O melodrama turco Um Grito de Liberdade trabalha o tema do relacionamento entre mãe e filha.
O enredo
O filme começa com Nazli se despedindo de seu marido em uma estação de trem em Istambul para embarcar numa viagem até a pequena vila onde mora sua mãe Ayse. Através da narração de Nazli, entramos no flashback que nos apresenta a atitude protetora da mãe em relação a sua filha única, desde a infância. O excesso de mimo persiste na adolescência, irritando a menina, que desenvolve uma forte implicância com a mãe, até mesmo em relação a sua forma de se vestir.
No início de sua vida adulta, Nazli se muda sozinha para Istambul para estudar na faculdade. A vida urbana da cidade grande gera ainda mais comparações com os modos simples da mãe pobre, e a moça se sente embaraçada toda vez que a mãe a visita. Esse sentimento fica ainda mais forte quando Nazli começa a namorar com um rapaz rico, principalmente quando eles ficam noivos e convidam os seus respectivos pais para um jantar num restaurante chique. Um grave problema de saúde muda essa situação, e conduz para a viagem de reconciliação iniciada nos primeiros minutos do filme.
Amor sufocante
A sinopse de Um Grito de Liberdade pode indicar que a estória apresenta uma filha má e uma mãe que parece um anjo. Mas não é isso que vemos no filme. Ayse exagera nos cuidados com a filha e, apesar de suas boas intenções, entendemos os motivos para Nazli ficar irritada com ela. Em certos momentos, Ayse se torna até antipática, quando fica se gabando numa loja que a filha passou na faculdade, ou quando mente na presença das amigas em relação a Nazli. No jantar com os pais do futuro genro, ela também se porta mal – mas depois se arrepende e conserta a situação.
A trama lembra o filme norte-americano Laços de Ternura (Terms of Endearment, 1983), de James L. Brooks, em especial pela reconciliação motivada por um problema de saúde. Mas Um Grito de Liberdade extrapola os limites do melodrama, forçando as lágrimas do espectador. A sequência em que uma das protagonistas sofre com a notícia da doença é longa demais e acaba irritando ao invés de sensibilizar. A cena final da despedida na estação de trem também não funciona, porque a atitude da mãe é teatral demais, ainda mais considerando que foi dela a ideia e a insistência pela partida da filha.
Minha mãe
O título nacional parece uma escolha inadequada, pois foca na mudança da filha para Istambul a fim de estudar, onde ela se sente menos sufocada pela mãe. O nome original do filme, “Annem”, significa “minha mãe” em turco, e expõe com mais propriedade o tema abordado. Afinal, estamos diante de um filme sobre o relacionamento entre mãe e filha, que pode até entrar na sua lista de dicas para o próximo dia das mães, se a intenção for comemorar a data com muitas lágrimas.
De fato, Um Grito de Liberdade apela para o sentimentalismo forçado em alguns momentos. Porém, possui uma direção competente de Mustafa Koten, que opta por recursos eficientes. Por exemplo, o giro de 360 graus ao redor de Nazli e Ayse para ilustrar o estado emocional perturbado das duas na conclusão. É alta a probabilidade de o espectador gostar dos dois primeiros terços do filme e se desapontar com a parte final.
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Ficha técnica:
Um Grito de Liberdade (Annem, 2019) Turquia. 110 min. Dir: Mustafa Kotan. Rot: Evren Erdogan, Bener Karaçor, Ayse Balibey Tanil. Elenco: Özge Gürel, Sumru Yavrucuk, Sercan Bardur, Tuna Orhan, Itir Esen, Fatma Toptas, Fulya Özcan, Zuhal Acar, Tugce Karabayir, Pera Semiz.