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Um Só Pecado (filme)
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Um Só Pecado

Avaliação:
8/10

8/10

Crítica | Ficha técnica

“Um Só Pecado” é um belo melodrama, equiparável aos melhores do gênero dirigidos por Douglas Sirk e Vincent Minnelli. Tendo como pano de fundo uma crítica à aparente estabilidade da vida familiar burguesa, o filme explora três sensibilidades: o drama, o romance e o suspense.

Fetiche

A abertura exibe de forma simbólica o tema central de “Um Só Pecado”. Uma mão feminina acaricia as duas mãos de um homem, enquanto brinca com a aliança no dedo anelar esquerdo masculino. Essa será a situação pela qual passará Pierre Lachenay (Jean Desailly), um famoso escritor e palestrante casado e com uma filha. Em uma viagem de Paris para Lisboa, onde dará uma palestra, ele conhece uma aeromoça que chama sua atenção durante o voo. Não só por sua linda figura, mas, também, porque a observa trocando seus sapatos, pelo vão inferior da cortina que divide a cabine da tripulação. Esse detalhe não passa desapercebido aos seguidores da filmografia de François Truffaut.

Afinal, as pernas femininas são um fetiche do diretor francês, e nesse e em outros momentos de “Um Só Pecado”, ele explicita essa obsessão de forma sensual. A aeromoça é Nicole, vivida por Françoise Dorléac, a irmã de Catherine Deneuve que faleceu muito jovem, aos 25 anos, em 1967. Por coincidência, Nicole se hospeda no hotel lisboeta onde Lachenay está. Então, este lhe corteja e seduz na noite seguinte, em uma sequência delicada que se encerra com uma elipse após entrarem no quarto dela. A paixão entre os dois é intensa, e a relação continua após o retorno a Paris.

Lachenay e Franca

Lachenay e sua esposa Franca (Nelly Benedetti) ainda se sentem atraídos sexualmente. Porém, o relacionamento entre os dois enfrenta dificuldades, agravado ainda mais com o caso extraconjugal iniciado em Lisboa. Lachenay e Nicole se encontram furtivamente em Paris, mas desejam mais liberdade. Uma oportunidade de ele se apresentar como palestrante convidado dá a oportunidade de passarem dois dias juntos na pequena cidade de Reims. Porém, os compromissos profissionais que surgem lá para Lachenay o impedem de ficar com Nicole, que se irrita. Na viagem de retorno, o casal pode enfim passar um tempo juntos se amando, mas quando Lachenay telefona para sua esposa tudo mudará.

Amadurecimento de Truffaut

Neste melodrama, Truffaut já começa a distanciar das características ousadas da nouvelle vague que ajudou a construir. Com exceção do uso intenso de filmagens em locações, “Um Só Pecado” possui um formato mais próximo do cinema clássico. O que o diretor demonstra, realmente, é um amadurecimento como diretor, conduzindo magistralmente o espectador para dentro das sensações que deseja provocar, que, por serem variadas, tornam o filme muito fluído. Truffaut não permite que o ritmo se torne constante e previsível. Por exemplo, logo no início, quando Lachenay precisa ir ao aeroporto para pegar o voo para Lisboa, ele insere o elemento suspense porque o personagem está atrasado e pode perder o horário de partida do avião.

Então, o trajeto para o aeroporto é filmado com vários cortes, impregnando um ritmo ágil à cena, sem que isso seja apenas um recurso artificial para prender a atenção do público. Aliás, logo a seguir, é o atraso do personagem que permite que ele tenha um primeiro contato com a aeromoça, que lhe dá um atendimento especial para evitar que ele perca o voo. O suspense retorna no final do filme, quando evidencia a reação enlouquecida da esposa ao ter certeza de que seu marido a estava traindo. Um desfecho que contraria os padrões hollywoodianos impostos pelos grandes estúdios.

Sensualidade

Truffaut enche o filme de sensualidade, sem nunca ser vulgar. Dessa forma, consegue, em plenos anos 1960, mostrar que um beijo, mesmo aquele cinematográfico, pode ser muito sedutor na tela. Já nos momentos dramáticos, ele prefere usar planos com poucos cortes, permitindo aos atores expressarem esse sentimento, e ao mesmo tempo evita que um corte artificial possa quebrar o clima da cena. Assim, Truffaut faz funcionar o suspense, o drama e o romance de “Um Só Pecado”.

Em 1974, no filme “A Noite Americana” (La Nuit Américaine), Truffaut revisitará a cena onde Nicole e Lachenay estão hospedados em um chalé na volta da viagem a Reims. Ela sai da cama e leva uma bandeja para fora do quarto, repousando-a no chão, quando um gato se aproxima e começa a beber o leite de uma das xícaras. “A Noite Americana”, sobre os bastidores de uma filmagem, usa esta cena para ilustrar como várias tomadas foram necessárias porque o gatinho nunca fazia o que o diretor desejava. Ademais, outra referência a “Um Só Pecado” no filme de 1974 é o fato de o protagonista usar um aparelho de surdez. Essas homenagens demonstram a satisfação que Truffaut sentia pela realização de “Um Só Pecado”. De fato, merecidamente, porque se trata de um dos melhores de sua carreira.


Ficha técnica:

Um Só Pecado (La Peau Douce, 1964) 113 min. Dir: François Truffaut. Rot: François Truffaut, Jean-Louis Richard. Com Jean Desailly, Françoise Dorléac, Nelly Benedetti, Daniel Ceccaldi, Laurence Badie, Phillipe Dumat, Paule Emanuele, Maurice Garrel, Sabine Haudepin, Dominique Lacarrière, Jean Lanier, Pierre Risch, Catherine-Isabelle Duport.

Onde assistir:
Um Só Pecado (filme)
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