“O Lagosta” é uma perturbadora fábula alegórica que critica duramente algumas convenções sociais. A farsa dialoga com o realismo fantástico de Luis Buñuel, no qual o sarcasmo é agressivo mesmo sendo indireto.
O prólogo, de poucos minutos, já incomoda. Uma mulher dirige sozinha pela estrada. De repente, para o carro, desce e dá três tiros em um jumento. Enquanto ela vai embora, não expressando nenhuma emoção, um dos outros jumentos da tropa se aproxima do companheiro morto, sem nada compreender. Durante o filme, o espectador entenderá o que significa essa cena, sem, contudo, se sentir menos perplexo.
Programa para solteiros
David (Colin Farrell) se inscreve num programa onde os solteiros precisam arrumar uma parceira dentro do prazo limite imposto. Caso contrário, eles se transformarão em um animal. Cada um poderá escolher qual animal poderá se tornar, e David opta pela lagosta. Durante o processo, eles passam por um treinamento para ajuda-los a encontrar um companheiro. Além disso, caçam rebeldes com espingardas carregadas com soníferos. E ganham um dia a mais no programa para cada presa capturada. Logo, David aprende um truque para facilitar o atingimento do seu objetivo: fingir.
“O Lagosta” pode ser lido como uma alegoria da sociedade que impõe o casamento a todos. Assim, isso gera essa obsessão em encontrar o companheiro. Mesmo que, para isso, se tenha que simular o interesse amoroso (note que o termo “amor” não é usado no filme) ou forçar alguma empatia que demonstre a compatibilidade do novo casal. Então, a alternativa, a vida de solteiro, é abominada socialmente. E, no filme, isso implica deixar de ser um humano para se transformar em um animal.
Violento
Adicionalmente, a violência domina as telas em “O Lagosta”, a fim de demonstrar o impacto dessas exigências sociais. Por isso, quando os rebeldes invadem a residência do casal de velhos do hotel, tememos que eles se transformem em vítimas de abuso como vimos em “Laranja Mecânica” (1971), de Stanley Kubrick. Essa agressividade na história é justificada, usada para a boa compreensão do filme. Principalmente na sequência final, quando David deverá provar que realmente ama sua companheira.
Assim, o diretor Yorgos Lanthimos constrói com seu filme “O Lagosta” sua fama de cineasta ousado e que instiga o pensar do espectador. Seu filme subsequente, “O Sacrifício do Cervo Sagrado” (2017), reforçará essa trilha.
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Ficha técnica:
O Lagosta (The Lobster, 2015) Irlanda/Reino Unido/Grécia/França/Holanda | 119 min | Direção: Yorgos Lanthimos | Roteiro: Yorgos Lanthimos, Efthymis Filippou | Elenco: Colin Farrell, John C. Reilly, Léa Seydoux, Rachel Weisz, Jessica Barden, Olivia Colman, Rosanna Hoult, Ariane Labed, Ewen MacIntosh, Angeliki Papoulia, Michael Smiley, Ben Whishaw.
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