Sing Sing se sobressai como o filme edificante desta temporada do Oscar. Indicado nas categorias de ator (Colman Domingo), roteiro adaptado e canção original, o longa traz às telas uma parte dos resultados do programa Rehabilitation Through the Arts (RTA – Reabilitação Pelas Artes). No caso, os internos da prisão de Sing Sing que participaram das atividades teatrais.
A força do filme está intrinsicamente relacionada ao seu enredo. Isso porque quase todo o seu elenco é formado por membros atuais e antigos do programa. Entre eles, o coprotagonista Clarence Maclin, que interpreta a ele mesmo. Além de acrescentar autenticidade à produção, essa escalação prova que o RTA, assim como outros programas semelhantes, pode, de fato, ser a ponte para a reabilitação dos detentos. Alguns participantes talvez sigam a carreira artística após voltarem à liberdade, mas só o fato de se envolverem nessas atividades já ajuda a aliviar a dura rotina na prisão, como um dos personagens afirma no longa. O roteiro aponta que, nessa condição de vulnerabilidade, o alívio e a esperança de conseguirem a liberdade são fundamentais para a saúde mental de quem está lá dentro.
Ao lado da mensagem inspiradora, outro atrativo de Sing Sing alcança os amantes de teatro e de atuações. A preparação desses atores em estado bruto é retratada através de vários exercícios comuns nesse processo, através do instrutor Brent Buell, interpretado por Paul Raci. Dessa forma, os interessados no assunto podem conhecer como funcionam essas etapas, e os já introduzidos no meio podem encontrar lembranças nostálgicas. No filme, sempre há uma intenção emotiva nessas cenas, com exceção das inevitáveis montagens de audição e de montagem da peça, que tendem a um tom mais humorístico. Mas o que importa é que os atores, profissionais ou não, dão um show de interpretação do início ao fim.
A direção voltada ao espaço
Este é apenas o segundo longa-metragem do diretor Greg Kwedar. Chama a atenção aqui o seu uso do espaço, num filme em que o ambiente possui importância equivalente aos personagens. A seguir, alguns exemplos.
Os internos, pelo menos os personagens principais, ficam confinados em pequenas celas individuais. Portanto, representa um desafio filmar um diálogo entre dois personagens presos. Kwedar soluciona essa questão com habilidade. Sem abrir com um plano geral, filma através da janela da porta de uma cela, onde está John Divine (Colman Domingo); em seguida, faz a mesma coisa com a cela de seu amigo Mike Mike (Sean San Jose). E só depois de um tempo abre para o plano geral que revela que eles não estão na mesma cela. Dessa maneira criativa, Kwedar cria uma variação do plano/contraplano aproveitando o cenário à sua disposição.
O salão do teatro se distingue dos outros espaços de Sing Sing por sua amplitude. Lá acontecem as reuniões, os ensaios e as apresentações de teatro do RTA. Embora isso não seja tão explorado, tal característica se adequa à narrativa, considerando que ali é o lugar de alívio para os internos que participam do programa. Pois bem, o salão permite acesso a uma sacada que, apesar de fechada com uma grade aramada, possui um quadrado por onde John Divine consegue passar a sua mão e sentir, através dela, uma pequena sensação de liberdade. O personagem, por isso, afirma que esse é o lugar preferido dele, resultando num bem-vindo toque sentimental.
Modulando as emoções
Um outro destaque da direção, já sem relação com o espaço, está na modulação das emoções. John Divine, sempre um motivador da turma, sofre duas perdas que o baqueiam. Numa delas, sua expressão de tristeza fica escondida pela sombra proveniente do posicionamento da câmera que o filma contra a luz. Com isso, Greg Kwedar reduz o impacto dramático. E faz isso porque opta por reservar essa força para a parte final, quando, Divine desaba e chora torrencialmente em cima do palco no ensaio final. Para o público, o efeito é catártico, pois a direção manteve reprimida sua emoção até esse momento.
No fim, liberando de vez a comoção, agora acrescida do reconhecimento ao programa de reabilitação, entram os esperados registros das apresentações do RTA, incluindo atores escalados para o filme, que agora recebem as palmas, na imaginação ou na prática, da plateia do cinema.
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Ficha técnica:
Sing Sing | 2023 | 107 min. | EUA | Direção: Greg Kwedar | Roteiro: Clint Bentley, Greg Kwedar, Clarence Maclin, John Divine G Whitfield | Elenco: Colman Domingo, Clarence Maclin, Sean San Jose, Paul Raci, David Giraudy, Patrick Griffin, Mosi Eagle, James Williams, Sean Dino Johnson.
Distribuição: Diamond Films.