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Que Horas Ela Volta? (filme)
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Que Horas Ela Volta?

Avaliação:
10/10

10/10

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Crítica | Ficha técnica

“Que Horas Ela Volta?” é um retrato autêntico do comportamento da sociedade brasileira em relação às empregadas domésticas. Como filme mostra, é uma submissão aceita pelos costumes tradicionais que soa um tanto ultrapassada quando vista por outro ângulo. Para contar essa história, sua linguagem fílmica busca recursos estilísticos do cineasta japonês Yasujiro Ozu (1903-1963), cuja filmografia se centrava no retrato dos costumes de seu país à sua época.

O enredo

Val (Regina Casé) trabalha na casa dos seus patrões de classe média alta, Bárbara (Karine Teles) e Carlos (Lourenço Mutarelli), onde também mora há anos. Por isso, desenvolveu uma ligação maternal com o filho deles, Fabinho (Michel Joelsas), que Val criou desde pequeno e agora está com dezessete anos. Essa é a idade também da filha de Val, Jéssica (Camila Márdila), que teve que deixar para trás ainda pequena, quando partiu de sua cidade no Nordeste para vir trabalhar em São Paulo. A chegada de Jéssica quebra a rotina de Val, que vem para a capital paulistana para prestar vestibular.

A direção

A diretora e roteirista Anna Muylaert repete em “Que Horas Ela Volta?” a câmera estática de Ozu, desde sua primeira sequência na piscina. Seguindo o estilo do cineasta japonês, a câmera permanece fixa, enquadrando os personagens que nela atuam. O plano pode se iniciar antes da presença deles, e até mesmo depois que eles saem, às vezes retornando para o quadro. A cena vazia de personagens causa certo incômodo ao espectador acostumado ao cinema clássico. Afinal, ele não pode ver nenhuma ação acontecendo na tela, talvez só ouvir o som da conversa que acontece em outro cômodo da casa.

Contudo, esse mesmo espectador se encanta com as molduras dentro do quadro, colocando os atores dentro de espaços limitados por portas ou móveis. Por exemplo, a geladeira quando o patrão Carlos almoça na sala de jantar. Muylaert insere até alguns “pillow shots”, planos curtos de algum objeto ou local. Assim, temos nesse filme a chuva caindo sobre o telhado. Ozu usava esse recurso para que o espectador pudesse ter um respiro durante a trama, uma pequena pausa para reflexão.

Além dessa referência, nota-se, também, a montagem ideológica do cinema soviético. Por exemplo, na sequência onde uma tomada com uma tartaruga surge na tela logo após um plano com Carlos. Dessa forma, identifica esse personagem, que não trabalha e vive da herança deixada pelo pai, com a vagareza desse animal.

Câmera fixa

O uso da câmara fixa é emblemático para a trama, porque se relaciona diretamente com a ideia do ponto de vista. A câmera enxerga o que está à sua frente, e o que registra vai para a tela e é isso o que o espectador vê. Similarmente, Jéssica se revolta com o tratamento que sua mãe recebe dos patrões, porque ela não foi criada nesse ambiente. Então, não compreende essa tradição que permite colocar o empregado em posição tão submissa.

Porém, para Val, essa relação é perfeitamente normal, já que foi criada dessa forma. Ao empregar a câmera fixa, Muylaert reforça o impacto do que conhecemos sobre nossas interpretações. Até mesmo Jéssica passa por isso, porque acusava a mãe por tê-la abandonado, sem saber que essa foi a única solução que ela teve para poder sustentá-la, enviando uma boa parte do salário que ganhava em São Paulo para sua criação. Jéssica e Val, no final, ampliam suas visões para compreender melhor as suas situações, e terminam o filme mudadas.

Enfim, “Que Horas Ela Volta?” consegue, brilhantemente, utilizar a gramática do cinema completamente alinhada com sua narrativa. E, quando isso acontece, sempre surge um grande filme.


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