Depois do extravagante Elvis (2022), de Baz Luhrman, chega a vez do realista Priscilla, de Sofia Coppola. Baseado no livro biográfico “Elvis e eu”, de Priscilla Presley e Sandra Harmon, o filme de Sofia Coppola conta a vida da retratada durante o seu relacionamento com o músico.
Como ofuscar Elvis
A diretora mostra um cuidado exagerado em manter o foco em Priscilla. Por isso, para não deixar que a presença magnética do astro ofusque a protagonista, Sofia Coppola tenta antes apagar Elvis. Assim, exceto pela cena em que toca piano e canta em uma festa privada, quando Priscilla o encontra pessoalmente pela primeira vez, Elvis nunca aparece no palco ou em performances musicais. E a trilha musical evita as suas músicas. Além disso, coloca como seu intérprete o fraquíssimo ator Jacob Elordi, de A Barraca do Beijo (The Kissing Booth, 2018) e 2 Corações (2 Hearts, 2020). Este, além de mau ator, não se parece nada com Elvis. Enfim, tudo isso para não deixar que o carisma natural de Elvis tire a atenção da protagonista no filme.
No (bom) cinema, nada é por acaso. Então, a diferença de altura entre Elvis e Priscilla (na vida real, entre 1,82m e 1,63m, ou seja, de 19cm), é aqui ampliada para 41cm. Jacob Elordi tem 1,96m e a atriz Cailee Spaeny (da série Mare of Easttown [2021]) apenas 1,55m de altura. O que, além de causar certa estranheza, enfatiza o contraste entre os dois. Quando Priscilla conheceu Elvis, ela tinha apenas 14 anos e ele já era um astro consagrado. O filme revela que o relacionamento era como o sonho realizado de uma fã com seu ídolo. Essa é a base para o enredo, que procura mostrar o amadurecimento de Priscilla, em paralelo à síndrome de Peter Pan de Elvis.
O homem, não o artista
Esse é outro motivo para o filme não mostrar Elvis como um artista, e sim como homem. Acostumado com a fama e com o luxo, ele tem dificuldades para abraçar o que está intrínseco a um relacionamento de casal. Elvis não abre mão de se divertir com a turma de amigos, que estão sempre ao seu redor, mesmo dentro de sua Graceland. E argumenta que Priscilla deve aceitar a infidelidade dele, pois faz parte desse contrato (ser a mulher de uma celebridade). Pior ainda, ela tem que encarar as explosões de raiva do seu amado, provocadas em parte pelo consumo de drogas.
Apesar dessa vida infernal, Sofia Coppola prefere não empregar recursos que acentuem o melodrama. O que deixa o filme morno, desperdiçando a exploração de situações doloridas experimentadas por Priscilla. Ao invés disso, a diretora aposta no empoderamento feminino, que cresce gradualmente dentro da protagonista.
Esse processo fica evidente em três situações. Primeiro, na breve cena com Priscilla olhando meditativamente através da janela de sua casa, após Elvis afirmar que a infidelidade faz parte desse jogo. A câmera começa próxima da atriz e se afasta vagarosamente, neste que é o momento mais belo do filme. Segundo, no fade-out que fecha o trecho no qual Elvis arremessa uma cadeira em direção a Priscilla. E, por fim, no trecho em que a protagonista caminha pelo corredor, altiva, após comunicar a Elvis que está saindo do casamento.
O filme Priscilla ganha força nesses três momentos. É quando fica evidente a intenção de Sofia Coppola, de mostrar que a mulher não deve ficar submissa nem numa relação tão desigual quanto essa. Mas, para o espectador, cabe enfrentar vários momentos monótonos até que esse furor ganhe intensidade.
Ficha técnica:
Priscilla | 2023 | 113 min | Itália, EUA | Direção e roteiro: Sofia Coppola | Elenco: Cailee Spaeny, Jacob Elordi, Ari Cohen, Dagmara Dominczyk, Tim Post, Lynne Griffin, Dan Beirne, Rodrigo Fernandez-Stoll.
Distribuição: O2 Play, MUBI.
Assista ao trailer aqui.