A Tortura do Medo leva o espectador para dentro da mente perturbada de um serial killer obcecado pelo voyeurismo. Seu nome é Mark Lewis. Ele filma suas vítimas no momento de suas mortes, para depois se deleitar assistindo a cena várias vezes em sua casa. Como mostra o filme, sua compulsão doentia tem origem em sua infância. Nessa época, ele era cobaia dos experimentos de seu pai sobre os efeitos do medo no sistema nervoso.
Escopofilia
De cara, o filme apresenta esse protagonista assassino é apresentado logo nas suas duas primeiras sequências. Assim, o vemos quando ele chama uma prostituta na rua para fazer dela sua próxima vítima. Logo, ele comete e registra o crime. Depois, o vemos assistindo ao que ele filmou.
Então, para reforçar a personalidade complicada de Lewis, A Tortura do Medo mostra suas dificuldades em se relacionar com a vizinha. Na presença dela, ele se comporta timidamente, tal qual uma pequena criança. Aliás, o título original, “Peeping Tom”, é o termo popular em inglês para quem pratica a escopofilia.
E essa descrição visual da personalidade do serial killer continua por todo o filme. Nesse sentido, estão vários planos de câmeras fotográficas e de filmagem, onipresentes na vida de Lewis. De fato, ele se sente até desconfortável quando sai para jantar com a vizinha sem os seus equipamentos.
Vale dizer que o requinte visual de A Tortura do Medo vem do talento do diretor Michael Powell, que codirigiu com Emeric Pressburger a obra-prima Os Sapatinhos Vermelhos (1948).
Adicionalmente, repare nos detalhes da montagem. Por exemplo, na cena que termina com uma pessoa colocando chá em uma xícara em justaposição com a cena seguinte, em que alguém coloca whisky num copo, comunicando a diferença entre os dois ambientes. Além disso, é essencial o uso das cores fortes em A Tortura do Medo, que lembram as capas de revistas da época.
Vítima e algoz
Essencialmente o filme não coloca o protagonista na história simplesmente para um julgamento superficial por parte dos espectadores. Assim, ao mesmo tempo que o seu comportamento desperta repulsa, coloca-se a ideia de que Lewis também é uma vítima. O que ele se tornou resulta das atrocidades às quais seu pai o submeteu e que ele não conseguiu resolver em sua consciência. Dessa forma, a estória compele o espectador a assumir duas atitudes contraditórias. Enquanto ele torce para que Lewis não seja descoberto, também quer que ele não cometa mais nenhum crime.
Por fim, A Tortura do Medo instiga o espectador, conduzindo-o por uma incômoda aproximação a uma pessoa perturbada e incapaz de controlar seus impulsos assassinos. Aliás, duas outras produções, também britânicas, dialogam com o tema desse filme. Uma delas é O Colecionador (1965), de William Wyler, sobre o prazer de um homem em manter uma mulher em cativeiro. E a outra é Frenesi (1972), de Alfred Hitchcock. Curiosamente, esse último também traz a atriz Anna Massey, que aqui interpreta a vizinha de Lewis, sobre um homem confundido com um serial killer. Então, não deixe de ver essa trilogia britânica sobre a psicopatia.
Ficha técnica:
A Tortura do Medo (Peeping Tom, 1960) Reino Unido. 101 min. Dir: Michael Powell. Rot: Leo Marks. Elenco: Karlheinz Böhm, Anna Massey, Moira Shearer, Maxine Audley, Brenda Bruce, Miles Malleson, Esmond Knight, Martin Miller, Michael Goodliffe, Jack Watson, Shirley Anne Field, Pamela Green.