That’s Amor ocupa dentro da Netflix o espaço dos filmes para a TV aberta norte-americana. São produções com padrão de qualidade pré-determinado dentro de um orçamento industrial, ou seja, limitado porque não tem a ambição de ser uma obra-prima. Sua função é oferecer uma opção agradável que evite o telespectador de mudar de canal. Se funciona no streaming? Essa é uma resposta que as operadoras ainda estão para descobrir.
Geralmente, esses filmes visam o mercado interno (Estados Unidos e Canadá) e não o público internacional. Por isso, nem sempre agradam quando exportados. É o caso de That’s Amor, uma comédia romântica com perspectiva feminina sobre uma moça de 30 anos que retorna para a casa de sua mãe em Sonoma, pequena cidade ao norte de San Francisco (onde ela tentou ganhar a vida sozinha). Após perder o emprego e descobrir uma infidelidade do namorado no mesmo dia, e ainda quebrar a perna, Sofia (Riley Dandy) desiste da sua empreitada. Mas Lainie (Nancy Lenehan), a sua mãe dominadora, não a deixa curtindo uma fossa. Logo, arruma um curso de culinária espanhola para fazerem juntas, e lá ela inicia um novo relacionamento com Matias (Isaac Gonzalez Rossi), o sobrinho espanhol do professor que está passando um tempo nos EUA.
Tom leve e para cima
O filme acerta no seu tom para cima, apesar da fase ruim da protagonista. A leveza vem da iluminação sempre clara e da constante música de elevador tocando bem baixinho ao fundo. A narrativa se desenrola rapidamente, mas nem se aprofunda no processo de transição a partir do chororô da desilusão amorosa e profissional. De fato, em um momento ela diz que não quer outro homem em sua vida, e logo depois já coloca um belo vestido para ir na segunda aula de culinária sozinha (a mãe, estrategicamente, inventa que está passando mal).
Mas, se tem um lance que merece destaque, é o paralelo entre a cura do pé quebrado de Sofia com sua superação emocional. De qualquer forma, os dois precisam amadurecer e entrar num relacionamento sério, o que nunca tiveram até então em suas vidas.
Visão autocentrada dos americanos
Contudo, esses protagonistas soam bem artificiais. Talvez não para o público americano, pois o filme reflete o que eles pensam. Mas, para nós incomoda a ignorância (que beira o xenofobismo) de Sofia em relação à Espanha. Por exemplo, ela nunca ouviu falar de Barcelona, onde Matias mora. Há uma insistência demasiada em apontar que ele é estrangeiro, como se fosse subdesenvolvido. “Os espanhóis são todos mulherengos”, afirma a protagonista. Se fosse só a caracterização de uma personagem, não haveria problema, pois ela ao final do filme melhora nesse quesito, e até fala algumas frases em espanhol e ainda se matricula numa universidade em Madri. Mas acontece que sentimos que essa percepção reflete mesmo o pensamento dos realizadores, pois mostra, por exemplo, que o espanhol não sabe nem o que é uma designer gráfica.
O diretor e ator Shaun Paul Piccinino, depois de realizar seis filmes com alcance médio, conseguiu um contrato com a Netflix para filmar vários longas. Já realizou o natalino Um Brinde ao Natal (A California Christmas, 2020) e sua sequência, duas produções marcadamente voltadas para o mercado norte-americano. That’s Amor é mais um passo nesse novo modelo de studio system, agora idealizado para o streaming. Os frutos desse formato são filmes como esse, agradáveis mas ralos.
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Ficha técnica:
That’s Amor | That’s Amor | 2022 | 96 min | EUA | Direção: Shaun Paul Piccinino | Roteiro: John Ducey, Ali Afshar, Tiffany Dupont | Elenco: Riley Dandy, Isaac Gonzalez Rossi, Nancy Lenehan, Daniel Edward Mora, Bryan Craig, Kimberley Drummond, Arlene Tur, Christina Moore.
Distribuição: Netflix.