Liu Bordizzo, Katharine King So, Cameo Adele, Jean Yoon, Cait Alexander.
