A violência extrema de Rambo: Até o Fim não salva o roteiro desleixado.
Rambo: Até o Fim resgata o personagem que surgiu pela primeira vez nas telas em 1982 e em três sequências, a última lançada em 2008. Sempre interpretado por Sylvester Stallone, Rambo representa o ex-combatente que retorna da guerra ainda atormentado pelas experiências no front. Incapaz de se adaptar à sociedade civil, vive recluso, mas quando precisa entrar em ação, continua letal e perigoso.
A nova história
Em Ramo: Até o Fim, John Rambo vive numa fazenda do interior, junto com Gabrielle (Yvette Monreal), sua sobrinha de 17 anos, e a avó dela. Mas ele não mora na casa com elas, e sim num abrigo subterrâneo com vários túneis que ele construiu sozinho e mantém diariamente. O prólogo do filme revela que Rambo ajuda a polícia local em algumas situações de risco, como salvar pessoas durante uma forte tempestade.
Essa vida razoavelmente pacata é interrompida quando Gabrielle resolve ir até o México procurar o pai dela, que abandonou a família. Lá ela é raptada por uma gangue de traficantes de drogas e de mulheres para prostituição. Rambo parte imediatamente para o local a fim de resgatar a sobrinha. Encara sozinho trinta bandidos fortemente armados, e é surrado quase até a morte. Uma jornalista local o salva e, recuperado, Rambo invade um bordel e consegue tirar Gabrielle de lá. Porém, é tarde demais.
Rambo Justiceiro
Rambo se vingará com raiva, e nessa missão, ele será extremamente cruel. No papel de justiceiro, o ex-combatente provará que é dez vezes mais violento que o personagem de Charles Bronson em Desejo de Matar. Talvez no intuito de modernizar a franquia, o filme apresenta um exagero de violência, chegando ao gore em algumas cenas. O banho de sangue lembra até Kill Bill, de Quentin Tarantino, com a diferença essencial que em Rambo: Até o Fim não encontramos aquela pegada menos séria de Tarantino sobre a violência.
E, por isso, o mau gosto prevalece. Rambo arranca a confissão do bandido cutucando o osso de uma fratura exposta e o embate final reserva uma cena ainda mais grotesca.
Então, quando chega o clímax do filme, Rambo tentará aniquilar todos os membros da gangue responsável pelo assassinato de sua sobrinha. Na tela, o espectador verá um desfile de mortes, e deverá se divertir em descobrir qual delas é a mais cruel. Sem intenção, acaba beirando o pastiche.
Vale, no entanto, lembrar que os fãs da franquia Rambo apreciam a violência nas telas, sempre presente em todos os filmes. Da mesma forma, louvam o militarismo e por isso adoram ver em ação um ex-combatente treinado para matar.
Roteiro desleixado
Mas o roteiro desleixado de Rambo: Até o Fim, escrito pelo próprio Sylvester Stallone com Matthew Cirulnick, consegue irritar o público, até mesmo esses fãs da franquia. Para começar, a sequência na qual Rambo invade sozinho a sede dos traficantes para pedir para devolverem a sobrinha os desapontará, com certeza. Afinal, um combatente experiente como Rambo jamais se portaria de forma tão ingênua, sabendo que não teria chances de êxito. E, olhando pelo lado dos inimigos, soa absurdo que os bandidos não matem o invasor.
Parece que Stallone e Cirulnick não se preocuparam em criar uma trama plausível. Rambo consegue encontrar a sobrinha no primeiro bordel que visita e ainda invade e mata com facilidade um dos irmãos que chefia a gangue. Então, se foi tão simples matar um, por que não eliminar o outro chefe da mesma forma? Ao invés disso, Rambo preparará várias armadilhas em sua própria casa, na certeza de que os bandidos tentarão matá-lo ali.
O roteiro também desperdiça a personagem da jornalista Carmen (Paz Vega), que salva e ajuda Rambo a encontrar a sobrinha e os bandidos. Depois some do filme, quando poderia trazê-la de volta no final, talvez publicando uma matéria onde mostraria o bem que Rambo fez ao destruir a gangue de traficantes de drogas e mulheres.
Além disso, o roteiro poderia ter se preocupado com o fato de generalizar o México como sendo uma terra de bandidos. É o que John Rambo diz a sua sobrinha, para proibí-la de ir sozinha até esse lugar perigoso. Ele menciona o México e não um lugar específico que talvez seja realmente de risco. Outros filmes anteriores da franquia também tipificavam algum povo como inimigo, mas pelo menos eram de países contra os quais os EUA realmente entraram em guerra.
A direção
Então vale também questionar o trabalho do diretor Adrian Grunberg, que costuma trabalhar como diretor de segunda unidade, aquele que dirige as sequências não principais, normalmente ao mesmo tempo que o diretor dirige a principal, para ganhar tempo, ou em locações mais distantes. Rambo: Até o Fim é apenas o seu segundo longa-metragem como diretor. A sua outra experiência nessa função foi no filme Plano de Fuga, de 2012, que também colocava os mexicanos como vilões – Mel Gibson interpretava o protagonista em uma prisão mexicana.
Pois há vários erros na direção de Adrian Grunberg em Rambo: Até o Fim. Primeiro, em relação ao ritmo, perde um longo tempo para demonstrar o quanto John Rambo é apegado à sobrinha. O filme se arrasta até acontecer alguma coisa interessante. Aliás, o prólogo na tempestade já evidencia alguns equívocos. Não fica claro que a primeira pessoa que Rambo encontra já está morta e, depois, não dá para entender como ele se salva junto com a moça da enxurrada que arrasta tudo. E, depois, o cavalo de Rambo acompanha os dois, sem mostrar como ele também sobreviveu.
Grunberg parece não estar atento ao que as imagens podem comunicar. Em uma cena dentro da casa da avó de Gabrielle, a velha senhora oferece uma xícara de chá para Rambo e a câmera acompanha o movimento da xícara, em plano detalhe, como se isso fosse algo relevante para a trama, mas não é. E o diretor sabe como funciona esse recurso gramático, pois depois ele filma um detalhe da pulseira de Gabrielle e esse objeto, sim, terá função importante na narrativa.
Ainda sobre a direção
Ainda em relação à direção, outra cena defeituosa aparece quando Rambo aconselha avó de Gabrielle a deixar a casa e morar em outro lugar, após a morte da adolescente. No mesmo momento, ela entra no carro dela e vai embora, sem ao menos levar nada. Evidentemente, eram duas cenas distintas, mas Gruberg colocou numa só e ficou muito artificial. Em erro similar na sequência final do filme, vemos o chefão dos traficantes tentar se comunicar com seus capangas e ninguém responde. O público logo pensa que ele já é o último sobrevivente, mas na verdade alguns de seus homens ainda estão no combate.
Rambo: Até o Fim só se segura pelo seu personagem forte, mas isso é mérito dos filmes anteriores da franquia. Fica claro que Sylvester Stallone tem muito mais carinho pela outra franquia sua de sucesso, Rocky, considerando que Creed: Nascido Para Lutar e Creed II são filmes muito bons e fiéis ao tom dos seus precursores.
Enfim, resta aos fãs de Rambo insatisfeitos com esse último capítulo da franquia pelo menos curtir um pouco de nostalgia com as cenas antigas nos créditos finais.
Ficha técnica:
Rambo: Até o Fim (Rambo: Last Blood) EUA. 89 min. Dir: Adrian Grunberg. Rot: Matthew Cirulnick, Sylvester Stallone. Elenco: Sylvester Stallone, Paz Vega, Yvette Monreal, Óscar Jaenada, Sergio Peris-Mencheta, Adriana Barraza, Diana Bermudez.
Trailer:
Assista em: https://youtu.be/7ku5-6hUoYI
Assista: Sylvester Stallone fala sobre Rambo: Até o Fim