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Saiba quem é Jules* Elting, destaque de “Carro Rei”

Jules Elting (Foto: divulgação/Gal Oppido)
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Jules* Elting é destaque no longa Carro Rei, de Renata Pinheiro, que estreia nos cinemas nesta quinta (30/7). Pessoa trans não-binárie, nascide na Alemanha, Jules* tem atuação de destaque como Mercedes, uma artista feminina que carimba símbolos contra o poder masculino em praça pública na calada da noite. Para as filmagens, saiu de Berlim, onde mora atualmente, e foi gravar em Caruaru, para fazer sua estreia no audiovisual Pernambucano – renomado pólo de cinema nacional.

“A preparação para o filme foi intensa. Foi algo muito teatral, muito físico. Além, sempre, do forte psicológico que é criar uma persona”, conta Jules*. Para o longa-metragem, precisou contratar personal trainer e também passou a fazer aulas de pole dance para se preparar para sua personagem e realçar sua performance. “Quando tenho um novo papel gosto de fazer mergulhos profundos e criar todo o universo dessa pessoa, mesmo que no resultado final sejam vistos apenas momentos específicos deste mundo construído.”

Teatro

Nascide em Hamburgo e criade em Frankfurt, e formade em dança contemporânea na Martha Graham School, em Nova York, Jules* chegou no Brasil em 2005 (onde viveu até 2015) a convite de Zé Celso Martinez para integrar a companhia Teatro Oficina. Mesmo sem falar português, chamou a atenção do diretor e seu grande elenco em uma temporada da trupe em Berlim. Aprendeu a língua com Euclides da Cunha, nas leituras e encenações de “Os Sertões”, no tradicional bairro paulistano do Bixiga, bem como nas comunidades paulistanas, onde fez grandes amigos e se habituou às gírias e modos linguísticos locais.

“Por trás daquele conhecido movimento carnavalesco do Teatro Oficina, tem uma cabeça coletiva muito inteligente. É uma companhia que trabalha duro. Principalmente os não-homens que ali estão me inspiraram com a dedicação, criatividade e talento. Então, falaram que duas pessoas da companhia estavam alugando uma casa em São Paulo e eu decidi ir junto, morar com eles e viver isso de verdade”, lembra Jules*. “Cancelei todos os contratos, telefone, internet, plano de saúde e apenas fui.”

“Meus primeiros personagens no Oficina eram bichos e coros – não necessariamente eu sabia o que eu estava falando. Mas pelo menos os animais são universais”, se diverte. “Aos poucos, fui aprendendo o português e ganhando outros personagens e falas. Até que protagonizei Cacilda Becker ao lado de Bete Coelho”, comenta.

Cinema

Até então artista de teatro, foi nessa vivência no Brasil que Jules* começou a conhecer o trabalho com cinema. “Na Alemanha, é tudo muito segmentado: quem dança, dança; quem atua, somente atua; e por aí vai. Aqui você é artista, pensa como artista, pensa no todo”, compara.

Mas Carro Rei não foi o primeiro papel de Jules* no cinema brasileiro. Antes, elu fez participações em filmes como A Via Láctea (2007) e Encarnação do Demônio (2008), já considerado um clássico moderno de Zé do Caixão. Além disso,  também esteve em competição no Festival do Rio com o longa Alguma Coisa Assim, de Esmir Filho (2017), entre outros ao longo da década.

Seu primeiro grande trabalho no cinema, foi como a amazona Diana em O Ornitólogo (2016), de João Pedro Rodrigues – diretor português conhecido desde o fim dos anos 90 por seus filmes icônicos de tópicos LGBTQIA+. Logo na estreia, o filme já recebeu o Leopardo de Prata do renomado festival de Locarno, na Suíça, e rodou o mundo representando uma virada na carreira delu.

Identidade

“No lockdown, sem personagens, sem palco, protagonizei minha própria vida e mergulhei em mim, em quem eu sou. Foi pela comunidade virtual que eu fui conhecer outras pessoas trans não binárias, aprender termos que até então eram desconhecidos. Foi uma felicidade e, também, um choque dentro de mim. De repente tudo fazia sentido”, conta Jules* — o asterisco faz parte do nome, como se fosse um acento mudo.

Por muito tempo, elu não entendia sua identidade. Achava ser feliz somente no trabalho, incorporando personagens era o suficiente: “como se fosse uma coisa comum de artista”. “Fora do palco me sentia extraterrestre. Sempre senti como não fazer parte. Ser de fora. Só se sentir completamente em meu potencial como ser humano, e pessoa plena, no palco”, reflete. “Vim de um lugar, de um sistema, como todes nós, que me diz que pessoas como eu não existem. Somos invisibilizades e por isso é tão difícil se reconhecer e ter esse momento de identificação consigo”.

Agora consciente de sua identidade como pessoa trans não-binárie, Jules* tem sido também ativista da causa. “São raros personagens não-bináries e trans em contextos que não sejam de violência, de morte ou distúrbio mental. Me entender como sou trouxe o receio do fim da carreira, de não ter espaço ou papel para uma pessoa como eu”, comenta. “Tive a sorte de, logo quando entendi minha identidade, participar de um grande movimento coletivo na Alemanha, o ActOut, que abalou a indústria cinematográfica e da dramaturgia, com 185 pessoas se declarando publicamente LGBTQIA+ jogando luz na falta de diversidade nos palcos, roteiros, sets de gravação”, explica elu.

Reconhecimento

Um dos marcos dessa fase veio em junho de 2021, quando Jules* apresentou o Teddy Award, renomada premiação do Festival de Berlim voltada a obras de temática LGBTQIA+.

Na Biennale de Veneza 2022, Jules* protagoniza o longa-metragem Vampires in Space, de Pedro Neves Marques (elu/delu). Ao lado de Zahy Guajajara e Puta da Silva e mais duas atrizes portuguesas, elu vive um vampire trans em uma nave espacial. O projeto traz reflexões sobre gênero, família escolhida, saúde mental e questões de meio ambiente e futurismo.

Foto: divulgação/Gal Oppido

Onde assistir"Carro Rei"

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