No ano passado, a Netflix lançou o filme Nyad, que retrata uma travessia pelo mar de Cuba até Flórida realizada pela nadadora do título aos 60 anos. A Jovem e o Mar, que chega agora ao streaming da Disney+, conta uma proeza semelhante, que abriu caminho para as esportistas que romperam as barreiras do preconceito machista. O enredo se inspira na pioneira Trudy Ederle, a primeira mulher a atravessar o Canal da Mancha a nado em 1926.
O filme segue o padrão das cinebiografias. Após um flash forward dispensável, somos apresentados a Trudy ainda criança, em 1914, uma filha de imigrantes alemães vivendo em Nova York. Acontecem dois momentos marcantes para a sua vida. Enquanto uma balsa pega fogo e centenas de mulheres morrem porque não sabiam nadar, a protagonista sobrevive ao sarampo após o seu médico declarar que ela não aguentaria nem mais uma noite. O enredo não afirma diretamente, mas essa convergência de eventos desperta na menina uma determinação inabalável para aprender a nadar.
Porém, esse desejo que parece simples hoje era impensável na época. Mulheres não praticavam esportes, deviam somente se dedicar ao lar. Apesar da oposição do pai conservador de Trudy, a mãe briga para que suas duas filhas comecem a aprender a nadar. Na adolescência, elas entram para um dos poucos cursos de natação para mulheres. À custa de muito esforço e obstinação, Trudy começa a se destacar nas competições. O roteiro desenvolve esse processo com rapidez. Com isso, logo deixa claro que, diferentemente do que acontece em Nyad, o propósito maior do filme é sublinhar o pensamento machista que contaminava os costumes da época.
Críticas ao machismo
Nesse sentido, A Jovem e o Mar se aproxima de Pequenas Cartas Obscenas (2023), filme que está fresco na memória porque estreou nessa quinta, 25/07/2024, nos cinemas. Em ambos, as histórias inspiradas por eventos reais servem de pretexto para expor e criticar o tratamento absurdo que as mulheres recebiam no segundo quarto do século 20.
Assim, no filme desta crítica, Trudy tem a chance de participar das Olimpíadas de Paris em 1924. Mas as nadadoras americanas fracassam porque não têm a oportunidade de treinar – o que foi possível apenas para os atletas masculinos. Prestes a desistir de seus sonhos, Trudy decide fazer a travessia do Canal da Mancha, feito que só alguns homens conseguiram até então. Mas, o comitê oficial de esportes dos EUA indica o mesmo treinador que foi para as Olimpíadas com Trudy. E, na primeira tentativa, fica evidente que ele quer mesmo é sabotar esse desafio. Afinal de contas, ele não suportaria uma mulher conseguir realizar algo que ele tentou várias vezes, mas nunca conseguiu.
Então, a trama reúne os elementos habituais desse gênero de filme sobre superação. A família se une a Trudy para apoiá-la e um treinador verdadeiramente interessado entra em cena. Além disso, a própria população surpreende com sua solidariedade no momento mais crítico da travessia.
A caprichada produção constrói convincentes cenas da travessia pelo mar. É uma das qualidades do diretor norueguês Joachim Rønning, de Malévola 2: Dona do Mal (2019) e Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar (2017). Este último filme, Rønning dirigiu ao lado de Espen Sandberg. A dupla, aliás, realizou antes A Aventura de Kon Tiki (2012), cujo tema se aproxima de A Jovem e o Mar, acompanhando um grupo numa balsa frágil tentando cruzar 7.000 km no oceano numa jornada da América do Sul à Polinésia.
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Ficha técnica:
A Jovem e o Mar | Young Woman and the Sea | 2024 | 129 min | Estados Unidos da América, Hungria, Itália, Reino Unido, França | Direção: Joachim Rønning | Roteiro: Jeff Nathanson, Jennifer Lee, Allison Moore | Elenco: Daisy Ridley, Tilda Cobham-Hervey, Stephen Graham, Kim Bodnia, Jeanette Hain, Glenn Fleshler, Sian Clifford, Alexander Karim.