O drama canadense No Ritmo da Vida (Jump, Darling) possui um tom pesado, mas a sua mensagem estimula a aproveitar a vida. Em seu filme de estreia, o diretor Phil Connell reúne dois protagonistas em fases distintas de suas existências, mas que compartilham pontos em comum. De um lado, o jovem Russell (Thomas Duplessie), um frustrado aspirante a ator que encontra sua felicidade performando como drag queen. Porém, seu marido advogado despreza essa atividade e exige que Russell a abandone. Então, Russell resolve sair de casa e começa a morar no interior, com a sua avó Margaret (Cloris Leachman). O convívio próximo estreita o relacionamento entre avó e neto, e o filme costura um paralelo não aparente entre os dois.
Russell e Margaret
Russell é interpretado pelo ator Thomas Duplessie, em seu papel de maior repercussão em sua carreira. Em quase todo filme, ele apresenta uma feição sisuda, ainda à procura do seu verdadeiro eu. Somente quando se apresenta como drag queen, Russell parece feliz, com atuações que contaminam todos os frequentadores do bar queer da pequena cidade onde mora Margaret. Em alguns momentos, observamos que ele se solta com a ajuda das bebidas.
Através de conversas cada vez mais íntimas, Russell e Margaret se ajudam. A avó revela ao neto a verdadeira causa da morte do avô, que se suicidou pulando de um prédio. O motivo de sua ruína, conta ela, foi o alcoolismo. Em cortes rápidos, vemos flashbacks do momento trágico na vida do avô, provavelmente como recriações na mente de Russell. Essa revelação é crucial para o jovem, pois ela vem numa fase em que ele começava a se afundar nas bebidas.
Cloris Leachman, vencedora do Oscar de melhor atriz coadjuvante por A Última Sessão de Cinema (The Last Picture Show, 1971), vive Margaret. Em um dos seus últimos trabalhos (ela morreu em 27 de janeiro de 2021, aos 94 anos), Leachman está comovente. Diferente de Russell, seu personagem alterna seu humor, e possui algumas falas sagazes. Porém, Margaret também enfrenta seus fantasmas. Principalmente, porque sua filha pretende interná-la em um asilo.
Se joga, querida
Então, nesse cenário melancólico, os dois protagonistas acabam se ajudando. Esse ato mútuo não transparece com evidência, e isso proporciona o encanto de No Ritmo da Vida (nome que se aproveita do sucesso de No Ritmo do Coração (Coda, 2021). O seu título original (“Jump, Darling”, ou, “Se joga, querida”) indica essa proposta, pois Margaret prefere seguir os passos de seu marido, que se matou pulando de um prédio, a viver enclausurada em um asilo. É a imagem dela, triste em um asilo, que seu neto vê em um rápido flash, quando ele dá a meia volta pela segunda vez em seu carro e retoma o caminho para sua nova vida, deixando sua avó livre para tirar a vida dela.
Assim, Russell retribui as palavras dela que o encorajaram a largar a bebida antes que seja tarde, e se jogar na vida de drag queen, o que realmente lhe faz feliz. E, num final poético, vemos os dois artistas da família se conectarem, apesar de distantes fisicamente. Margaret se deita em sua cama para seu último respiro, vestindo suas botas de patinadora, atividade que a lhe trazia felicidade similar ao que proporciona as performances como drag queen a Russell, que agora sobe ao palco vestido de patinadora.
Construído com sensibilidade, No Ritmo da Vida traz alguns momentos musicais, nas atuações de Russell como Fishy Falters. E, também, uma narrativa interrompida por trechos rápidos de flashbacks que refletem o estado emocional intranquilo de seus protagonistas. Apesar de seu tom melancólico, sua mensagem é para cima: coloque seus sonhos em primeiro lugar em sua vida.
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Ficha técnica:
No Ritmo da Vida | Jump, Darling | 2020 | Canadá | 90 min | Direção: Phil Connell | Roteiro: Phil Connell, Genevieve Scott | Elenco: Cloris Leachman, Thomas Duplessie, Linda Kash, Jayne Eastwood, Daniel Jun, Rose Napoli, Andrew Bushell, Mark Caven, Katie Messina.
Distribuição: A2 Filmes.