“Clube da Luta” deve ser visto duas vezes (pelo menos)
David Fincher chegou ao cinema após se especializar em videoclipes. Começou com “Alien3” (1992) e destacou-se em filmes que o colocaram como um dos grandes diretores contemporâneos. Por exemplo, “Seven: Os Sete Crimes Capitais” (1995), “Vidas em Jogo” (1997), “O Quarto do Pânico” (2002), “Zodíaco” (2007), “Garota Exemplar” (2014) e, claro, este “Clube da Luta”.
A linguagem ágil da predecessora carreira musical de Fincher continua evidente, desde os créditos, embalando uma trilha sonora moderna e pulsante. No início, numa aparente antecipação do que está por vir, a câmera percorre o caminho entre o narrador e a bomba prestes a detonar. Esse mesmo recurso será posteriormente usado para explicar como o apartamento dele pode ter explodido. Também a justaposição de imagens ilustra a visão antissistema do personagem de Edward Norton. O materialismo ao qual ele se viciou recebe uma ilustração clara no filme, ao mobiliar seu apartamento como um catálogo de loja de móveis, inclusive com os nomes dos itens. A intenção não é retratar a realidade, mas mostra-la como uma paródia.
Violência da alienação
Tal como em “Laranja Mecânica” (1971), de Stanley Kubrick, há muita violência na tela. Porém, mostrada com estilismo exagerado, justamente para que se afaste do realismo, para assim evidenciar a posição crítica em relação a ela. As cenas violentas não estão nos filmes para incitar atos do tipo, apesar de ambos terem sofrido críticas nesse sentido. Aqui, o alvo é o materialismo e a vida sem objetivo restrita à carreira profissional. Assim, a violência e a anarquia resultam como efeito funesto dessa alienação.
A perda do senso de consequência leva à distopia que o protagonista almeja. O clube da luta do título exemplifica esse desvio de comportamento, onde as pessoas se agridem por prazer. Essa morbidez dialoga com aquela de “Crash – Estranhos Prazeres” (1996), de David Cronenberg, onde os personagens buscam o êxtase provocando acidentes automobilísticos. Há uma sequência em “Clube da Luta” que repete esse comportamento. Contudo, o clube é apenas o início, a anarquia vira movimento organizado e as coisas saem do controle.
Filme cult
“Clube da Luta” virou cult, principalmente por causa dos seus famosos bordões. O mais famoso deles é: “A primeira regra do clube da luta é: não fale sobre o clube da luta. A segunda regra do clube da luta é: não fale sobre o clube da luta”. Outro afirma: “Você não é seu emprego.”
Assim como “O Sexto Sentido” (1996), de M. Night Shyamalan, há uma revelação em “Clube da Luta” que altera a perspectiva de tudo o que foi assistido no filme até que o espectador a descubra. Por isso, ele deve ser visto pelo menos duas vezes, para checar se o filme faz sentido sob essa nova perspectiva. Funciona melhor no filme de Shyamalan, mas o filme de Fincher preserva seu forte impacto.
Ficha técnica:
Clube da Luta (Fight Club, 1999) EUA/Alemanha, 139 min. Dir: David Fincher. Rot: Jim Uhls. Elenco: Edward Norton, Brad Pitt, Meat Loaf, Helena Bonham Carter, Zach Grenier, Rachel Singer, Joel Bissonnette, Eion Bailey, Jared Leto, Peter Iacangelo.
Assista: entrevista com David Fincher sobre o filme