A ficção-científica sempreserviu de válvula de escape para os maiores temores de cada época. Assim, nas décadas de 1950 e 1960, expurgou a paranoia anticomunista e os perigos das bombas nucleares, entre outros traumas do passado. Dito isso, Resistência (The Creator) parece filme dos anos 1970, da chamada Nova Hollywood, pois em meio a sua trama de aventura entrega que os Estados Unidos ainda não superaram suas intervenções militares na região da Ásia. Mas aqui não apenas as mais recentes (Coreia e Vietnã), mas desde Filipinas (início do século 20) e Japão (Segunda Grande Guerra).
Que lado o filme defende?
Contudo, na parte inicial do filme, parece que a trama defenderá a posição belicista dos Estados Unidos em relação a esses conflitos. Uma rápida montagem com noticiários (fictícios) estabelece a situação atual. Segundo as notícias, a Inteligência Artificial detonou uma bomba atômica em Los Angeles. Por isso, o mundo ocidental decidiu banir qualquer forma de I.A.. Mas, a Ásia não segue esse protocolo e continua a usá-la, o que serve de pretexto para que os ocidentais decidam invadir a região e bombardear instalações com uma imensa nave. O alvo principal, porém, é Nirmata, a pessoa que desenvolve essa inteligência (a criadora do título original). Além disso, eles estão atrás de uma nova arma que Nirmata criou.
O protagonista Joshua (John David Washington) é um espião infiltrado que vive com a esposa Maya (Gemma Chan), que está grávida, numa praia asiática. Talvez por engano, sua casa é atacada pelos soldados ocidentais, e Joshua vê Maya morrer. Tempos depois, a coronel Howell (Allison Janney) revela a Joshua um vídeo que mostra que Maya está viva. Ele, então, embarca numa missão de ataque na Ásia para tentar localizá-la. A abordagem agressiva contra os moradores locais lembra registros do que os EUA fizeram na região, e como os civis realmente escondem as instalações de I.A., temos a impressão de que o filme está a favor desse exército que inclui o herói da história. Surge, então, a preocupação: será que Resistência vai defender essa posição política?
Uma arma pacifista
Felizmente, há reviravoltas nessa trama. Por trás do incidente que detonou Los Angeles, existe uma verdade escondida pelo governo. A teoria da conspiração, aqui, vale mais do que os relatos oficiais. Na verdade, as surpresas do enredo são um tanto previsíveis. É fácil descobrir a verdadeira identidade da Nirmata e, até respeitando a Ciência, a Inteligência Artificial não possui vontade própria, nem para cometer erros. Se eles existem, o erro só pode ser humano. Mas, como este não é um filme de mistério, essa facilidade em descobrir esses segredos não prejudica a experiência do espectador.
O apelo sentimental importa mais do que desvendar as pistas. Nesse sentido, a escolha de uma criança menina para incorporar a nova arma, chamada de Alphie (Madeleine Yuna Voyles), é mais do que acertada. Afinal, ela incorpora perfeitamente o espírito pacifista do filme, bem como a intenção de sua criadora, Nirmata. Além de seu povo e os robôs se compararem aos monges budistas, Alphie aciona seu poder ao, emblematicamente, postar as mãos (sem encostá-las), como se rezasse. Ademais, ela não tem poder de atacar, mas de manipular a energia para, com isso, desarmar bombas. Joshua, por sua vez, é um dos poucos ocidentais íntegros. O vilão desta ficção-científica não é a Inteligência Artificial, como em outros filmes do gênero – 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), Geração Proteus (197), etc. – mas a própria espécie humana.
Obra de um especialista
O diretor Gareth Edwards confirma sua habilidade em realizar filmes desse gênero. Fez o melhor filme Star Wars após a trilogia original, Rogue One (2016), que vem à lembrança em várias cenas de Resistência, como a enorme espaçonave no espaço, o tanque que derruba as árvores da floresta, o visual das instalações e até as cenas de combate. Os efeitos especiais, aliás, são deslumbrantes, e confirmam a especialidade deste cineasta que começou na indústria nesse departamento. Junte isso com a inteligente trama pacifista e o resultado é uma sci-fi de primeira linha.
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Ficha técnica:
Resistência | The Creator | 2023 | 133 min | EUA | Direção: Gareth Edwards | Roteiro: Gareth Edwards, Chris Weitz | Elenco: John David Washington, Madeleine Yuna Voyles, Gemma Chan, Allison Janney, Ken Watanabe, Sturgill Simpson, Amar Chadha-Patel.
Distribuição: 20th Century Studios Brasil.
