A trama intrincada de A Garota que Sabia Demais leva Hitchcock para Roma.
A influência de Alfred Hitchcock na carreira do cineasta italiano Mario Bava desponta com evidência em A Garota que Sabia Demais. Inclusive, no próprio título, pois remete a O Homem que Sabia Demais (1956), filme do diretor inglês que contava com James Stewart e Doris Day no elenco.
O tema que ele utiliza aqui também é recorrente na filmografia hitchcockiana. Ou seja, a situação da pessoa comum que se envolve fortuitamente em um crime.
No entanto, a dose de humor negro britânico dá lugar a outro mais pastelão, na figura do médico Marcello Bassi, que se envolve romanticamente com a protagonista Nora Davis. Por exemplo, uma piada recorrente é ele se esquecer que quebrou o dedo e gritar de dor quando o usa.
Aliás, a quantidade de coincidências ruins que acontecem num curto período com Nora Davis beira uma paródia. Ela é uma americana que viaja para Roma para passar férias e se hospedar na casa de uma parente. Para começar, no avião, um homem lhe dá um maço de cigarros. Quando pousam, a polícia aborda esse homem, e Nora descobre que ele é um traficante. Assim, ela se sai do aeroporto em posse de cigarros de maconha.
Em seguida, logo na primeira noite, sua parente morre no apartamento. Então, ela tenta ir para o hospital chamar o médico que cuidava dela. Mas, no caminho, um ladrão rouba sua bolsa. Enquanto está caída, presencia o assassinato de uma mulher. Porém, ninguém acredita na sua estória. Então, ao investigar, desconfia que ela pode ser a próxima vítima de um assassino em série.
Dirigido por Mario Bava
Quanto ao estilo de direção, Mario Bava nem sempre tenta emular Hitchcock. Em algumas cenas, como a do assassinato que a protagonista testemunha, Bava até planeja comunicar as ações visualmente. Mas, nem sempre é essa a intenção. Pelo contrário, chega a recorrer a uma narração que descreve o que a personagem está pensando. Ou seja, um recurso que Hitchcock nunca utilizaria.
Porém, a diferença de estilo não deve ser empecilho para desfrutar de A Garota que Sabia Demais. O filme é muito movimentado, e rola no ritmo de uma montanha-russa, desvendando uma trama cada vez mais intrincada. E, como há muito humor, o espectador releva uma resolução um pouco frustrante. Afinal, a própria conclusão traz uma piada com as drogas do início do filme que deixa clara uma intenção de não ser levado a sério.
Elenco
No elenco, está o ator americano John Saxon, que morreu no ano passado. Era comum incluir algum nome estrangeiro nas produções italianas, para atrair mais público, tanto no mercado local como no internacional. Por exemplo, Clint Eastwood esteve em vários spaghetti westerns por essa razão. John Saxon faz o médico, personagem com finalidade heroica, cômica e romântica.
E, no papel de Nora Davis está a atriz italiana Letícia Román. Sua carreira no cinema foi curta. Começou numa participação num dos filmes do Elvis Presley, Saudades de um Pracinha (1960), e se encerrou em 1966. Depois, foi para a televisão, logo encerrando sua carreira após dois anos.
Já Mario Bava foi um prolífico diretor e diretor de fotografia. Trabalhou em diversos gêneros, de filmes de viking a faroeste, mas ganhou reconhecimento no terror e no giallo, que são as estórias de suspense e mistério, como esse A Garota que Sabia Demais. Por isso, aqui vemos logo no início a protagonista lendo um livro desse gênero, que ela afirma adorar. Entre os filmes mais famosos de Bava, estão Os Vampiros (1957), que codirigiu ao lado de Riccardo Freda, e As Três Máscaras do Terror (1963).
Também conhecido pelo título Olhos Diabólicos, o filme A Garota que Sabia Demais agrada como um movimentado suspense inspirado em Hitchcock, mas que não se limita nessa intenção.
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Ficha técnica:
A Garota que Sabia Demais (La ragazza che sapeva tropo) 1963. Itália. 86 min. Direção: Mario Bava. Roteiro: Ennio De Concini, Sergio Corbucci, Eliana De Sabata. Elenco: John Saxon, Letícia Román, Valentina Cortese, Titti Tomaino, Luigi Bonos, Milo Quesada.