O filme Verdade e Justiça, produção da Estônia, resgata o estilo dos grandes clássicos épicos de Hollywood para contar uma estória com reviravoltas inesperadas e um belo estudo comportamental.
A trama
O longa se baseia no livro de Anton Hansen Tammsaare e acompanha a vida de Andrés, desde a chegada a sua recém-adquirida fazenda até sua velhice. Assim, a estória se inicia em 1872, quando Andrés e sua esposa assumem essa propriedade que necessita de muitas melhorias. Além do trabalho exaustivo, ele precisa enfrentar as artimanhas de seu vizinho Pearu.
Porém, na primeira empreitada em conjunto, Pearu engana Andrés, que aceita construir uma vala no terreno vizinho. A intenção era drenar a água do terreno pantanoso, mas o vizinho prefere mantê-lo úmido para seu gado. E com o passar dos anos, mais rixas surgirão, e várias delas vão parar no tribunal.
Ao longo das suas quase três horas de duração, Verdade e Justiça permitem que o espectador acompanhe a gradual transformação do protagonista Andrés. A relação com Pearu não é maniqueísta – Andrés acaba se assemelhando ao vizinho e chega a inventar mentiras para vencer as disputas no tribunal.
Análise do filme
Como a envolvente estória não tenta agradar ao público, ela se torna deliciosamente imprevisível. Conforme acompanhamos, Andrés se torna obcecado pela propriedade. Assim, esgota fisicamente sua esposa com trabalhos físicos e seguidas gravidezes para gerar um filho homem que possa herdar a terra que ele cultiva com tanta dedicação.
Personagens
Dessa forma, o personagem principal ganha a profundidade essencial para evitar qualquer artificialismo em seu comportamento. Essencialmente, ele endurece sem perceber que está deixando de lado o amor pela família. Porém, preocupado em conseguir um herdeiro, ele só demonstra felicidade quando sua esposa dá à luz pela quarta vez – enfim, um menino, o único que ele pega no colo após o parto.
Os personagens coadjuvantes também são bem construídos. Além da esposa Krõõt, também o casal de empregados Juss e Mari, que assumirão papeis importantes na trama. Por sua vez, o vizinho Pearu é bem elaborado e o filme não cai no erro de torna-lo caricato.
Além de tudo, Verdade e Justiça se atenta aos detalhes. Como exemplo disso, temos a primeira tábua que Andrés prega na porta de sua fazenda ao chegar, para evitar que os porcos entrem na casa. Em momento posterior, quando ele arranca essa madeira com um chute, fica evidente que ele perdeu aquela ternura do início, e deixou a sujeira entrar em seu caráter.
Já perto da conclusão, o final acontece em 1896, retomando a mesma cena introdutória do filme, no exercício de reflexão existencial de Andrés. Com a partida dos filhos maiores, que não desejam permanecer na fazenda, ele se dá conta de que se perdeu no caminho. De fato, ele se dedicou demais ao trabalho, com a ilusão de que a propriedade era seu objetivo final. Então, olhando para trás, se vê chegando àquele local para construir uma vida feliz com sua esposa, o que acabou sendo deixado de lado.
Estreando em longa-metragem, o diretor Tanel Toom surpreende com esse belíssimo épico que acompanha a vida do seu protagonista, lembrando o melhor do cinema hollywoodiano clássico. E encerra o filme com um genial corte que coincide com o golpe de machado do personagem.
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Ficha técnica:
Verdade e Justiça – Estônia, 165 min. Dir/Rot: Tanel Toom. Elenco: Priit Loog, Ester Kuntu, Priit Võigemast, Maiken Schmidt, Simeoni Sundja, Indrek Sammul, Marika Vaarik, Maria Koff.