O título Branco no Branco (Blanco en Blanco, 2019) indica muito do que veremos no filme que o Chile indicou para concorrer ao Oscar 2022. Assim como o protagonista Pedro, descobrimos vagarosamente o que acontece na paisagem gélida, e branca, da Terra do Fogo no início do século 20.
Pedro chega a uma grande propriedade rural para fotografar o casamento do Sr. Porter, o dono. Mas, no primeiro dia só consegue tirar a foto da noiva, Sara, pois o Sr. Porter está muito ocupado. Nós, espectadores, estranhamos que Sara seja apenas uma menina no início da adolescência, porém, o fotógrafo parece não compartilhar essa sensação. No entanto, ele se sente desconfortável com as repostas evasivas dos empregados do latifúndio, que não lhe informam sequer quando será o casamento.
Os dias passam, e Pedro descobre que será difícil sair desse local inóspito. Afinal, o barco, único meio de transporte possível, só chega ali em algumas semanas. E, de qualquer forma, o capataz lhe diz que ele precisa trabalhar para o patrão para pagar sua estadia. Assim, o fotógrafo desce à situação de semiescravidão dos demais empregados.
Ausência de transparência
Então, sem deixar tudo “preto no branco”, entendemos aos poucos o que acontece na região, ainda que isso nunca fique totalmente transparente. Por isso, assistimos de longe a agressão que sofre Pedro, quando apanha dos capatazes do Sr. Porter. Caso a intenção fosse revelar tudo explicitamente, a câmera se aproximaria do conflito, mas em Branco no Branco, nada aparece com clara evidência. Aliás, a surra resulta da ousadia de Pedro de fotografar, às escondidas, a noiva Sara. Da mesma forma, de longe, ou fora do quadro, acontece também os assassinatos dos índios locais, ato que se torna ainda mais cruel porque o Sr. Porter recompensa os assassinos por cada orelha de índio que eles apresentam. Mesmo sem que o filme afirme, compreendemos que esse microcosmo simboliza o genocídio dos povos nativos da região, dedução acentuada pelo espírito indígena que Pedro testemunha antes de um novo ataque.
Por fim, o fotógrafo se torna tão insensível quanto os demais brancos que ocuparam essas terras – muitos deles originários do Reino Unido, pois falam inglês. Contudo, seu interesse pessoal não é tomar o território dos índios, escravizá-los ou estuprar as suas mulheres, como os demais empregados. E o diretor Théo Court, neste seu segundo longa-metragem, habilmente expressa a mancha moral do protagonista na metodicamente cruel composição da fotografia com a qual Pedro registra em sua câmera o genocídio dos índios.
Enfim, Branco no Branco é um filme duro, que entrega sua mensagem com precisão, mesmo sem recorrer a respostas fáceis. Os diálogos escassos e pouco informativos, junto com o distanciamento da câmera, refletem a mesma intenção dos colonizadores brancos a respeito do genocídio de índios. Ou seja, ofuscar a verdade, como faz a tela branca que apresenta os créditos finais.
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Ficha técnica:
Branco no Branco | Blanco en Blanco | 2019 | Chile/Espanha | Drama | 100 min | Direção: Théo Court | Com Alfredo Castro, Lars Rudolph, Lola Rubio, Esther Veja, Alejandro Goic, Ignacio Ceruti, David Pantaleón, Santos Luis Terrazas Ayla, Hermando Calderon.