A cineasta Christy Hall estreia na direção adaptando o seu próprio roteiro em Papai (Daddio), um filme que se apoia majoritariamente nos diálogos.
Variação dos filmes de uma só locação, Papai se passa quase inteiramente dentro de um daqueles táxis amarelos de Nova York. A passageira vivida por Dakota Johnson embarca no aeroporto de JFK para ir até o seu apartamento em Manhattan. O motorista, Clark (Sean Penn), inicia uma conversa que gradativamente se torna mais íntima, revelando segredos de ambos como se estivessem em uma sessão de terapia de via dupla. A certo ponto, entram num jogo de quem entrega mais confissões.
A situação parece improvável, mas os diálogos envolventes constroem uma sucessão plausível de aprofundamento. O espectador até desconfia que Clark possa ser um golpista, tamanha a habilidade com que ele arranca as confissões íntimas da passageira. Essa sensação se deve, também, ao fato de o público acompanhar exclusivamente a perspectiva da moça e ela esconder as mensagens que troca no celular com o seu amante (a quem ela chama de “papai”), e, mesmo assim, o motorista consegue deduzir como vai esse relacionamento dela. A experiência de vida de Clark, inclusive, ajuda-a a repensar essa situação. A princípio, parece que o amante só está interessado em sexo, já que insistentemente pede nudes para ela (além de enviar a foto do membro dele, sem que ela peça). Mas, há sentimentos envolvidos.
Na madrugada
O tempo do filme acompanha a duração real do trajeto, atrasado por conta de uma obra que interrompe o trânsito. Além disso, é essencial que a história aconteça durante a madrugada, quando as pessoas se sentem libertadas da rotina do dia e, por isso, estão mais abertas para novas experiências. Não fosse nesse horário, a passageira provavelmente se concentraria em seus compromissos, sem prestar atenção à conversa do motorista. Lembra o clima incomum de Depois de Horas (After Hours, 1985), que também acontece durante uma madrugada em Nova York.
O filme prende a atenção do início até a parte antes da conclusão. Primeiro, com um tom misterioso de suspeita sobre as intenções do motorista. Depois, pelas revelações íntimas que os dois estranhos compartilham, a partir de um genuíno, e raro, interesse pelos problemas do outro. A atuação do sempre ótimo Sean Penn entra em perfeita sintonia com a de Dakota Johnson, que prova que é uma excelente atriz. Ambos dão conta desses papéis sufocantes (a câmera sai do carro apenas no início, no fim, e na parada por causa da obra). Porém, o roteiro desaponta no clímax dramático da última revelação da passageira, que não é tão impactante quanto deveria ser, e ainda na exagerada gorjeta, que mina a importância do contato físico que encerra a história.
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Ficha técnica:
Papai | Daddio | 2023 | 100 min. | EUA | Direção: Christy Hall | Roteiro: Christy Hall | Elenco: Dakota Johnson, Sean Penn, Marcos A. Gonzalez.