“Dunkirk”, de Christopher Nolan, é um dos melhores filmes de guerra de todos os tempos, daqueles que o espectador vivencia o campo de batalha.
O filme não possui apenas um ou dois protagonistas, mas vários personagens em destaque, equivalentes aos muitos heróis de guerra anônimos. Os acontecimentos se passam em paralelo, numa seleção de microcosmos de muitas histórias que as guerras criam e que poucas viram memórias. O roteiro de Christopher Nolan resgata um evento que realmente aconteceu durante a Segunda Guerra Mundial. Nessa ocasião, navios militares receberam a ajuda de milhares de embarcações particulares menores vindas da Inglaterra para resgatar 300.000 soldados ingleses, franceses e belgas na cidade litorânea de Dunkirk, no norte da França.
Heróis anônimos
Essa narrativa, que não permite maior aprofundamento dos personagens, se alinha com a ideia de ilustrar os heróis anônimos da guerra. No entanto, isso prejudica a identificação do espectador com qualquer um deles. O primeiro que surge em cena, Tommy (Fionn Whitehead), pronuncia uma única palavra nos quase primeiros trinta minutos de filme. Todos revezam seu tempo na tela em tramas paralelas, algumas delas se cruzam por instantes. O único arco de personagem identificável é o de Peter (Tom Glynn-Carney), o filho do barqueiro Sr. Dawson (Mark Rylance). O jovem passa por uma jornada de transformação de amadurecimento que o leva a aceitar o estado instável do soldado resgatado vivido por Cillian Murph. Por isso, em certa cena responde que seu amigo está bem, mesmo já estando morto.
A um dos personagens é permitido um momento poético e totalmente cinematográfico, escapando da necessidade de descrever a realidade da guerra. Referimo-nos ao piloto inglês a bordo de um caça sem combustível que consegue derrubar um avião alemão inimigo antes que esse lance bombas sobre os soldados que aguardam o resgate na praia. Para ele, o tempo desobedece a lógica e transcorre mais lento que os demais acontecimentos da estória. Ele continua planando sua aeronave até pousar tranquilamente na areia, sem nenhuma avaria.
Incríveis cenas de batalha
Contudo, essa estrutura narrativa não é a principal qualidade de “Dunkirk”. O que deslumbra o espectador são as incríveis cenas de batalha. No ar, elas são arrebatadoras, focando duelos um-a-um, que levam o espectador a acompanhar as acrobacias dos pilotos para tentar vencer o inimigo. A câmera acompanha o movimento do avião do piloto inglês, alternando ponto de vista subjetivo dele com close ups de suas ações.
O que realça o realismo não só dessas cenas, mas de todas, especialmente as de ação, são os efeitos sonoros cortantes dos tiros, dos motores dos aviões, e das bombas. Poucas vezes um filme conseguiu um impacto semelhante nesse quesito. O seguidor de Nolan, no entanto, ressaltará que o som é uma obsessão para o diretor, porque “Batman Begins” já possuía efeitos sonoros acima do padrão. A trilha sonora de Hans Zimmer, nas sequências de suspense, se equipara e se alia aos efeitos sonoros, parecendo uma locomotiva começando a andar.
Por outro lado, Han Zimmer exagera na grandiosidade da trilha sonora na pior sequência de “Dunkirk”. É quando do horizonte surgem várias pequenas embarcações vindo em direção à praia onde o comandante vivido por Kenneth Branagh aguarda, para ajudar no resgate dos soldados. A intervenção civil representa o principal pilar desse evento histórico, sem a qual jamais tantos soldados seriam resgatados. O problema no filme é que a música grandiosa não está de acordo com a quantidade de barcos que aparecem na tela, muito menor do que a orquestração sugere. Talvez a culpa não seja de Zimmer, mas de Nolan, já que o que vemos de recursos de resgate na tela não parece suficiente para o salvamento de 300.000 pessoas.
“Nunca nos renderemos”
“Dunkirk” fecha com maestria sua história, ao revelar o receio de alguns soldados resgatados a respeito da opinião pública, que poderia considerá-los covardes ou, no mínimo, inúteis. Mas, um homem cego que distribui cobertores, lhes diz que eles fizeram a sua parte por terem sobrevivido. Em seguida, ouvimos o famoso discurso de Winston Churchill motivando os ingleses a continuar lutando contra os alemães, e nunca se renderem. Por fim, o comandante vivido por Kenneth Branagh encarna esse espírito ao continuar em Dunkirk, para agora salvar os franceses.
Ficha técnica:
Dunkirk (Dunkirk, 2017) Inglaterra/França, 106 min. Dir/Rot: Christopher Nolan. Com Fionn Whitehead, Tom Hardy, Cillian Murphy, Mark Rylance, Aneurin Barnard, Harry Styles, Kenneth Branagh, James D´Arcy, Jack Lowden, Kevin Guthrie, Damien Bonnard, Barry Keoghan, Tom-Glynn Carney.
Warner Bros.
Assista: Q&A com Christopher Nolan