O filme “A Rebelde” é o primeiro e melhor trabalho do escritor Alberto Bevilacqua como diretor de cinema.
A cena que abre o filme justifica essa afirmação, porque se inicia com um ousado e inusitado quadro com um cadáver ao lado de uma poça de sangue. Depois, a câmera se afasta, sem cortes, até um plano geral que mostra o morto ao centro, rodeado por uma mulher de joelhos à esquerda e jipes do exército nas outras extremidades. Então, a mulher começa a narrar o que aconteceu com seu marido, que foi assassinado. Cortes alternados entre a moça e o falecido levam a um close extremíssimo no nariz e olhos da personagem, que exibe até os poros do rosto da atriz Romy Schneider, que a interpreta. Essa sequência inicial entrega o que veremos no filme. Ou seja, um drama político centrado na protagonista Irene, cuja intimidade será escancarada como as imperfeições de sua bela face.
A trama
Após a morte de seu marido, Irene enfrenta o poderoso industrial Doberdó (Ugo Tognazzi), que usa o Estado para ficar mais forte e sufocar as manifestações dos trabalhadores que protestam por melhores condições. A cor vermelha simboliza essa rebeldia, e está presente em várias cenas. Por exemplo, na fumaça do protesto dos trabalhadores na porta da fábrica de Doberdó, nas flores na entrada da residência do industrial, na cena de sexo de Irene com seu amante, etc. Aliás, o vermelho surge com força na rosa frágil embaixo da estaca da imensa máquina que Irene encara, tornando nítido que sua luta é impossível diante da disparidade dos oponentes. Sua única chance é um ataque corpo-a-corpo com o empresário.
Na primeira investida, Irene consegue se trancar em uma câmera com Doberdó e uma tomada em plongée evidencia que ela o encurralou. O segundo embate possui um visual emblemático: Doberdó se senta na extremidade inferior de uma mesa e na outra ponta, está uma outra mesa perpendicular a esta, e Irene se senta no meio dela, como se fosse a cabeça de uma cruz. Ela usa sua única arma, a sedução.
Direção e elenco
Bevilacqua exagera no uso do zoom para acentuar os momentos dramáticos. O drama maior, na verdade, é a impossibilidade de se tornar um homem bom quando já se está na lama, como acontece nos filmes sobre a máfia. E, ainda que empregue com talento a gramática cinematográfica visual, seu ofício original como escritor ainda fala alto. Por isso, o filme se apoia muito nos seus diálogos.
Romy Schneider está exuberante como a sensual Irene, num papel atípico em sua carreira, ou seja, como uma trabalhadora comum. Sem medo de exibir sua nudez ou de closes extremamente detalhados de seu rosto, a atriz se entrega ao papel. Além disso, consegue trazer para o mesmo nível o ator de comédias Ugo Tognazi em papel dramático.
Em suma, “A Rebelde” possui mais momentos bons que ruins e vale a pena ver como um retrato da luta dos trabalhadores na Itália. E, sem ser maniqueísta, porque o filme abre o ponto de vista também do empresário.
Ficha técnica:
A Rebelde (La Califfa, 1970) França/Itália, 112 min. Dir/Rot: Alberto Bevilacqua. Elenco: Romy Schneider, Ugo Tognazzi, Massimo Farinelli, Marina Berti, Gido Alberti, Roberto Bisacco, Gigi Ballista, Massimo Serato, Eva Brun, Luigi Casellatto, Ernesto Colli.
Notas:
O filme “A Rebelde” foi lançado em dvd pela Versátil Home Video.
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