Os Nibelungos – A Vingança de Kriemhild é a segunda parte da saga épica dos Nibelungos, escrita por autor desconhecido no início do século 13. No seu filme antecessor, Os Nibelungos – A Morte de Siegfried, lançado alguns meses antes deste, o diretor Fritz Lang leva para as telas a empolgante ascensão e morte por traição do herói Siegfried. Agora, sua viúva Kriemhild parte em busca de uma obstinada vingança contra seu assassino, Hagen Tronje.
Os mesmos aspectos técnicos deslumbrantes do primeiro filme continuam aqui. Ou seja, os grandiosos cenários construídos em estúdio, os tons dourados no lugar do preto e branco, os figurinos e as maquiagens expressionistas, bem como as cartelas explicativas e a divisão em sete capítulos.
A estória
Na estória, Kriemhild não consegue que o seu irmão, o rei de Worms, puna o assassino. Então, ela rompe com o seu reino e se casa com Átila, o rei dos hunos, chamado aqui de Etzel. E ela arquiteta um plano cruel para conseguir sua vingança. Primeiro, convida os irmãos para um jantar no reino dos hunos. Antes, o rei Etzel lhe explicara que nunca faria mal a um convidado seu, salvo se ele cometesse algum ato que o ofendesse profundamente. Então, ela traz para a mesa o filho ainda bebê dela com o rei. Fora do castelo, começam confrontos entre os hunos e os burgúndios, agora chamados de nibelungos. Como ato de intimidação, Hagen Tronje mata o bebê. Surge, então, o motivo para Etzel mandar matá-lo, e a batalha leva todos os burgúndios à morte. Com isso, Kriemhild sacia sua vingança e se encerra, tragicamente, a saga.
Assim, enquanto no primeiro filme vemos o padecer da pureza e da ingenuidade, representada por Siegfrid, neste Os Nibelungos – A Vingança de Kriemhild testemunhamos a protagonista perdendo sua alma por causa da sua sede de vingança. Por isso, Kriemhild causa a morte de todos, não só do assassino, mas de seus irmãos também, e até dela mesmo. Dessa forma, ela traduz o sentimento do duplo, ou seja, do lado mal das pessoas, característica fundamental do Expressionismo Alemão.
Os Nibelungos e o Nazismo
Com o tempo, essa saga dos Nibelungos ficou associada ao nazismo. Segundo Patrick McGilligan, em seu livro, “Fritz Lang – The Nature of the Beast”, o jornal do Partido Nacionalista elogiou-o como um “filme sobre a lealdade alemã”, em 1929. E isso se deve, principalmente, à relação de lealdade do assassino Hagen Tronje ao seu rei, e deste com ele, algo muito caro ao nazismo.
Sobre essa conexão com o nazismo, o livro de Patrick McGilligan apresenta um trecho da entrevista de Fritz Lang para a Village Voice, em 1976, pouco antes de sua morte. Nele, o diretor explica sobre as implicações sugeridas por Siegfried Krakauer no livro “From Caligari to Hitler”:
“Para contrapor o espírito pessimista da época (nota: após a Primeira Guerra Mundial), eu quis filmar a grande lenda de Siegfried para que a Alemanha pudesse extrair inspiração de seu passado épico, e não, como o Sr. Krakauer sugere, como uma aspiração para a ascensão de uma figura política como Hitler ou algo estúpido desse tipo.”
Convite recusado
Provavelmente, foi a saga dos Nibelungos que levou ao governo de Hitler convidar Fritz Lang a assumir o cargo de responsável pelo Instituto de Cinema Alemão. Afinal, suas outras obras famosas oferecem uma visão que contraria o que seria a filosofia nazista. Por exemplo, Metrópolis (1927) apresenta a exploração dos trabalhadores e esses se comportando como zumbis, até que uma revolução acaba com esse modelo. Já os filmes com o vilão Dr. Mabuse alertam para a manipulação das pessoas. E, para fechar, M, o Vampiro de Dusseldorf (1931) faz uma alegoria à perseguição aos judeus. Enfim, consciente disso, Fritz Lang preferiu fugir para a França a aceitar a proposta dos nazistas. A humanidade agradece. Afinal, se não fugisse, os talentos de Lang poderiam ter ajudado Hitler a ser ainda mais poderoso.
___________________________________________
Ficha técnica:
Os Nibelungos – A Vingança de Kriemhild (Die Nibelungen: Kriemhilds Rache) 1924. Alemanha. 131 min. Direção: Fritz Lang. Roteiro: Thea von Harbou. Elenco: Margarete Schön, Gertrud Arnold, Theodor Loos, Hans Carl Mueller, Erwin Biswanger, Bernhard Goetzke, Hans Adalbert Schlettow.