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Como Era Verde o Meu Vale (filme)
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Como Era Verde o Meu Vale

Avaliação:
10/10

10/10

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Crítica | Ficha técnica

Como Era Verde o Meu Vale é um dos filmes perfeitos de John Ford. Faz parte da sua obra voltada às suas raízes imigrantes. Não exatamente a origem irlandesa de seus pais, mas a vizinha galesa.

Baseado no livro de Richard Llewellyn, Como Era Verde o Meu Vale conta a infância de Huw Morgan (Roddy McDowall) numa pequena vila no interior do País de Gales. A narração desse personagem na idade adulta conduz o relato nostálgico de suas memórias.

Trabalho nas minas de carvão

John Ford constrói um retrato naturalista de uma comunidade que dependia do trabalho na mina de carvão local. O velho Sr. Morgan (Donald Crisp) construiu sua vida em torno dela, assim como todos da vila. Além dele, hoje seus cinco filhos trabalham como carvoeiros. Apenas o menino Huw ainda não está nessa labuta. Essa turma masculina é cuidada pela matriarca, com o auxílio de sua filha Angharad (Maureen O’Hara).

É um trabalho duro e literalmente sujo, mas que fornece o sustento suficiente da família. Porém, trabalhadores de minas desativadas em outras cidades chegam ao vale oferecendo seus serviços. Então, com a maior oferta de mão-de-obra, os salários caem. O filme demonstra, didaticamente, o que motiva a origem de um sindicato de trabalhadores, e o poder da união e das greves. Com isso, surgem rusgas na família Morgan, pois os filhos são a favor do sindicato, e o pai contra.

Logo depois, Como Era Verde o Meu Vale explica o processo de emigração de europeus para a América. Quando dois dos jovens Morgans perdem seus empregos nas minas, eles resolvem partir em busca do sonho americano, como fizeram os pais de John Ford.

Múltiplas subtramas

Como Era Verde o Meu Vale é muito rico em explorar vários aspectos dessa comunidade no final do século 19. Nas mãos de um diretor sem talento, essa multitude de subtemas resultaria numa narrativa confusa. Mas, com o poder de contar estórias de John Ford, absorvemos todas de forma simples e instigante.

Nesse cenário, a sociedade possuía uma importância enorme, para o bem e para o mal. Era como mais um membro da família. Pelo lado positivo, a comunidade inteira festeja o casamento do filho mais velho dos Morgans, e todos ajudam e se solidarizam quando acontece algum acidente nas minas. Por outro lado, o coletivo pode se tornar agressivo. Isso acontece quando o patriarca dos Morgans se posiciona contra o sindicato. De forma semelhante, ao impor o moralismo hipócrita contra o pecado da jovem solteira que fica grávida. E, também, nas fofocas que denigrem a imagem de Angharad por um alegado caso com o pastor local.

A direção de John Ford

A primeira parte do filme, que abre com a narração de Huw adulto, traz a marca de John Ford ao mover a câmera lateralmente e enquadrar a janela que serve de moldura para introduzir a vila ao espectador. Esse olhar do interior de uma casa para o exterior, através de uma porta ou uma janela, se repete em vários de seus filmes.

E Ford conduz a história por uns dez minutos sem praticamente recorrer aos diálogos. Em alguns desses trechos, utiliza canções tradicionais para contribuir na narrativa. Aliás, as cantorias vindas dos próprios moradores em cena estão muito presentes em todo o filme. E são essenciais para fazer a trama andar. Por exemplo, servem para evidenciar a alegria do casamento do filho mais velho, em contraste com o posterior enlace de Angharad com o filho do proprietário das minas de carvão.

Aliás, esse recorte da trama revela que o filme, bem como o livro, privilegia a autenticidade. Por isso, abre mão de um desfecho romântico do caso de amor platônico entre Angharad e o pastor. Este decide não dar vazão à sua paixão porque isso significaria condenar a amada a uma vida de sacrifícios como mulher do pároco. E ela tem a oportunidade de se casar com um homem rico. Com apenas 19 anos na época das filmagens, Maureen O’Hara estabelece uma evidente diferença entre a moça vivaz e destemida que dá lugar a uma figura esmaecida após essa decisão.

Sob outro aspecto, apreciamos em Como Era Verde o Meu Vale os resultados da mise-en-scène que John Ford prepara de acordo com o tom de cada cena. Por exemplo, em um momento de tranquilidade, Angharad e o pastor conversam na cozinha ao lado de uma janela por onde entra uma leve luz matinal. Já o casamento dela parece mais um funeral, e quando ela sai do quadro, vemos o pastor ao fundo, atrás das lápides do cemitério da paróquia.

Orgulho de ser minerador

Voltando ao início do filme, a narração diz que o garoto permaneceu 50 anos no vale. Ou seja, contrariando os desejos do pai que não queria o caçula nessa vida dura de minerador. Mas, Huw sentia orgulho em ser um deles. Por isso, jogou fora a oportunidade de estudar numa universidade para seguir a profissão da família. Aliás, tal como queria a sua mãe.

Parte da riqueza do filme está nos contrastes, não só entre a celebração e a tristeza, mas também entre a comédia e a tragédia. Assim, imediatamente após a cômica cena do acerto de contas com o abusivo professor de Huw, temos um acidente fatal na mina. A miríade de situações apresentadas no longa deleita o espectador, com diferentes tons que nunca deixam o relato perder seu poder de entreter. E todas são contadas de forma aparentemente simples, fáceis de se compreender. Contudo, as cenas foram previamente planejadas para obter esse resultado. Não tão detalhadamente como fazia Alfred Hitchcock, mas com o pragmatismo inteligente que Ford compartilha com o personagem do velho Morgan.

Oscars

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas apreciou esse encantamento de Como Era Verde o Meu Vale. O filme concorreu a dez Oscars, e venceu cinco deles. Os prêmios foram para Melhor Diretor (o terceiro de quatro que John Ford ganharia), Melhor Fotografia em Preto e Branco (Arthur C. Miller), Melhor Direção de Arte em Preto e Branco (Richard Day, Nathan Juran, Thomas Little), Ator Coadjuvante (Donald Crisp) e, por fim, Melhor Filme. Um feito e tanto, ainda mais considerando que Cidadão Kane disputou o Oscar nesse ano.


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