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Jerry Lewis: Seus 15 Melhores Filmes, por Sérgio Alpendre

Jerry Lewis: Seus 15 Melhores Filmes, por Sérgio Alpendre
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Responsável pela ponte mais estruturada na ligação entre a comédia burlesca dos anos 1920 e a comédia americana moderna dos anos 1960 em diante, Jerry Lewis ainda não tem o reconhecimento que merece, a não ser na França.

Em celebração a esse verdadeiro gênio do cinema, como ator, produtor e diretor, elenco aqui meus 15 filmes preferidos entre todos que o astro protagonizou, dirigidos por ele mesmo ou por Frank Tashlin, seu mentor (infelizmente, nenhum filme de Norman Taurog, George Marshall ou algum outro que o tenha dirigido conseguiu entrar nesta lista).

01. O Terror das Mulheres (The Ladies Man, 1961), de Jerry Lewis

A obsessão com o sexo na sociedade americana (como escreveu Noel Simsolo), a maneira como a visão da mulher é construída pela indústria de entretenimento, a ilusão do cinema, a ilusão da TV, a cultura das celebridades e muito mais neste filme antológico que, não à toa, encantou Godard. O momento em que a câmera, acoplada a uma grua, desvenda a casa de bonecas onde o protagonista vai trabalhar após o trauma do dia de sua formatura é o esplendor da mise en scène.

02. O Otário (The Patsy, 1964), de Jerry Lewis

Não é o mais engraçado de Jerry Lewis (O Terror das Mulheres e Errado Pra Cachorro disputam esse posto), mas é o que tem o desfecho mais genial, seguido de perto pelo de Mocinho Encrenqueiro. É o mesmo desnudamento da mentira nos dois filmes. Hollywood é desmantelada pelo crianção de bom coração (persona que se despede aqui). Tido também como uma vingança contra a Paramount, por anos e anos de cerceamento e obstáculos à liberdade de criação.

03. Errado Pra Cachorro (Who’s Minding the Store?, 1963), de Frank Tashlin

Representação de um matriarcado com uma incrível profusão de piadas. Tashlin e Lewis inspirados num dos filmes mais engraçados de sempre. É também o filme no qual o caos irrompe de vez. A destruição de um palácio do consumo com um parentesco com o que Antonioni viria a fazer em Zabriskie Point (1970).

04. O Rei dos Mágicos (The Geisha Boy, 1958), de Frank Tashlin

Segundo filme com Tashlin e após a separação com Martin. Este, após os inferiores O Rei do Circo (1954) e O Rei do Laço (1956), é a primeira obra-prima de Frank Tashlin, um filme chapliniano, menos engraçado que Bancando a Ama Seca (1958), mas extremamente tocante. A mise en scène aqui é uma lição que Lewis aprenderá muito bem. Tashlin, por sua vez, parece ter buscado inspiração no cinema japonês (a palheta de cores indica isso, assim como alguns enquadramentos).

05. O Mensageiro Trapalhão (The Bellboy, 1960), de Jerry Lewis

O gênio assume oficialmente a direção e já faz um tributo a Stan Laurel. O cinema moderno americano atinge um novo patamar com esta coleção de gags se sucedendo sem que tenhamos tempo de nos recompor. O jogo de espelhos entre personagens e atores é genial. Filmado às pressas porque Lewis preferiu que a Paramount lançasse Cinderelo Sem Sapato (1960) só no final do ano.

06. Mocinho Encrenqueiro (The Errand Boy, 1961), de Jerry Lewis

Jerry Lewis gastou muito dinheiro em Terror das Mulheres, e agora interpreta um personagem estúpido contratado para descobrir quem está gastando todo o dinheiro do estúdio Paramutual (brincadeira com a Paramount e a Mutual, estúdio responsável pela disparada na carreira de Chaplin). Obviamente, esse estúpido vai destruir todo o estúdio.

07. Bancando a Ama Seca (Rock-a-Bye Baby, 1958), de Frank Tashlin

Após a separação da dupla Martin-Lewis, Jerry Lewis realizou seus melhores filmes, primeiro com Frank Tashlin, depois também na direção. Aqui, o primeiro dos dois grandes filmes que fez em 1958 com Tashlin, vemos a maestria do diretor na composição da imagem, não só nas piadas visuais, mas também nos enquadramentos poéticos, com reflexos e molduras comentando muito do que acontece em cena. Essa maestria, Lewis aprendeu direitinho, e dois anos depois começaria as filmagens de seu primeiro longa como diretor, O Mensageiro Trapalhão.

08. O Bagunceiro Arrumadinho (The Disorderly Orderly, 1964), de Frank Tashlin

Capítulo final da dupla Tashlin-Lewis. Segundo este último, Tashlin dirigiu praticamente sozinho este e Errado Pra Cachorro, pois Lewis percebeu que eram projetos importantes para seu mentor no cinema. Nas outras colaborações, Lewis clama que a direção era praticamente dividida entre eles, tamanha a cumplicidade que tinham.

09. Cinderelo Sem Sapato (Cinderfella, 1960), de Frank Tashlin

Sempre achei um filme menor e nunca entendia por que críticos sérios como Chris Fujiwara e Robert Benayoun lhe davam tanta importância. Bem, eu estava errado. Talvez seja o menos engraçado de Lewis com Tashlin, mas a direção continua na linha de O Rei dos Mágicos e aprofunda um sentimento de melancolia que iremos reencontrar futuramente nos filmes dirigidos por Lewis, embora, penso, nunca tão forte como aqui. O corredor da mansão com a divisão de classes é um achado visual de mestre. Rodado dois meses antes de O Mensageiro Trapalhão, mas só lançado depois, mostra uma autoria dividida e Lewis assumindo Tashlin como seu fada-padrinho. Cinderfella, o personagem, é a cristalização de tantos outros duplos da carreira de Lewis, numa ênfase na duplicidade que será retomada em O Professor Aloprado.

10. A Família Fuleira (The Family Jewels, 1965), de Jerry Lewis

Último filme que Lewis dirigiu para a Paramount. O cinema americano cômico não seria mais o mesmo após essa fase 1960-1965, incluindo os filmes de Tashlin. Aqui, todos os tios que disputam a guarda da pequena herdeira são interpretados por Lewis. Destaco o episódio com o tio piloto de avião e o tio detetive.

11. O Fofoqueiro (The Big Mouth, 1967), de Jerry Lewis

O Fofoqueiro é o primeiro caso bem-sucedido, para Lewis, de comédia em chave diferente daquela que o tornou famoso. Ele não é bem uma criança grande com momentos de adulto. É mais um adulto atrapalhado. O burlesco é um pouco mais econômico que em seus filmes mais conhecidos, embora o humor ainda seja forte, com uma direção envolvente e inventiva, na mesma toada que ele ensaiava em Três num Sofá (1966) – movimentos de câmera e enquadramentos maneiristas, por exemplo. Os velhos amigos Del Moore e Buddy Lester marcam presença, e quem brilha também, imitando Lewis, é Charlie Callas, estreante no cinema, como um dos capangas que perseguem o fofoqueiro. À certa altura, a loucura toma conta e nem imaginamos onde e como vai parar.

12. Artistas e Modelos (Artists and Models, 1955), de Frank Tashlin

Incrível que neste primeiro dos filmes de Martin e Lewis dirigidos por Frank Tashlin o nível já seja bem superior a tudo que a dupla fez anteriormente no cinema. Não à toa, é o melhor da dupla Martin-Lewis, com Ou Vai ou Racha, outro de Tashlin. O número de piadas visuais é tão grande que começamos a sentir um certo incômodo quando Dean Martin começa a cantar. A separação, no ano seguinte e após mais dois filmes, será boa para ambos. Jerry Lewis começa a brilhar cada vez mais, e Martin atua na obra-prima Deus Sabe Quanto Amei (1958), de Vincente Minnelli.

13. Ou Vai ou Racha (Hollywood or Bust, 1956), de Frank Tashlin

Último filme de Martin e Lewis, foi filmado com a dupla já tendo decidido a separação, num clima meio triste, em que ambos clamavam desinteresse. Bom, são profissionais e estavam sob a batuta de um craque (Tashlin), e se nunca soubéssemos do clima das filmagens, não seria o filme a nos dizer. Aliás, este e Artistas e Modelos eram meus preferidos da dupla quando os via na Sessão da Tarde, ainda criança ou adolescente (vi inúmeras vezes, pois passavam todos os anos). O Meninão (1955) era o terceiro. Posso dizer, como Tag Gallagher, que entrei no autorismo pela porta dos fundos, pois, sem saber, preferia os dois dirigidos por Frank Tashlin. Meus outros preferidos de Jerry Lewis, aliás, ou tinham a direção de Tashlin ou do próprio Lewis, antes que eu prestasse atenção a quem dirigiu os filmes.

14. O Professor Aloprado (The Nutty Professor, 1963), de Jerry Lewis

Lewis ensaia um novo tipo de personagem, com outra voz e outro visual, acenando para o que sua persona cinematográfica irá se tornar em Três Num Sofá, O Fofoqueiro e De Caniço e Samburá (1969). Muitos consideram O Professor Aloprado a obra-prima de Lewis, mas sempre que o revejo sinto um problema de ritmo, que pode estar na expectativa da sucessão de gags que normalmente seus filmes têm, embora pense que essa expectativa valha para as primeiras duas ou três visões, quando espaçadas.

Aqui, sinto que a trama escrita por Lewis e Bill Richmond na cola de “Dr.Jekyll and Mr.Hyde”, o romance gótico de Robert Louis Stevenson, demora um pouco mais do que deveria para chegar no ponto da primeira transformação, o que se dá com pouco mais de meia hora de filme. Não por acaso, é um dos filmes mais longos do astro até então, com 107 minutos, contra uma média anterior de 90 minutos. Lewis geralmente tem um poder de síntese invejável, que parece ter deixado de molho nesta primeira parte do filme. Apesar disso, existe a gag do alongamento dos braços, inesquecível. Penso também que a primeira transformação, carregada no grotesco e com uma trilha musical incisiva no horror, mostre uma mão pesada que nenhum outro filme dirigido por Lewis ou Tashlin havia demonstrado.

Por outro lado, tudo que se segue à primeira transformação até acabar o efeito da poção, da reação das pessoas na rua até a entrada e permanência no bar, é Cinderelo Sem Sapato à quinta potência. As pessoas reagem como se ele fosse um monstro, e certamente é, mas elas veem um homem seguro de sua capacidade de atração e intimidação, um protótipo de galã que não esconde sua monstruosidade de macho tóxico. Novamente Lewis às voltas com seu duplo. A masculinidade alternativa que fracassa e a masculinidade tóxica que oprime. Se não está à altura de O Terror das Mulheres e O Otário, duas obras-primas absolutas, é ainda muito importante no percurso artístico do autor.

15. As Loucuras de Jerry Lewis (Smorgasbord, 1983), de Jerry Lewis

Lewis retoma sua revolução do humor, interrompida durante os anos 1970, após um ensaio interessante, mas meio enferrujado, com Um Trapalhão Mandando Brasa (1980). Retoma também o tipo de edição do longa anterior ao hiato, Qual o Caminho para a Guerra? (1970), com a imagem congelada no fim de cada esquete. O sucesso de comédias como a do trio ZAZ (Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu, de 1980) parece ter libertado Lewis e seu personagem para um nível de liberdade e irreverência que ele não demonstrava desde O Bagunceiro Arrumadinho.

Texto escrito pelo crítico e professor de cinema Sérgio Alpendre, especialmente para o Leitura Fílmica.

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