Os filmes mais memoráveis de David Cronenberg são aqueles em que ele é autor (ou pelo menos coautor) do roteiro. Por exemplo, Scanners (1981), Videodrome (1983), A Mosca (1986), Gêmeos – Mórbida Semelhança (1988); enfim, a lista vai longe. E, neste século, numa fase mais apagada de Cronenberg, ele escreveu apenas Cosmópolis (2012) e o recente Crimes of the Future (2022). Mas, isso não significa que os filmes que ele só dirigiu sejam ruins. Estão aí Marcas da Violência (2005) e Senhores do Crime (2007) para desmentir quem pensa assim. Contudo, Mapas para as Estrelas poderia corroborar essa falsa teoria.
Bruce Wagner tenta ser Yorgos Lanthimos
O roteiro de Mapas para as Estrelas é de Bruce Wagner, um dos coautores de A Hora do Pesadelo 3: Os Guerreiros dos Sonhos (1987). Ele já criticou as pessoas da indústria de Hollywood em Luta de Classes em Beverly Hills (1989), Women in Film (2001) e I’m Losing You (1998), este último contando com Cronenberg como produtor executivo. Mas todos esses trabalhos mais pessoais são fracos. E Mapas para as Estrelas é o pior deles, e também de Cronenberg (como disse o Sérgio Alpendre na crítica de Crimes of the Future).
A impressão é que ele viu e se entusiasmou com a família disfuncional de Dente Canino (2009), longa que revelou o cineasta grego Lorgos Lanthimos. Por isso, quis trazer os mesmos elementos bizarros, incluindo a violência e o incesto, para devastar o modo de vida e de pensar das celebridades.
Na verdade, Bruce Wagner até antecipa o choque comportamental que os personagens de Lanthimos apresentariam em seus filmes posteriores. Há uma descrença geral nessas obras em relação às pessoas, como se a maldade prevalecesse. Lanthimos perturba o público, mas coloca tudo em um contexto enigmático e provocador. Já Wagner soa apelativo, escancara a maldade sem margem para interpretações. Com isso, deixa a impressão de uma obra inferior, sem abertura a nuances.
Cronenberg refém do roteiro
E David Cronenberg sucumbe à mediocridade do roteiro. Talvez rodou o filme porque sentiu alguma conexão da pele deformada por queimaduras da protagonista Agatha (Mia Wasikowska) com seu body horror. Mas a trama não apresenta a sua inteligência (o bom ou mal gosto em Cronenberg é discutível), que elevava seus filmes mais radicalmente viajantes a elocubrações que rendiam acaloradas discussões entre cinéfilos. Em Mapas para as Estrelas não há nada disso. Apenas a crua exposição de personagens sem escrúpulos, evidentemente construídas para chocar, mas não para provocar.
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Ficha técnica:
Mapas para as Estrelas | Maps to the Stars | 2014 | 1h51 | Canadá, Alemanha, França, EUA | Direção: David Cronenberg | Roteiro: Bruce Wagner | Elenco: Julianne Moore, Mia Wasikowska, Robert Pattinson, John Cusak, Evan Bird, Olivia Williams, Kiara Glasco, Sarah Gadon.