Os Primeiros Soldados escancara o desespero dos primeiros infectados com a AIDS. A história se inicia na virada de ano de 1982 para 1983, quando Suzano (Johnny Massaro) retorna da França, já sabendo que foi infectado pelo seu marido estrangeiro. Sem revelar à família, ele se refugia numa casa isolada no interior, para onde se dirigem os seus dois amigos Rose (Renata Carvalho) e Humberto (Vitor Camilo). O filme retrata a solidariedade entre os três para sustentarem uma tênue esperança de cura com novos medicamentos.
O diretor Rodrigo de Oliveira realizou seu primeiro longa em 2011, intitulado As Horas Vulgares. Em 2017, codirigiu com Gustavo Ribeiro o documentário Todos os Paulos do Mundo, sobre o ator Paulo José. Apesar dessa bagagem, Os Primeiros Soldados é uma produção pequena, da capixaba Pique-Bandeira Filmes. Oliveira acumula as funções de roteirista, diretor e montador, e de suas mãos nasce uma narrativa não-linear com diferentes estilos.
A primeira parte conta a história cronologicamente, com paralelos dos três protagonistas. Suzano é o principal personagem, e por isso seus parentes – sua irmã e seu sobrinho – ganham status de protagonistas, inclusive com suas cenas autônomas. A narração que abre e fecha o longa também pertence a Suzano, e ilustra seus momentos de sensatez, como se fosse uma terceira pessoa assistindo aos seus clamores agonizantes. Tal qual Suzano, Rose entra na trama já infectada, resultado de sua arriscada jornada como prostituta transexual. Sua aparição, na primeira cena do filme, evidencia o preconceito contra o “vírus gay”, como foi alcunhada a AIDS na época. Nesse trecho, ela é impedida de subir num ônibus urbano. Já a perspectiva de Humberto é diferente. Ele inicia seu primeiro relacionamento homossexual, e oito meses depois, também se junta à turma de condenados de Suzano e Rose.
Found footage
A parte final de Os Primeiros Soldados se inicia após a morte de Suzano. A princípio, são trechos de vídeos captados pelo personagem Humberto, dentro da casa de campo. Como se fosse um found footage,esses trechos permitem acompanhar a deterioração da esperança dos três protagonistas infectados. São os momentos mais fortes do longa, pois as atuações impactantes dos atores explodem em depoimentos próprios de quem está condenado à morte. Além disso, por emularem vídeos amadores, essas cenas não são prejudicadas pelo orçamento reduzido da produção, como acontece em outros momentos – em especial, nas cenas no hospital, no primeiro encontro de Humberto com seu futuro parceiro e na boate. Por fim, a conclusão interrompe esses bons momentos de found footage para encerrar num tom esperançoso para a posterior geração da comunidade LGBTQIA+, personificada no personagem Muriel (Alex Bonini).
A força de Os Primeiros Soldados está na captação do desespero das vítimas de uma doença sem cura. Principalmente por causa da atuação de Johnny Massaro e Renata Carvalho, potencializada nas sequências de vídeos amadores. Um pouco desse estilo contamina o restante do filme, como nas movimentações laterais da câmera entre um personagem e outro nos diálogos, na manutenção da voz em off de quem está falando, ou na iluminação nem sempre adequada. Em suma, um filme desigual, mas com momentos impactantes.
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Ficha técnica:
Os Primeiros Soldados | 2021 | Brasil | 107 min | Direção e roteiro: Rodrigo de Oliveira | Elenco: Johnny Massaro, Renata Carvalho, Vitor Camilo, Clara Choveaux, Alex Bonini, Higor Campagnaro.
Distribuição: Vitrine Filmes.