Com ideias variadas, a comédia Notre Dame foge do lugar comum.
Valérie Donzelli
A experiente atriz Valérie Donzelli também costuma assumir a direção em alguns filmes. E é o que ela faz em Notre Dame. Aqui, ela é a protagonista, a diretora e ainda a co-roteirista. Pois, como a principal responsável por essa comédia, Donzelli merece os créditos pela ousadia em criar uma comédia diferenciada.
Na estória, ela interpreta Maud Crayon, uma arquiteta em Paris que cuida dos seus dois filhos e, ainda, do ex-marido que insiste em frequentar sua casa. Para deixá-la ainda mais sobrecarregada, surgem três novidades, todas ao mesmo tempo. Primeiro, ela vence um concurso para remodelar o pátio da igreja de Notre Dame. Depois, ao comparecer à prefeitura para assumir o projeto, ela reencontra Bacchus Renard, uma antiga paixão. Por fim, ela descobre que está grávida.
Notre Dame apresentará os percalços de Maud Crayon para salvar esse projeto arquitetônico que se torna polêmico. Além disso, enfrentará muitas confusões para concretizar a oportunidade desse novo amor.
Humor diferenciado
O filme evita o humor pastelão, mas consegue fazer rir ao arriscar uma piada mais simplória. Por exemplo, na cena em que o ex-marido tenta explicar a briga com sua namorada enquanto mastiga um croissant, e suas palavras são indecifráveis. Adicionalmente, não há piadas grosseiras, apesar de a trama amorosa ser apimentada, inclusive com nudez frontal masculina.
Por outro lado, Notre Dame surpreende por recorrer à fantasia como parte de sua estória. Assim, o projeto arquitetônico de Maud Crayon voa, magicamente, pela janela de seu apartamento até o foro da competição. E a personagem nunca tenta explicar como isso aconteceu. Da mesma forma, a fantasia transforma a tela em cenário de teatro quando Maud dança com Bacchus. Igualmente, a teatralidade está presente na sequência que descreve Maud alugando os quartos de seu apartamento para turistas.
Além disso, Valérie Donzelli nos surpreende com um trecho musical, perto da conclusão. Então, juntando esse segmento musical com a teatralidade de algumas cenas, nos aproximamos do cinema sem barreiras de Alain Resnais. Por exemplo, o cineasta assim filmou A Vida é um Romance (1983) e Amores Parisienses (1997).
Por fim, quando ouvimos a narração recorrente feita por uma voz masculina, seu tom indica alguma influência de Woody Allen. Aliás, o cineasta novaiorquino, reverenciado pelo público francês, também mergulhou na fantasia em seus filmes, como em A Rosa Púrpura do Cairo (1985) e Escorpião de Jade (2001), entre outros.
Com tudo isso, Notre Dame pode não fazer o público morrer de gargalhadas, mas é um filme perspicaz e que não se contenta com a zona de conforto.
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Ficha técnica:
Notre Dame (Notre Dame) 2019, França, 98 min. Direção: Valérie Donzelli. Roteiro: Valérie Donzelli, Benjamin Charbit. Elenco: Valérie Donzelli, Pierre Deladonchamps, Thomas Scimeca, Bouli Lanners, Virginie Ledoyen, Isabelle Candelier.
Distribuição: Califórnia Filmes