Isabelle Huppert vive um romance de superação em Sidonie no Japão.
No terceiro longa da diretora Élise Girard, Huppert interpreta Sidonie Perceval, uma escritora ainda em processo de luto pelo marido Antoine (August Diehl), falecido há anos. Com relutância, ela aceita viajar pela primeira vez na vida ao Japão, para divulgar seu último livro. Quem a acompanha nessa turnê é o seu editor local, Kenzo Mizoguchi (Tsuyoshi Ihara).
No início, o filme se resume ao choque cultural da francesa diante dos costumes japoneses. Mas o solícito (até demais) Kenzo a auxilia a entender as regras e os cerimoniais do seu país. Inclusive quando Sidonie começa a ver o fantasma de seu marido. O editor encara a aparição como normal, afinal, diz ele, o Japão é a terra dos fantasmas. Ele, que possui uma história de perdas familiares similar à de Sidonie, explica-lhe que ela só vê o marido porque ela quer, pois o fenômeno depende dela.
Sem desafiar a crença nos fantasmas, o enredo desenvolve o processo de superação do luto da protagonista. Logo, as aparições do fantasma do marido se tornam mais frequentes e intensas, chegando ao ponto de Sidonie conversar com ele. Em certo momento, a presença está tão forte que o fantasma é capaz de segurar um livro e entregar para uma criança, e até comer um bolinho da lua. Numa cena emblemática, Sidonie e seu marido estão sentados na cama do hotel. A aparência dela parece mais fantasmagórica do que a dele, ilustrando o quanto ela está esmaecendo por conta desse extenso luto.
A intervenção do fantástico
Daí a importância do fantasma. Preocupado com sua esposa, Antonie ainda não pode cruzar para o outro lado até que consiga curá-la. Por isso, quando entram num táxi, ele interfere na vida dela, dando um jeito de induzi-la a se sentar mais perto de Kenzo. Este, por sua vez, enfrenta a separação da atual esposa. Nasce uma atração entre Sidonie e Kenzo, revelada não só nos profundos diálogos, mas também no visual. Enquanto os enquadramentos se tornam perfeitamente simétricos na visita dos dois a um museu, denotando a sintonia entre eles, o fantasma de Antoine parece mais translúcido, sinal de que sua estadia nesse mundo está no fim. Vale dizer que o efeito de sobreposição de imagens, simples mas bem utilizado, é suficiente para materializar as aparições fantasmagóricas.
A certeza do romance vem, primeiro, no belo sonho de Sidonie, no qual ela beija o marido, que se transforma em Kenzo, tudo diante de um fundo florido. Depois, no final de uma montagem romântica com vários planos curtos do casal em diversas situações juntos; Sidonie acena, e o contraplano revela que, desta vez, o receptor não é o fantasma de Antonie, mas um bebezinho. Selando o início desse relacionamento amoroso, vem a cena de sexo, construída com quadros estáticos do casal na cama e uma narração sussurrada ao fundo, lembrando o começo de Hiroshima, Mon Amour (1959), de Alain Resnais, outro drama romântico entre uma mulher francesa e um homem japonês.
Para encerrar, faz-se necessário destacar a trilha musical. Trazendo composições de Bach, Strauss e Ryuichi Sakamoto tocadas ao piano, Sidonie no Japão se aproxima dos dramas com fantasmas do cinema japonês. Fantasmas que não assustam, e ajudam as pessoas vivas – como em Para o Outro Lado (2015), de Kiyoshi Kurosawa, mas com vantagem para Élise Girard.
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Ficha técnica:
Sidonie no Japão | Sidonie au Japon | 2023 | 95 min. | França | Direção: Elise Girard | Roteiro: Maud Ameline, Élise Girard | Elenco: Isabelle Huppert, Tsuyoshi Ihara, August Diehl.
Distribuição: Imovision.