Rompendo seu estilo, Kelly Reichardt provoca lágrimas em Wendy e Lucy.
Essencialmente, essa cineasta independente americana se mantém minimalista, como sempre, em Wendy e Lucy. O filme acompanha a solitária outsider Wendy, a caminho do Alaska, onde espera encontrar um emprego e um lugar para morar. Com exceção de alguns personagens secundários, ela é a única pessoa na tela durante a maior parte do tempo.
É um filme triste, como sua protagonista, que está sozinha no mundo. Sua única companheira é a sua cachorra Lucy. Porém, quando ela para em uma pequena cidade do Oregon porque seu carro quebrou, ela perde Lucy.
A partir daí, acompanhamos sua luta para encontrá-la. A conclusão é de arrancar lágrimas, contrariando o cinema anticlimático da diretora Kelly Reichardt.
Influenciado por Ozu, mas…
Sob outro aspecto, a cineasta aqui se aproxima e se distancia do diretor Yasujiro Ozu. Conecta-se com ele por levar às telas o cotidiano das pessoas comuns de seu país. A protagonista, com seu sonho individual de buscar uma vida melhor, mas cercada pelo isolamento das demais pessoas, representa o American way.
Na pequena cidade pela qual está só de passagem, quase não há ninguém nas ruas. Algumas pessoas com quem ela interage são agressivas, como o jovem funcionário do supermercado, ou representam uma ameaça. Por exemplo, o estranho que a aborda na mata à noite. Poucos são amigáveis, sendo a exceção o velho segurança da farmácia que a ajuda dentro de seus limites. Aliás, como se trata de um filme de Kelly Reichardt e não de Frank Capra, a ajuda financeira dele não chega a trinta dólares.
Além disso, Wendy e Lucy também faz menção a Ozu no uso de pillow shots. Ou seja, aqueles planos fixos que mostram um recorte qualquer da paisagem, como o poste elétrico. Eles servem para que o espectador tenha tempo para refletir sobre o que viu, antes de passar para a próxima cena.
Por outro lado, Kelly Reichardt se distancia de Ozu ao mover a câmera com deliberada displicência. O seu filme traz planos que acompanham a personagem principal com tamanha liberdade que a câmera chega a perder o foco. Aliás, isso acrescenta autenticidade a essa protagonista que ainda não encontrou a estabilidade em sua vida.
Lucy
A Lucy do filme é a cachorra da própria Kelly Reichardt, e já esteve no filme Antiga Alegria (2006). E Lucy conecta esses dois filmes, quanto à valorização do percurso sobre o caminho. Após acompanharmos Wendy em sua exaustiva procura por sua cachorra perdida, ela decide seguir sua jornada sem ela. Promete voltar para buscá-la, mas isso parece improvável. Para Wendy, o que importa, de fato, é que Lucy está bem e que foi uma companheira até então. As duas foram felizes nesse percurso, mas dali para frente um novo caminho se inicia.
Quarto longa
Wendy e Lucy é o quarto longa-metragem dirigido por Kelly Reichardt. E o primeiro com a atriz Michelle Williams, com quem faria O Atalho (2010), Certas Mulheres (2016) e Showing Up (em pós-produção).
É um filme acima da média, mas inferior a outros da diretora. Ao afrouxar seu estilo anticlimático, Kelly Reichardt perde consistência dramática, e deixa de surpreender o público.
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Ficha técnica:
Wendy e Lucy | Wendy and Lucy | 2008 | EUA | 80 min | Direção: Kelly Reichardt | Roteiro: Jonathan Reymond, Kelly Reichardt | Elenco: Michelle Williams, Lucy, Wally Dalton, Will Oldham, John Robinson, Wil Patton, David Koppell, Max Clement, Sid Shanley.