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Ficção Americana

Avaliação:
8/10

8/10

Crítica | Ficha técnica

Ficção Americana (American Fiction) apresenta como credenciais suas cinco indicações ao Oscar em categorias importantes: filme, roteiro, ator (Jeffrey Wright), ator coadjuvantes (Sterling K. Brown), e trilha sonora (Laura Karpman). Podem não significar nada, mas neste caso a premiação da Academia cumpre o seu papel, o de chamar a atenção para o filme. Talvez pouca gente se interessasse por esse longa, pensando se tratar de mais um veículo para levantar a bandeira dos afro-americanos.

De fato, é um filme feito por afro-americanos, entre eles o estreante diretor Cord Jefferson. Mas, sua abordagem sobre o tema da identidade ultrapassa a exploração de estereótipos. Baseado em livro de Percival Everett, o roteiro explicita essa visão do protagonista Thelonious Ellison (Jeffrey Wright, em excelente atuação). Obviamente apelidado de Monk (por causa de Thelonious Monk, o famoso músico de jazz), ele é um escritor e professor de literatura universitário em Los Angeles. À beira de um colapso nervoso, insulta seus alunos e, por isso, o obrigam a tirar uma licença.

Então, viaja até Boston para visitar sua família, o que não faz há anos. A irmã, médica, avisa que a mãe está perdendo a memória. Pouco tempo depois, Monk se vê forçado a cuidar da mãe. Nessas, revê o irmão Cliff (Sterling K. Brown), um cirurgião plástico que acaba de sair do armário. Ao mesmo tempo, Monk inicia um relacionamento com a vizinha Coraline (Erika Alexander).

A comédia maluca

À parte as relações familiares e romântica, caminha uma narrativa na linha comédia maluca. Contrariado com a infestação de livros que estereotipam os negros como pessoas de pouca cultura, pobres e envolvidos no crime, escreve obras com base em sérios estudos acadêmicos.  Por isso, despreza o sucesso de Sintara Golden (Issa Rae), ao vê-la lendo um trecho do livro dela repleto de gírias e erros gramaticais para refletir a linguagem do gueto. Assim, por farra, escreve sob um pseudônimo um livro repleto desses clichês e envia para o seu empresário. Este apresenta para uma editora, que gosta do material, que considera autêntico, e faz uma oferta irrecusável para publicá-lo. Além disso, Hollywood também aparece pagando ainda mais por uma adaptação do livro.

Está pronto, então, um sólido terreno para o drama da estória. Monk precisa de dinheiro para internar a sua mãe, mas seus livros sérios não vendem. Com isso, surge o dilema: se ele sustentar a mentira sobre o autor do novo livro para enriquecer, colaborará com a imagem sobre os afro-americanos que ele tanto combate. O reflexo maléfico disso em sua vida pessoal segue os cânones da comédia romântica, pois quebra a persona pela qual Coraline se interessou.

Além de construir esse bem amarrado roteiro, Cord Jefferson também faz um belo trabalho na direção. Na primeira metade, porém, exagera no uso da trilha musical, a todo momento caracterizando o tom das cenas – invariavelmente com um toque de humor refinado, mas próximo de produtos feitos para a TV e o streaming, principalmente séries. Quando os dramas surgem na vida do protagonista, o tom muda e essas músicas de fundo se tornam menos intrusivas e frequentes.

A direção

A criatividade do diretor Cord Jefferson colabora na narrativa. Quando Monk escreve o livro trash, surgem na tela os personagens que ele cria, dois marginais em uma cena de crime. E basta essa breve exposição para que se possa deduzir exatamente o conteúdo dessa sua obra popular. Além disso, ao longo do filme, movimenta a câmera com fluidez e usa com parcimônia a decupagem, quebrando em planos menores somente quando necessário.

Na conclusão, seguindo ainda essa troca com o processo de criação de um escritor, entram na tela diferentes sequências da mesma situação. Que, diferente do padrão, deixam em aberto a resolução do relacionamento entre Monk e Coraline. Desta forma, reforça a ideia de que essa não é uma comédia romântica. Até entra no gênero, mas o humor traz um sarcasmo inteligente que dispara contra o retrato preconceituoso que se tornou padrão por ser mais popular e lucrativo. Citando o empresário de Monk, Ficção Americana não é para lobotomizados.

Cord Jefferson estreia com um filme inteligente, e se arrisca a não seguir o padrão. Ou seja, com uma comédia que faz rir sem reforçar o imaginário popular já consolidado.

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Ficha técnica:

Ficção Americana | American Fiction | 2023 | 117 min | Direção: Cord Jefferson | Roteiro: Cord Jefferson | Elenco: Jeffrey Wright, Tracee Ellis Ross, Erika Alexander, Sterling K. Brown, Myra Lucretia Taylor, John Ortiz, Issa Rae, Leslie Uggams, Adam Brody, Keith David, Raymond Anthony Thomas.

Distribuição: Amazon Prime Video.

Onde assistir:
Um casal caminha por um jardim sorrindo.
Cena de "Ficção Americana"
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