Num breve recorte da infância de um menino, A Língua das Mariposas expõe a reação popular à Guerra Civil Espanhola.
A estória acontece numa pequena cidade na Galícia, Espanha, no ano de 1936. O menino Moncho começa a frequentar a escola. A princípio, com medo do velho professor Don Gregorio, pois ele ouviu que ele dá surras nos seus alunos. Em pouco tempo, Moncho descobre que o professor nunca bate nas crianças. Pelo contrário, é muito zeloso e dedicado ao desenvolvimento escolar e pessoal de cada aluno. Logo, se inicia uma forte amizade entre os dois.
Em paralelo, o filme mostra vários acontecimentos que ilustram esse feliz período da infância de Moncho. Entre eles, a participação dele e de seu irmão na banda da cidade, a primeira paquera, e eventuais brigas e brincadeiras na escola. Ele até bisbilhota um casal de adultos fazendo sexo.
Política
Por outro lado, fatos políticos marcam esse período imediatamente anterior à Guerra Civil Espanhola. Esse cenário perigoso está além da compreensão de Moncho, mas o marcará para sempre. Afinal, seu pai, seu professor e outros adultos muito próximos são republicanos, ou seja, contrários às forças nacionalistas lideradas pelo general Francisco Franco. Ao final do filme, constatamos que o medo e o terror da ditadura levam os republicanos a se esconderem e até fingirem o apoio a Franco. Emblematicamente, Moncho joga pedras no professor que havia se tornado seu grande amigo, numa cena muito triste.
Engana-se o espectador que pensa que A Língua das Mariposas é um daqueles filmes nostálgicos sobre a infância. Na verdade, muitas cenas trazem esse viés, inclusive com um grande apelo popular. A cena de sexo que o protagonista testemunha deixa evidente que o filme não é para crianças. Acima de tudo, há essa abordagem política que é o tema mais profundo dessa estória baseda no conto do escrito e jornalista Manuel Rivas.
Direção
O cineasta José Luis Cuerda, que fez também A Educação das Fadas (2006), entre outros filmes, dirige A Língua das Mariposas de forma protocolar. Há o incômodo das vozes que não foram gravadas com som direto, ou seja, os atores inseriram as vozes posteriormente, o que torna as falas um tanto artificiais. Além disso, há alguns erros de filmagem, em especial de falta de continuidade entre os planos.
Por fim, se tecnicamente A Língua das Mariposas é irregular, a estória em si possui uma força peculiar. Ao conduzir o espectador a uma infância nostálgica, o filme surpreende com a insensível atitude do protagonista no final. Sem ter a compreensão dos seus atos, Moncho segue o movimento do grupo e finge aversão às pessoas que são queridas. Nesse recorte particular, não há como não estender essa abordagem a uma crítica a todos que se comportaram dessa forma. Como resultado disso, o ditador manteve-se no poder por quase 40 anos.
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Ficha técnica:
A Língua das Mariposas (La Lengua de las Mariposas) 1999. Espanha. 96 min. Direção: José Luis Cuerda. Roteiro: Rafael Azcona, José Luis Cuerda. Elenco: Manuel Lozano, Fernando Fernán Gómez, Uxía Blanco, Gonzalo Uriarte, Alexis de los Santos, Jesús Castejón, Guillermo Toledo, Elena Bagutta.
Onde assistir
E aí, ficou com vontade de ver? Então, anote: o filme A Língua das Mariposas está na programação do Festival “Volta ao Mundo: Espanha”, de 3 a 16 de junho de 2021, no Belas Artes à la Carte. É uma parceria da plataforma com o Escritório Cultural da Embaixada da Espanha no Brasil.
Aliás, se você gostou do tema, conheça também A Trincheira Infinita (2019).