Ninguém Vai Te Salvar caminha dentro da seara da ficção-científica com terror e suspense, habitat natural de M. Night Shyamalan e de Jordan Peele. Como esses dois cineastas, o diretor Brian Duffield explora as profundezas da trama de seus filmes, para dali construir o medo. Além disso, ousa conscientemente desenvolver a narrativa sem recorrer às verbalizações da protagonista.
E essa opção narrativa se encaixa com perfeição na sua história. A personagem principal, Brynn (Kaitlyn Dever), vive isolada em uma afastada casa em uma pequena cidade do interior. Em sua única ida ao centro, percebemos que ela não é bem-quista pela população, mas somente na parte final descobriremos o motivo.
A câmera no alto de um drone não esconde que a ameaça vem do espaço. Quando a isso, não há mistério. E ainda no início do filme, Brynn já confronta um ser alienígena. Parece até que este é o clímax dramático do filme, tamanho o suspense dessa sequência. Mas o longa ainda reserva mais momentos de terror, se não igualados em intensidade, pelos menos em quantidade.
Eram os deuses psicólogos?
Em paralelo, mergulha fundo na psicologia. Numa interpretação metafórica, os alienígenas agem como doutores da mente, forçando Brynn a buscar o evento traumático do seu passado, aquele que acarretou seu ostracismo. O tratamento, como geralmente acontece, é sofrido. A paciente resiste, luta contra si mesma para não encarar de frente seus problemas.
No final, o filme apresenta uma conclusão dúbia. Será que Brynn realmente se libertou dos traumas ou ela agora vive uma falsa calmaria, ainda sob necessária supervisão psicológica? Os discos voadores levam a essa segunda opção.
Apesar dessa metáfora fundamentar o enredo, o filme não arrisca pausar o ritmo para epifanias. O ritmo, pelo contrário, é alucinante, como um pesadelo sem fim. A parte inicial, sem dúvida, é a mais forte do filme, enquanto ainda não temos certeza do que está atacando a protagonista e como isso acabará. Mas, além dessa aceleração, Brian Duffield aposta também no visual imersivo, coerente com o mergulho dentro da mente da protagonista. Lembra muito, nas cenas com escuridão absoluta, a sessão de hipnose do personagem principal em Corra! (Get Out, 2017), de Jordan Peele.
Últimos pontos
Enfim, tudo isso funciona porque Kaitlyn Dever é uma tremenda atriz. Uma das melhores de sua geração (ela nasceu em 1996), por sinal. Ela tem encarado papéis difíceis em sua carreira, como neste filme que tem basicamente apenas uma personagem. Brynn nem tem diálogos ou sequer falas elaboradas. Então, a narrativa depende das comunicações visuais (por conta da direção) e das expressões da sua protagonista solitária.
Em suma, vale dizer que, para se salvar, a personagem Brynn precisa lutar contra ela mesma. Ou, numa interpretação não-metafórica, contra reais invasores do espaço. Na tela, as cenas de suspense e terror clássicas funcionam mais que o mergulho na psicologia. Pelo menos, em termos de capacidade de assustar o público. Efeito similar ao que acontece nos filmes de Shyamalan e Peele. Ninguém Vai Te Salvar é apenas o segundo longa de Brian Duffield – vamos esperar para ver se ele continuará seguindo os passos desses diretores.
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Ficha técnica:
Ninguém Vai Te Salvar | No One Will Save You | 2023 | 93 min | EUA | Direção e roteiro: Brian Duffield | Elenco: Kaitlyn Dever, Elizabeth Kaluev, Zack Duhame, Lauren L. Murray, Geraldine Singer, Dane Rhodes, Daniel Rigamer, Evangeline Rose, Dari Lynn Griffin.