Contra o Gelo (Against the Ice, 2022) conta uma história de enorme relevância política para definir a Groenlândia como território dinamarquês autônomo.
Em 1909, a Dinamarca organizou uma expedição liderada pelo Capitão Ejnar Mikkelsen (Nikolaj Coster-Waldau, de Game of Thrones). O objetivo era contestar o domínio do Nordeste da Groenlândia pelos Estados Unidos. E, isso se realizaria provando que a ilha não estava dividida em duas partes diferentes. Após uma tentativa frustrada, que deixou um companheiro morto e outro ferido, ele parte novamente pela trilha terrestre. A sua tripulação considera a missão arriscada demais, e somente o mecânico Iver Iversen (Joe Cole) se voluntaria para acompanhar Ejnar.
O filme se divide entre a árdua jornada pela geografia inóspita da Groelândia e a longa espera pelo resgate. Na primeira parte, Ejnar e Iver contabilizam várias perdas, mas conseguem alcançar as provas de que a Groenlândia é apenas uma ilha. Porém, o retorno se mostra muito mais complicado porque seus recursos já estão escassos. Com menos cães puxando seus trenós, pouca comida e uma fadiga mortal, os dois ainda enfrentam o ataque de um urso polar.
Fatos x ficção
O trabalho mais conhecido do diretor do filme, o dinamarquês Peter Flinth, é a aventura épica Arn: O Cavaleiro Templário (2007), lançado como minissérie e, também como longa. Essa experiência ajuda-o a construir as convincentes cenas de ação de Contra o Gelo. Porém, o roteiro (coescrito por Nikolaj Coster-Waldau e Joe Derrick), baseado no livro do próprio explorador Ejnar Mikkelsen, se mantém, majoritariamente, fiel aos relatos. Por isso, o enredo não traz os protagonistas em cenas grandiosamente heroicas. Em outras palavras, se atém a retratar dois homens comuns lutando contra as condições adversas da natureza local.
Mas, em alguns trechos, notamos a adaptação dos fatos para encaixá-los nos moldes dos cânones da roteirização. E, nesses pontos, a trama fica óbvia. Iver Iversen, por exemplo, assume o arco tradicional do personagem, iniciando a jornada como um inexperiente explorador. Então, aprende com seus erros, e acaba até salvando o protagonista. Assim, conclui a aventura como uma pessoa amadurecida. Aliás, dentro desse arco, é previsível que sua proibida afeição por um dos cachorros que puxam o trenó acabará numa tragédia. Da mesma forma, parece saliente demais que é um erro sair da cabana sem deixar um bilhete para uma eventual chegada do resgate.
A agonizante espera
A segunda parte do filme mostra a agonizante espera pelo salvamento. A solidão afeta os nervos dos dois homens, como vimos em O Farol (The Lighthouse, 2019), de Robert Eggers. O mais afetado é o Capitão Ejnar, que passa a ter alucinações com sua amada Naja (Heida Reed). Nesse sentido, destaca-se uma bem construída cena de uma miragem que engana até o espectador, que se frusta juntamente com o personagem quando descobre que a visão não é real. Contrariando as expectativas, Iver consegue manter a lucidez e, com isso, garantir a sobrevivência dos dois antes que a paranoia do companheiro os mate.
Merece louvor a produção, por realizar as filmagens em locações naturais da Islândia, em paisagens gélidas que tornam autêntica a adaptação desse fato de incontestável valor histórico. Talvez, alguns espectadores sintam falta de eventos heroicos notáveis, comuns em filmes de aventura ficcionais. Porém, as tentativas de romancear demais os acontecimentos provam que, nesse filme, a proximidade com o real demonstra mais força.
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Ficha técnica:
Contra o Gelo | Against the Ice | 2022 | 102 min | Islândia, Dinamarca | Direção: Peter Flinth | Roteiro: Nikolaj Coster-Waldau, Joe Derrick | Elenco: Nikolaj Coster-Waldau, Joe Cole, Heida Reed, Þorsteinn Bachmann¸ Charles Dance, Gísli Örn Garðarsson, Nick Jameson.
Distribuição: Netflix.
