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Poster de "O Sabor da Vida"
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O Sabor da Vida

Avaliação:
9/10

9/10

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Crítica | Ficha técnica

Em O Sabor da Vida (La passion de Dodin Bouffant), o diretor Anh Hung Tran revisita alguns elementos de sua estreia em longa, O Cheiro do Papaia Verde (Mùi du du xanh, 1993). Em vez da Saigon de 1951, estamos no interior da França em 1885. Mas nos dois filmes vemos uma menina de uns dez anos aprendendo um ofício. A menina vietnamita a trabalhar como empregada em uma família comerciante. A francesa recebe a oportunidade de desenvolver seus dotes naturais para a culinária pelas mãos de um casal de chefs gourmets. O amor tempera essas duas estórias de saborosa ternura.

Outro ponto comum nesses relatos é que trabalho e romance se misturam. O casal de O Sabor da Vida é formado por Eugénie (Juliette Binoche) e pelo refinado gourmet Dodin (Benoît Magimel), de quem ela é cozinheira há 20 anos. Faz tempo que o relacionamento deles já extrapolou a cozinha. Mas, Eugénie prefere preservar o direito de aceitar ou recusar as visitas noturnas de Dodin ao quarto de empregada onde ela dorme.

A arte da culinária

Para ilustrar essa situação, Anh Hung Tran dedica uma longuíssima montagem inicial. Tentadora ode à gastronomia, Eugénie prepara um banquete que nem os mais poderosos imperadores provaram. A preparação começa ao colher os ingredientes frescos da horta caseira e finaliza ao servir a omelette norvégienne, sequenciando vários pratos, que não excluem nenhum tipo de carne, sempre acompanhados do melhor e mais adequado vinho. Dodin e seu seleto grupo de amigos gourmets desfrutam desses requintados pratos com apreciação à altura da artista que os preparou.

Esse grupo, a poucos dias dali, comparece a um outro banquete, servido por um príncipe estrangeiro em visita à França. O evento serve apenas para comprovar o quão superior é o talento de Eugénie. A trama parece desenhar uma desforra arquitetada por Dodin, que traria o príncipe para degustar a comida de sua cozinheira, ousando servir um simples pot-au-feu. Mas, o filme parte para uma narrativa menos aventuresca, e mais dramática.

Faltou mencionar que naquela longa sequência inicial o casal conhece a menina Pauline (Bonnie Chagneau-Ravoire), sobrinha da empregada da casa. A jovem, no início da adolescência, surpreende os dois com seu talento natural de decifrar os vários ingredientes que Eugénie usou em seu molho bourguignon. Eles gostariam de treiná-la na arte da gastronomia, mas os pais dela não aprovam. Pauline, então, some da estória, mas retorna na parte final, como elemento facilitador para a cura de uma melancolia que toma conta de Dodin.

Um cinema autoral

Distantes no tempo por 30 anos, O Cheiro do Papaia Verde e O Sabor da Vida ressaltam características formais do estilo autoral do diretor Anh Hung Tran. A sua câmera se move suavemente, seja acompanhando as movimentações dos personagens infantis do seu longa de estreia, ou transitando entre os dois protagonistas no outono de suas vidas sentados à mesa, numa cena desse seu novo filme. Os sons da natureza, emitidos por pássaros, anfíbios e insetos, estão presentes em toda a duração dessas obras, como elementos que Anh Hung Tran usa para ambientação.  

Além disso, é comum vermos elogios à fotografia noturna dos filmes, mas aqui se destacam as belíssimas imagens à luz do sol. A festa que reúne vários convidados sentados a uma longa mesa entre as árvores indica o primor da textura que obtém o diretor de fotografia Jonathan Ricquebourg.

O amor de Dodin e Eugénie

Em um momento revelador, que representa o contraponto da preparação do banquete que abre o filme, chega a vez de Dodin ser o cozinheiro para Eugénie. A desculpa é uma crise de saúde dela, mas o motivo principal traz uma surpresa. Com a mesma dedicação que Eugénie, ele prepara os pratos. Mas seu esforço é maior, como revela a sua respiração ofegante durante o processo. Por fim, a câmera acompanha a empregada que leva o último prato, sem permitir que o público veja o arranjo que Dodin elaborou. Dessa forma, o diretor Anh Hung Tran quer que o espectador compartilhe a comoção de Eugénie. Essa sequência conclui com uma elegante transição, que justapõe a forma de uma pera flambada com o corpo deitado de Juliette Binoche nua.

Essa aproximação simbólica antecipa o inusitado giro de mais de 360º da câmera. Dodin acaba de superar o luto, e a última volta desse círculo estaciona numa fuga para o cinema fantástico. Dodin conversa com Eugénie, e a resposta dele revela um gracejo. Qual a essência do amor entre eles? Amor e trabalho se confundem, com uma piscadela de vantagem para a paixão maior de todo gourmet.

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Ficha técnica:

O Sabor da Vida | La passion de Dodin Bouffant | 2023 | 135 min | França, Bélgica | Direção: Anh Hung Tran | Roteiro: Anh Hung Tran | Elenco: Juliette Binoche, Benoît Magimel, Emmanuel Salinger, Patrick d’Assumçao, Galatéa Bellugi, Jan Hammenecker, Frédéric Fisbach, Bonnie Chagneau-Ravoire.

Distribuição: Diamond Films.

Assista ao trailer aqui.

Veja também o vídeo desta crítica em nosso canal no Youtube.

Onde assistir:
Mulher à mesa e homem de pé provando uma taça de vinho
Cena de "O Sabor da Vida"
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