Em Pelos Bairros do Vício, a força se concentra nos personagens femininos.
Pelos Bairros do Vício se baseia no livro de Nelson Algren, o mesmo autor do livro que deu origem ao filme O Homem do Braço de Ouro (1955), cujo tema era o vício em drogas. E, talvez, tenha vindo daí a ideia do título nacional para “Walk on the Wild Side”.
A procedência literária fica evidente no texto do roteiro. Os diálogos longos remetem a uma peça teatral, mesmo quando as cenas são filmadas em locações. Por exemplo, a conversa inicial entre os personagens de Laurence Harvey e Jane Fonda, no interior do Texas possui essa preocupação em recitar o texto exatamente como foi escrito. O resultado é uma interpretação artificial.
New Orleans, 1930
A estória se passa no início dos anos 1930, logo após a crise financeira de 1929. E acompanha Dove Linkhorn (Laurence Harvey), que parte do Texas para New Orleans para reencontrar a mulher que ele ama, Hallie (Capucine). Mas, ele não tem ideia da localização dela, que não espera sua visita. Então, sendo religioso e conservador, ele se choca ao descobrir que Hallie trabalha como prostituta. Então, se questiona se ainda deseja se casar com ela.
Como nas peças de Tennesse Williams, a paixão descontrolada em Pelos Bairros do Vício está fadada a acabar em tragédia. Aliás, o ambiente onde a estória se desenrola indica esse destino. A casa de prostituição onde Hallie trabalha é controlada energicamente por Jo (Barbara Stanwyck). Jo não hesita em usar a força bruta de seus empregados para ter total domínio sobre as mulheres que ali trabalham. Hallie, por sinal, não pode simplesmente abandonar o local para ir embora com Dove.
Personagens femininas com poder
Essencialmente, as personagens femininas de Pelos Bairros do Vício são as que detêm o poder. Por exemplo, Jo comanda seu negócio e os seus empregados homens a obedecem cegamente. Além deles, seu marido se coloca em posição submissa fisicamente, pois ele perdeu as pernas num acidente e se arrasta em cima de um carrinho com rodas. Além disso, é submisso também psicologicamente, pois é incapaz de se relacionar sexualmente com Jo, a quem ainda ama. Já Hallie é sofisticada e culta, não precisa de um homem para se sustentar. Muito menos um bronco como Dove, que se confessa apaixonado loucamente por ela. Na verdade, ela não deu a mesma importância ao caso que teve com ele há três anos e que durou apenas quatro meses. Então, se ela aceita fugir com ele agora, é muito mais por sentir pena dele.
Teresina (Anne Baxter) representa outra mulher forte. A bela viúva assumiu o negócio do marido, um posto de gasolina com um restaurante anexo, e ganhou sua dependência. E a jovem errante Kitty, interpretada por Jane Fonda, sai sozinha no mundo se virando sem ajuda de nenhum homem. De fato, é ela que mostra a Dove como sair do Texas e chegar a New Orleans.
O fraco e ingênuo Dove só sobrevive nesse mundo selvagem por causa da ajuda de Kitty, Teresina e Hallie. Invertendo os papéis tradicionais no começo do século 20, é o homem que depende das mulheres. Sem elas, ele fica perdido.
A estória de Pelos Bairros do Vício é um cruel retrato de um caminho sem volta para quem faz as escolhas erradas. O filme, porém, abre uma concessão no seu último momento, dando uma resposta moralizante para indicar que o crime não compensa. Uma pena, pois esse final forçado e a teatralidade enfraquecem esse forte relato.
Ficha técnica:
Pelos Bairros do Vício (Walk on the Wild Side, 1962) EUA. 114 min. Dir: Edward Dmytryk. Rot: John Fante, Edmund Morris. Elenco: Laurence Harvey, Capucine, Jane Fonda, Anne Baxter, Barbara Stanwyck, Joanna Moore, Richard Rust, Karl Swenson, Don ‘Red’ Barry.