O longa Uncle Frank consegue alinhar as características do filme às do seu personagem principal. Ou seja, agradável na superfície com um atormentador drama por baixo.
E o espectador descobre isso juntamente com a personagem Beth, uma garota de Creekville, South Carolina. Desde criança, ela sempre admirou seu sofisticado e descolado tio Frank. Diferente do resto da família, ele saiu de casa, se formou e se tornou professor na Universidade de Nova York. Ao completar 18 anos, Beth ingressa na mesma instituição e se muda para a Big Apple. E, assim, conhece melhor o seu tio.
Dessa forma, descobre que seu tio é gay e que mantém um relacionamento de dez anos com o árabe Wally. Então, compreende por que ele saiu da casa da conservadora família em Creekville e, principalmente, o motivo de ele ser tão maltratado pelo pai. Mas, quando o pai de Frank morre e os dois viajam de volta para casa para o funeral, tanto Beth como o espectador descobrem um sentimento de culpa que atormenta o tio Frank desde a adolescência.
Legal o tempo todo
Segundo Wally, o tio Frank é legal o tempo todo. Em outras palavras, ele quer dizer que ele se esconde por trás de uma máscara de pessoa agradável, às vezes apático, e sempre contido. Na verdade, Frank é o oposto do seu entusiasmado e extrovertido namorado. No mesmo sentido, o filme Uncle Frank também apresenta esse tom.
De fato, o humor no filme é sutil. Por exemplo, quando Frank diz que Wally se parece com um personagem de filme bíblico ao sair com uma toalha enrolada na cabeça, e a cena seguinte traz Beth assistindo a um filme desse gênero na televisão. Bem como na montagem com as mulheres trazendo seus pratos de comida para o funeral. Juntamente com a narração pela voz e perspectiva de Beth, o resultado é superficialmente agradável. Tal como Frank.
Spoiler adiante
Porém, tanto Frank como o filme possuem uma outra camada, mais profunda e dramática. Enquanto Frank sempre foi cauteloso em não contar à família que é gay, o pai coloca isso, de forma grosseira, em seu testamento, lido pelo advogado na frente da mãe, da tia, da irmã e do irmão. É o golpe final do seu pai preconceituoso, finalizando as feridas que abriu para sempre no passado do filho.
Em 1944, o adolescente Frank descobriu-se gay com seu primeiro amor. Porém, ao ser flagrado pelo pai, este lhe ordena, enfurecido, que deixa essa perversão doentia de lado, pois é um pecado. Então, assustado, ele repete isso ao namorado, alegando esses motivos para não se verem mais. Como resultado, uma tragédia acontece, e Frank carrega a culpa pelo suicídio do garoto até hoje.
Escrito e dirigido por Alan Ball
Uncle Frank é escrito e dirigido por Alan Ball, vencedor do Oscar de roteiro original por Beleza Americana (1999). E nesse seu segundo longa-metragem, ele cria a estória a partir da presunção de que ele desconfiava que seu pai era gay, e do real afogamento do talvez namorado dele. Mas, no filme, há uma figura paterna que é claramente construída como o vilão. Afinal, o preconceituoso pai de Frank provoca o trauma do filho, e continua a atormentá-lo durante toda a sua vida e até ao morrer. Nesse sentido, o filme até simplifica a trama ao mostrar que, sem o pai, todos os demais membros da família não se opõem ao fato de Frank ser gay.
Mesmo com essa simplificação, Uncle Frank se destaca por conseguir aproximar tão bem o filme de seu personagem. E, como resultado, criar um tom leve e, também, profundo. E, acima de tudo, emocionante.
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Ficha técnica:
Uncle Frank (2020) EUA. 95 min. Direção e roteiro: Alan Ball. Elenco: Paul Bettany, Sophia Lillis, Peter Macdissi, Steve Zahn, Judy Greer, Margo Martindale, Stephen Root, Lois Smith, Jane McNeill, Caity Brewer, Britt Rentschler.
Distribuição: Prime Video