O Mauritano conta a história real da luta pela liberdade de um jovem que ficou anos preso em Guantánamo pelo governo dos EUA, sem nunca ter sido acusado.
A trama
O filme começa na Mauritânia, país no noroeste do continente africano, alguns dias depois do atentado de 9 de novembro de 2001. A polícia leva Mohamedou Ould Slahi (Tahar Rahim, de Apostando Alto) para questionamento, sem maiores explicações. Logo, ele acabaria no Campo de Detenção da Baia de Guantánamo, prisão militar estadunidense.
Então, em 2005, a veterana advogada Nancy Hollander (Jodie Foster) decide defendê-lo, por razões humanitárias. Para ajudá-la, ela leva para Cuba sua assistente Teri Duncan (Shailene Woodley). Por outro lado, o militar Stuart Couch (Benedict Cumberbatch) é convocado para atuar como promotor de justiça.
Kevin MacDonald
Não é a primeira vez que o diretor Kevin MacDonald envereda pela trama política. Afinal, ele realizou O Último Rei da Escócia (2006), Intrigas de Estado (2009), e até ganhou um Oscar com seu documentário Munique, 1972: Um Dia em Setembro (1999).
Então, como era esperado, O Mauritano é um filme corajoso que não teme a polêmica de denunciar o governo dos EUA ao condenar sem julgamento um suposto responsável pelo atentado de 9/11. Dessa forma, MacDonald se expõe a críticas de todos aqueles sedentos por vingar os mortos do ataque do Al-Qaeda. Aliás, tal como sofreu a protagonista do filme, Nancy Hollander, execrada pela opinião pública por defender Mohamedou Slahi.
Nesse sentido, o longa revela como ela se manteve firme no caso por racionalmente defender a Justiça. Ou seja, para ela, não importava se Slahi era ou não culpado. A princípio, o essencial era ele ter o direito de ser devidamente julgado. A primeira parte de O Mauritano segue nessa chave, acompanhando sua determinada investigação. Porém, sem se envolver emocionalmente. Até o momento, os flashbacks revelam um interrogatório razoavelmente amigável de seu cliente.
Então, quando ela descobre que os militares submeteram Slahi a vários dias de tortura desumana, Nancy Hollander muda de postura. Tal qual o filme. A partir daí, O Mauritano assume um tom pesado. Nesse contexto, revela longas cenas da tortura, e o impacto dela na vítima, forçada a se confessar culpada para salvar a si e a seus familiares. Com isso, expõe um lado obscuro do governo dos EUA. E a advogada agora atua passionalmente.
Voz dissonante
Da mesma forma, o promotor Stuart Couch também passa por mudanças. Como a advogada, o personagem se choca ao conhecer as atrocidades praticadas com o preso, e não consegue aceitar mais sua função. Nesse ponto, ele representa uma voz dissonante dentro das instituições.
Afinal, sutilmente, O Mauritano coloca os presidentes George W. Bush e Barak Obama no mesmo pote. Durante o filme, a impressão é de que com Obama foi possível acontecer o julgamento de Slahi, e o longa mostra isso através de dois planos semelhantes da entrada do fórum, um com a foto de Bush e a outra, posterior, com a de Obama. No entanto, as cartelas dos créditos finais revelam que a administração de Obama apelou para o resultado do julgamento, atrasando em vários anos a libertação de Slahi. Além disso, essa parte final indica que o caso contado aqui não é o único entre os presos em Guantánamo.
Assim, O Mauritano entra para a lista de filmes que corajosamente peitam os governos poderosos que ignoram os princípios da Justiça.
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Ficha técnica:
O Mauritano (The Mauritanian, 2021) Reino Unido/EUA. 129 min. Direção: Kevin MacDonald. Roteiro: Michael Bronner, Rory Haines, Sohrab Noshirvani. Elenco: Tahar Rahim, Jodie Foster, Benedict Cumberbatch, Shailene Woodley, Stevel Marc, Zachary Levi.
Obs: assistimos ao filme numa sessão de screening virtual da THR.
Conheça também: Endings, Beginnings, que também conta com Shailene Woodley.